O antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, Martins da Cruz, exclui, por agora, o risco de um conflito armado, na sequência da pressão migratória na fronteira entre a Polónia e a Bielorrússia, numa altura em que Varsóvia está a impedir a entrada de três mil a quatro mil migrantes.

O diplomata, que já presidiu à Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) reconhece a gravidade da situação, e, excluindo um cenário de escalada armada, admite na Renascença que esta situação, “provavelmente, vai ficar assim durante alguns dias” mas insere-se num quadro de “vitimização da Polónia, uma encenação para as televisões e para a imprensa”.

“É óbvio que há tensões, mas não acredito que isto dê um conflito armado, ainda que local e regional”, assegura o antigo chefe da diplomacia portuguesa.

Aliás, Martins da Cruz defende que os acontecimentos na fronteira polaca com a Bielorrússia – e que se replicam nas fronteiras lituana e letã com o país de Lukashenko – se resume a um encadeamento de circunstâncias que se complementam: “em primeiro lugar, como lhe compete, a Polónia está a vitimizar-se; a Bielorrússia está a manipular os imigrantes, os refugiados e está a transformá-los numa arma política de arremesso; a Alemanha está preocupada, porque, dada a vizinhança com a Polónia, os refugiados acabam por ir parar todos à Alemanha, que é um mundo mais apetecível para os refugiados do que a Polónia; e a União Europeia está impotente porque foi incapaz, até agora, de ter uma política comum de migração”.

Amnistia lamenta “vítimas de um jogo de poder”

No plano humanitário, a Amnistia Internacional (AI) olha para esta crise com enorme preocupação, dado que já se arrasta há mais de um mês e com um número crescente de refugiados na fronteira entre a Bielorrússia e a União Europeia.

Em declarações à Renascença, Pedro Neto, da secção portuguesa da AI, fala de “uma jogada de Lukashenko, que atraiu os refugiados para a Bielorrússia, dizendo-lhes que lhes dava passagem para a União Europeia e, agora, está a usar essas pessoas para os seus jogos de poder e de chantagens com a Europa”.

Enquanto isso, aumenta o número de refugiados concentrados na fronteira da Bielorrússia com os limites territoriais da União Europeia, em condições deploráveis.

Pedro Neto defende, por isso, uma resposta que “tem de ser dada no âmbito do direito humanitário internacional. As pessoas que têm de ser-lhes permitido pedir asilo, o seu caso deve ser analisado e se de acordo com a lei humanitária internacional, esse asilo deve ser dado e as pessoas devem ter o direito de entrar”.

“O que não deve acontecer é deixar essas pessoas no limbo, onde estão a passar frio, fome, sem acesso à saúde. Isso é muito grave e tanto os responsáveis do governo da Polónia como da Bielorrússia têm responsabilidades humanitárias quanto a isso”, conclui o presidente da secção portuguesa da AI.