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As agressões levadas a cabo pelos filhos do actual embaixador do Iraque em Portugal a Rúben Cavaco, de 15 anos, em Ponte de Sor, na última quarta-feira, têm sido alvo de polémica não só pela violência do crime, mas principalmente porque os suspeitos, menores, beneficiam de imunidade diplomática, o que significa que não podem ser detidos. A vítima, de 15 anos, sofreu múltiplas fracturas e foi internada.

A Renascença preparou um guia de perguntas e respostas que descreve os contornos do caso e que explica aquilo que poderá ou não ser feito para levar os suspeitos à justiça.

O que motivou as agressões em Ponte de Sor?

O oficial de relações públicas do Comando Territorial de Portalegre da Guarda, José Moisés, relatou que as autoridades começaram por registar, durante a madrugada de quarta-feira, dia 17 de Agosto, um desentendimento entre a vítima e os supostos agressores junto a um bar daquela cidade alentejana. Mais tarde, segundo o oficial, os dois rapazes terão agredido a vítima na Avenida da Liberdade, em pleno centro de Ponte de Sor. De acordo com o "Jornal de Notícias", a vítima terá ainda sido atropelada por um dos irmãos, que estaria ao volante de uma das viaturas da embaixada do Iraque em Portugal. O atropelamento foi negado pelos gémeos na entrevista que deram posteriormente à "SIC".

Quem são os alegados agressores?

Haider e Ridha, dois irmãos gémeos, de 17 anos. Um dos agressores era aluno de uma escola de aviação sediada no aeródromo de Ponte de Sor, a G Air Training. A escola anunciou que vai expulsá-lo. A embaixada do Iraque em Portugal alega que os jovens foram atacados por seis rapazes, alvo de insultos racistas e responderam a agressões. Em entrevista à SIC, os filhos do embaixador garantem que não tencionam sair de Portugal até que tudo esteja esclarecido e rezam para que Ruben Cavaco recupere.

Qual é o estado de saúde de Rúben Cavaco?

Foi encontrado inanimado por trabalhadores do município que recolhiam o lixo. Foi assistido no centro de saúde, mas teve de ser transportado de helicóptero para o Hospital de Santa Maria, em Lisboa. Já foi alvo de uma intervenção cirúrgica à cabeça e ao rosto. Já saiu do coma induzido e deixou a unidade de cuidados intensivos do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, esta terça-feira.

Como é que as autoridades agiram com os suspeitos?

Os menores foram detidos poucas horas depois do espancamento, mas depois de mostrarem o passaporte diplomático acabaram por ser libertados. Os dois filhos do embaixador do Iraque em Portugal foram ouvidos pela polícia, mas nesta altura pouco mais se pode fazer.

Porque é que foram libertados?

Gozam de imunidade diplomática. É uma forma de imunidade legal que assegura às missões diplomáticas inviolabilidade e aos diplomatas salvo-conduto, isenção do pagamento de impostos e outras prestações públicas, assim como de jurisdição civil e penal e de execução.

O que é que Portugal pode fazer?

A advogada Vânia Costa Ramos, especialista em direito internacional e extradições, explicou à Renascença que os menores “podem ser ouvidos, mas não podem ser alvo de qualquer medida coactiva: detenções, revistas ou uma busca na residência ou apreensão dos seus pertences".

"É possível o Estado receptor pedir ao Estado de envio dessa pessoa para que esse Estado seja ele a exercer a acção penal, ou seja, que a pessoa seja julgada no seu próprio país pelo crime em causa", disse.

Quem pode levantar a imunidade diplomática?

A imunidade diplomática é uma prerrogativa do Estado em relação a cada um dos seus embaixadores e a renúncia à imunidade diplomática também é um privilégio do respectivo Estado. O que Portugal pode fazer é perguntar às autoridades iraquianas se estão disponíveis para levantar a imunidade diplomática em relação a uma pessoa.

Como é que o caso está a ser tratado junto das autoridades judiciais portuguesas?

O caso já deu origem à abertura de um inquérito, segundo o gabinete de imprensa da Procuradoria-Geral da República. Apesar de o embaixador iraquiano ter defendido que os seus filhos agiram em legítima defesa, não deu entrada qualquer queixa junto do Ministério Público a esse respeito.

O Ministério Público (MP) português considerou, em comunicado divulgado na última semana de Agosto, “essencial para o esclarecimento dos factos”, que os dois jovens iraquianos sejam ouvidos em interrogatório na qualidade de arguidos. O MP entendeu que, "face aos elementos de prova já recolhidos, na sequência de diligências de investigação efectuadas", é "essencial, para o esclarecimento dos factos, ouvir, em interrogatório e enquanto arguidos, os dois suspeitos que detêm imunidade diplomática".

Já foram tomadas medidas por parte do Governo português?

O Ministério dos Negócios Estrangeiros garante que já realizou “diligências” junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros em Bagdade e junto da Embaixada do Iraque em Lisboa para obter uma resposta “urgente” das autoridades iraquianas relativa ao espancamento do jovem em Ponte de Sor em Agosto por parte dos filhos do embaixador do Iraque.

O comunicado emitido esta sexta-feira pelo MNE surge na sequência do pedido do levantamento da imunidade diplomática apresentado no passado dia 25 de Agosto pelo mesmo Ministério.

O gabinete de Augusto Santos Silva informa também que foi “agendada uma reunião entre os Ministros dos Negócios Estrangeiros de Portugal e do Iraque” a realizar em Nova Iorque no decurso da semana ministerial da Assembleia Geral das Nações Unidas, que terá lugar entre os dias 19 e 23 de Setembro.

Portugal pode agir contra o representante diplomático do Iraque?

Na entrevista ao "Público", Santos Silva deixa em aberto todos os desfechos para este caso, inclusive poder considerar o embaixador iraquiano “persona non grata”, caso o Iraque não levante a imunidade dos suspeitos.

A Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas prevê no artigo 9.º que o "Estado acreditador" (neste caso, Portugal) possa, a qualquer momento, "e sem ser obrigado a justificar a sua decisão, notificar ao Estado acreditante [Iraque, neste caso] que o chefe de missão ou qualquer membro do pessoal diplomático da missão é 'persona non grata'".

Como reagiu o Presidente português?

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, "está preocupado e chocado" com o caso.

Como reagiu o Iraque?

O ministério iraquiano dos Negócios Estrangeiros anunciou que está a acompanhar o caso.

"O Ministério dos Negócios Estrangeiros segue de perto, com preocupação, o que surgiu na sequência da acusação aos dois filhos do seu embaixador em Portugal. Iniciou uma investigação para conhecer mais detalhes desde incidente e juntar informação veiculada pelos meios de comunicação social", lê-se numa mensagem publicada na internet.

O Ministério dos Negócios Estrangeiros do Iraque convocou o embaixador do país em Portugal, pai dos dois jovens suspeitos de terem agredido Rúben Cavaco, de 15 anos, em Ponte de Sor. Segundo a RTP, a notícia está a ser avançada pela imprensa iraquiana, que refere que o diplomata terá sido chamado para falar sobre este caso.

A Embaixada do Iraque em Portugal apresenta a sua versão para o caso das agressões em Ponte de Sor. Alega que os filhos do embaixador foram atacados, alvo de insultos racistas e responderam a agressões, sugerindo que agiram em legítima defesa. O embaixador Saad Mohammed Ridha apresentou uma queixa junto das autoridades portuguesas, refere um comunicado publicado no sábado, apenas em árabe, na página da embaixada.

Já o anterior embaixador do Iraque em Portugal diz-se chocado, revoltado e “envergonhado” com as agressões. Num email enviado a amigos e colaboradores portugueses e iraquianos, a que a Renascença teve acesso, Hussain Sinjari expressa “a maior raiva, choque e tristeza por esta violência bárbara”.

Onde se encontram actualmente os suspeitos?

Os filhos do embaixador do Iraque encontram-se na embaixada do Iraque. Em declarações à SIC, garantem que não tencionam deixar Portugal até que tudo esteja resolvido.

[Texto actualizado às 15h23 de 02/09/2016]

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