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A falta de professores já se faz sentir em muitas escolas do país. Na sua maioria, a classe docente tem mais de 50 anos de idade. Apenas 1,1% dos professores têm menos de 35.

Segundo os dados do relatório do Conselho Nacional de Educação, até 2030 mais de metade dos professores (57%) vai aposentar-se. Ao mesmo tempo, os cursos de mestrado em ensino de onde saem os professores para o terceiro ciclo e para o ensino secundário estão sem candidatos e muitos já fecharam por falta de alunos.

No Instituto de Educação da Universidade de Lisboa, Mónica Baptista, que integra a comissão coordenadora dos mestrados em ensino, revela à Renascença que “em todas as áreas disciplinares, desde a Física e Química, Informática, Matemática, Biologia, Geologia, Geografia, História, nos vários cursos de línguas, temos cerca de 90/100 alunos por ano”.

É um cenário assustador, reconhece a investigadora, se tivermos em conta a idade dos atuais professores, por exemplo, na disciplina de Física e Química: "A percentagem de docentes com menos de 30 anos é apenas de 0,2%."

“Na Universidade de Lisboa, em 2001, havia 66 alunos a entrar nas licenciaturas em ensino da Física e Química, e em 2002/2003 eram 103 alunos. Atualmente, temos, no máximo, cinco alunos a entrar no mestrado por ano”, conta Mónica Baptista, que coordena o mestrado nesta área.

“A nível nacional, apenas as Universidades de Lisboa, Porto e Coimbra têm estes cursos de onde saem 10 alunos aptos a ensinar a disciplina de físico química . Os restantes fecharam por falta de alunos”, sublinha.

Mónica Baptista sublinha que se tratam de "estudantes altamente motivados, que, quando saem daqui, têm emprego", com uma "taxa de empregabilidade de 100%”.

12 mil abandonaram a profissão

Este cenário mostra que em Portugal ser professor é cada vez menos uma profissão atrativa. Para além dos salários, do modelo de seleção e recrutamento de professores, da desvalorização das carreiras, os docentes estão exaustos, desmotivados, cansados. Segundo a Fenprof, entre 12 e 15 mil professores abandonaram a profissão na última década.

Michelle Domingos deixou o ensino há sete anos. Licenciada em Belas Artes, especificamente em pintura, foi no mestrado em arte e design para o espaço público que Michelle decidiu que queria ser professora.

Deu aulas de Educação Visual durante três anos, como professora contratada. Mas, em 2012, uma decisão do Ministério da Educação afastou milhares de professores das escolas, com a extinção do par pedagógico de EVT. “Afastaram-se os contratados que eram vistos como despesa desnecessária, houve um sangramento”, diz à Renascença.

Michelle ainda deu aulas durante mais um ano no Instituto de Formação Profissional, mas decidiu abandonar a profissão. Hoje, é assistente administrativa no Sindicato dos Professores do Norte. “Tal como a escola está, não creio que haja neste momento um professor que se sinta realizado.”

Novos que já são velhos

No ano passado, um relatório da Comissão Europeia apontava o envelhecimento dos professores como um problema no nosso país. Estela Costa, professora do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa, diz que Bruxelas está atenta e quer perceber como é que se pode captar e fixar os bons professores.

"Esta é que é a questão, porque temos pessoas com formação que querem ser professores, mas é preciso mantê-los na carreira”, defende Estela Costa.

Veja-se o caso de Alexandra Rodrigues, 46 anos, que dá aulas há 23 mas que só agora entrou na carreira: é uma das novas professoras.

“Ao fim de 23 anos, concorri a nível nacional para tentar efetivar e, havendo lugares no Norte, o Ministério da Educação só efetiva os professores em Lisboa, Alentejo e Algarve porque é onde há falta", conta Alexandra à Renascença.

Alexandra mora em Ponte de Lima, é licenciada em gestão de empresas, deu aulas de Economia, mais tarde fez uma pós-graduação em Educação Especial. Foi neste grupo que ficou efetiva, colocada numa escola a muitos quilómetros de casa. “Fiquei numa escola em Alverca e todos os anos tenho de pedir mobilidade para ficar mais perto de casa."

A isto, acresce o facto de, neste momento, Portugal ter “um grande grupo de professores à beira dos 60 anos de idade que têm muita experiência, mas que estão cansados de estar em sala de aula" -- e que "podem ter outras tarefas na escola", remata Estela Costa.