“Mesmo que venha a ser constituído arguido não vejo nenhum motivo para sair do Governo”. São estas palavras de António Costa sobre Mário Centeno em janeiro de 2018 que dirigentes socialistas recuperam agora para justificar a manutenção de Miguel Alves no cargo do secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro.

Nessa altura, em 2018, o então ministro das Finanças estava a ser investigado pela Procuradoria Geral da República, no âmbito de um eventual recebimento indevido de vantagem e Costa segurou Centeno com outra frase: “Quem decide a composição do Governo sou eu. Mantenho toda a confiança”.

Costa já ensaiou exatamente a mesma posição em relação a Miguel Alves, dizendo aos jornalistas na Web Summit que "com certeza" que mantém a confiança "senão não estaria membro do Governo".

Confrontado com o caso concreto do chamado Galpgate, que levou à saída de três secretários de Estado na sequência de um convite da Galp para assistir a jogos do Euro2016, um dirigente do PS salienta à Renascença que "foram eles que quiseram sair", lembrando mesmo que no caso de Fernando Rocha Andrade, à época secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, nem Costa o conseguiu demover, apesar da insistência.

À pergunta da Renascença se se pode concluir daqui que Miguel Alves mesmo constituído arguido - e se não pedir para sair - não será forçado a abandonar o cargo em São Bento, o mesmo dirigente socialista responde com um "sim", sempre à luz daquele "antecedente".

É assim justificada pela cúpula socialista a manutenção do secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro no cargo, tratando-se, de resto, de um homem muito próximo e da total confiança de Costa, que já o acompanhou em funções nos tempos da câmara de Lisboa e quando esteve como ministro da Administração Interna.

É notório o desconforto entre os socialistas com este caso que atinge diretamente o primeiro-ministro e audível desde logo nas declarações sulfurosas da ex-ministra da Administração Pública e dirigente nacional do PS, Alexandra Leitão, à CNN, em que defende a saída de Miguel Alves do Governo.

Também à Renascença, João Cravinho, ex-ministro e um dirigente socialista da velha guarda, pede, pelo menos, uma pausa ao secretário de Estado, defendendo que melhor seria que Miguel Alves interrompesse as funções, até que tudo ficasse devidamente esclarecido.

Questionado pela Renascença sobre como é que o partido e o Governo podem resolver este imbróglio em torno de Miguel Alves, um dirigente do PS opta por um cauteloso "veremos, veremos".

Entretanto, Costa convocou para esta quinta-feira uma reunião da Comissão Política do partido, precisamente numa altura em que está em ferro quente a polémica em torno do seu secretário de Estado Adjunto.

Mas não só. Mantêm-se sob investigação do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional os casos de eventuais incompatibilidades que envolvem ministros como Pedro Nuno Santos, Ana Abrunhosa e Manuel Pizarro. E, dificilmente, a Comissão Política irá passar ao lado destas polémicas.

Na frente parlamentar, os socialistas enfrentam um requerimento do PSD para que o secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro vá "o mais depressa possível" à Assembleia da República explicar um caso que o líder social-democrata, Luís Montenegro, classifica como "estranho".

À Renascença fonte do grupo parlamentar do PS diz que "até dia 25 o foco da bancada é total no Orçamento do Estado. A partir daí discutiremos outras questões incluindo o requerimento do PSD sobre Miguel Alves". Ou seja, até à votação final global da proposta do Orçamento do Estado, os socialistas evitam debruçar-se sobre este assunto, atirando para o fim do mês uma decisão sobre o que fazer ao requerimento do PSD.