​Abusos na Igreja. Vítima mais jovem tem hoje seis anos

15 fev, 2023 - 07:00 • Ângela Roque , Marta Pedreira Mixão , Salomé Esteves (gráficos)

Vinte e sete dos testemunhos validados pela Comissão Independente são de vítimas já nascidas no séc. XXI. A leitura mais atenta dos dados do relatório, conhecido esta semana, revela que a vítima mais jovem nasceu em 2016, e a mais velha faz este ano 90.

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Uma menina nascida em 2016 é a mais nova na lista de testemunhos validados que consta do relatório final da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica. Quando a denúncia foi feita (em 2022) tinha seis anos, mas a idade em que aconteceu o alegado abuso não é divulgada nesta lista. O documento, consultado pela Renascença, enumera os testemunhos validados pelo género e ano de nascimento das vítimas.

Há também o caso de um rapaz atualmente com 10 anos, outra menina de 12, um adolescente de 14 e uma de 15. No total foram validadas 27 denúncias de pessoas nascidas após 2000, 16 relativas a rapazes. O mais velho tem 23 anos.

A vítima com mais idade a reportar o seu caso à Comissão Independente terá agora 90 anos (quando fez a denúncia, em 2022, tinha 89). É homem e nasceu em 1933.

Das vítimas nascidas na década de 1930, há um total de sete testemunhos (seis homens e uma mulher, que nasceu em 1938), e das da década de 1940 aparecem 31 casos, 15 de mulheres. As três mais velhas, que nasceram em 1941, terão agora 82 anos.

As denúncias no feminino são regulares ao longo do relatório. Entre os 104 testemunhos de vítimas nascidas na década de 1950, 45 são de mulheres. Da década de 60 houve 111 denúncias, das quais 53 são também de mulheres.

Mais denúncias de quem nasceu nos anos 70

A década seguinte, de 1970, destaca-se nesta lista com mais casos reportados à Comissão: foram 122 as pessoas que testemunharam, e que hoje têm entre 50 e 53 anos. 57 são mulheres.

Entre vítimas nascidas na década de 80 há menos testemunhos, ainda assim são 50 - 15 de raparigas. De nascidos nos anos 90, há 30 casos, incluindo nove mulheres.

A lista de 511 testemunhos – aparece aqui menos um do que revelou a Comissão Independente – inclui, ainda, 21 casos sem data de nascimento referida. A maioria das pessoas que responderam ao questionário da Comissão Independente identificaram-se como sendo do género masculino (57,2%), 42,2% como mulheres. Dois casos (0,4%) identificam-se com outro género e uma pessoa não respondeu (0,2%).

Idade ao primeiro abuso

Esta lista das denúncias validadas mostra apenas a idade atual e o género das vítimas, não a data em que foram abusadas. Para isso há um gráfico específico no relatório, com a distribuição percentual da idade em que ocorreu o primeiro abuso, sendo que essa informação não foi esclarecida em 46 dos casos recebidos.

O relatório refere que “embora existam relatos residuais de abusos a partir dos 2 anos de idade, reportados por outrem, a incidência torna-se frequente logo a partir dos 6 anos (6,4%), sendo mais elevada no intervalo entre os 10 e os 14 anos”. Em termos absolutos, é ainda referido, “a incidência é mais alta aos 12 anos, com 15% dos casos”, mas a faixa etária dos 10 aos 14 anos é “claramente a de maior risco: nela se situam mais de metade (58,6%) d0s casos testemunhados neste estudo”.

A Comissão Independente identificou um pico de ocorrências entre 1960 e 1990. Apesar disso, um quarto dos casos denunciados, 112, ocorreu desde 1991, refere o relatório apresentado na segunda-feira.

De acordo com a análise realizada e divulgada no relatório, existe uma diferença de 40 anos entre a média de idades à data da agressão e a data da denúncia ou revelação. Enquanto a média de idades atual das vítimas é de 52 anos, a idade média aquando do primeiro abuso era de 11,2 anos, para ambos os géneros. Em 21 casos (3,9% do total), refere o relatório, foi "indicada a idade atual, com o claro significado de que os abusos ainda estão a acontecer no presente".

A Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica indicou ter recebido 512 testemunhos validados - através desses, é possível calcular que o número de vítimas seja, no mínimo, de 4.815. Um total de 25 casos foram enviados para o Ministério Público.

Perante as conclusões do relatório, a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais na Igreja Católica Portuguesa propôs a mudança de lei no que respeita aos prazos de prescrição nos crimes de abuso sexual, bem como a criação de um "Provedor da Criança", para atuar especificamente na área da criança e da família.

Se foi vítima de abuso ou conhece quem possa ter sido, não está sozinho e há vários organismos de apoio às vítimas a que pode recorrer:

- Serviço de Escuta dos Jesuítas , um “espaço seguro destinado a acolher, escutar e apoiar pessoas que possam ter sido vítimas de abusos sexuais nas instituições da Companhia de Jesus.

Telefone: 217 543 085 (2ª a 6ª, das 9h30 às 18h) | E-mail: escutar@jesuitas.pt | Morada: Estrada da Torre, 26, 1750-296 Lisboa

- Rede Care , projeto da APAV, Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, que “apoia crianças e jovens vítimas de violência sexual de forma especializada, bem como as suas famílias e amigos/as”.

Com presença em Lisboa, Porto, Coimbra, Braga, Setúbal, Santarém, Algarve, Alentejo, Madeira e Açores.

Telefone: 22 550 29 57 | Linha gratuita de Apoio à Vítima: 116 006 | E-mail: care@apav.pt

- Comissões Diocesanas para a Protecção de Menores . São 21 e foram criadas pela Conferência Episcopal Portuguesa.

São constituídas por especialistas de várias áreas, recolhem denúncias e dão “orientações no campo da prevenção de abusos”.

Podem ser contactadas por telefone, correio ou email.

Para apoiar organizações católicas que trabalham com crianças:

- Projeto Cuidar , do CEPCEP, Centro de Estudos da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica

Se pretende partilhar o seu caso com a Renascença, pode contactar-nos de forma sigilosa, através do email: partilha@rr.pt

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