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Declarou o seu voto em Geert Wilders, o que causou perplexidade em alguns meios portugueses. Por que razão vota Wilders?

O meu sentido de voto foi simplesmente no sentido de... Vou repetir o que já disse. É um sentido de protesto. Sigo muito a política holandesa, porque me interessa. Mas, sucessivamente, vão prometendo uma quantidade de melhorias e acabam sempre por mentir de uma maneira desagradável.

E por que é que a resposta será um homem que propõe a deportação de marroquinos e a saída da UE?

Espere aí. Ele não propõe a saída dos marroquinos, ele propõe a deportação dos marroquinos com cadastro criminal.

E para si isso faz toda a diferença?

Evidentemente. Entre o cidadão que respeita a lei e o criminoso há diferenças, ou não há?

Mas o seu argumento inicial é: muitos prometem e nada fazem. Mas Wilders poderá não ser, no espectro político holandês, a única opção para quem está desiludido com essa atitude. Por que é que o líder do Partido da Liberdade é a única solução?

Ele não vai cumprir coisa nenhuma porque não vai governar. Mas todas as promessas que são feitas [pelos outros candidatos] são feitas numa base que não faz sentido. Será a continuação das promessas que já estou habituado a ouvir há 40 ou 50 anos e que resultam muito bem numa parte da economia, numa certa classe, mas não na parte dos mais desprotegidos da sociedade.

Em que é que isso mexe no seu dia-a-dia na Holanda?

Não mexe coisa nenhuma porque sou um sujeito com uma vida extremamente confortável, não devo nada a ninguém, não sou dependente de ninguém, tenho uma reforma muito, muito agradável, depois de 30 e tal anos de professor na Universidade de Amesterdão. A mim não me toca! Toca é às pessoas à minha volta: vejo os inválidos, os pobres, de todas as nacionalidades que por aqui há – são umas 135 nacionalidades. O Governo não faz o mínimo por essa gente.

O que diz é que há um âmbito alargado de pessoas que se revêem em Wilders?

Revêem-se porque não há ninguém fale em nome deles. Sim, é um pouco à maneira do Presidente Trump. Esta gente não tem voz. Vota, são eleitores, mas aquilo em que eles votam resulta sempre em nada ou um pouquinho... Não dá satisfação às necessidades e aos ideais das pessoas.

Mas, ao mesmo tempo, o José Rentes de Carvalho fala em intenções irrealistas por parte de Wilders.

Porque ele não vai poder governar. O que ele vai poder fazer é uma oposição do género de guerrilha: cada vez que houver uma decisão que lhe desagrade ele vai ser contra. Vai dar um bocadinho de trabalho aos próximos governos, obrigá-los-á talvez a ser um bocadinho mais leais para com o eleitorado.

Acredita numa sociedade multicultural?

A sociedade multicultural... eu não posso ser nem a favor nem contra. A sociedade multicultural é uma realidade. Eu tenho vizinhos de umas 12 ou 13 nacionalidades e toda a gente se dá muito bem com toda a gente. Não é esse o caso, o caso são as consequências do que pode vir a acontecer. Quando um certo número de nacionalidades chegar a obter uma maioria – por exemplo, os muçulmanos, os marroquinos e os turcos, que são uma gente muito produtiva em matéria de filhos, é possível que daqui a três ou quatro gerações eles sejam maioria na Holanda. E se forem maioria, se tiverem de adoptar a "sharia", o direito muçulmano, quem é que os vai evitar?

É por isso que se vota Wilders?

[Risos] Votar em Wilders é um... pequeno, uma coisa muito individual, é um protesto, é uma maneira de dizer aos governantes: oiçam, tenham um bocadinho mais decência. Wilders não vai fazer coisa nenhuma, fora ser um embirrento nos próximos quatro anos.

Mas na Europa outros líderes poderão chegar mais longe.

Sim, mas isso é um problema muito mais grave do que Wilders porque, em princípio, a sociedade holandesa está preparada para extremismos. Wilders não é um perigo para a sociedade holandesa, pode ser um mau exemplo para outros, mas na sociedade holandesa ele vai continuar a ser um sujeito... Vai ter muitos votos, mas nas próximas eleições é capaz de ter muitos menos.

Wilders quer sair da UE.

Não é o único. Há muitos políticos que não estão interessados [no projecto europeu], mas não podem abrir a boca e esperam pelo resultado das eleições. Há uma situação recorrente aqui entre as pessoas: como é que vamos pagar a Portugal, à Grécia e à Itália, que não põem as contas em ordem? Há uma tendência para findar com a União Europeia, naquele sentido de estar a proteger os países menos produtivos e menos ricos.

E como português que vive na Holanda, o que pensa sobre esse discurso?

[Risos] Eu reconheço: fui um grande adepto da União Europeia. Mas quando me dou conta da actividade e da quantidade de burocratas que o mais que fazem é decidir sobre o tamanho das retretes, as qualidades das torneiras de água, francamente, para mim a União Europeia já terminou há muito tempo.

E não tem reforma, na sua opinião?

É capaz de ter, mas a curto prazo não. É um clube de gente que discute entre si e que ganha muito bem, mas que todos os meses está a resolver os problemas dos refugiados.

Se um dos seus leitores mais fiéis lhe escrever uma carta muito decepcionado com essa sua opção política, como reage a isso?

Já escreveram. O que é que ia fazer? Não posso ter a minha opinião?

Claro que pode. Mas o que vai responder?

Não respondi, chegaram há minutos, pelo menos duas. Não sei o que responder.

Esta polémica vai condicionar o que vai escrever a seguir?

Não, de maneira nenhuma. A minha obra não é política, o que tenho escrito é sobre gente, não sobre política.