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Eleições para o Parlamento Europeu

Como vai ser a União Europeia depois de 9 de junho? Quatro preocupações para as eleições europeias

30 mai, 2024 - 14:30 • João Pedro Quesado

O que está em causa nestas eleições? O que vai acontecer ao trabalho inacabado nos progressos ambientais? Que respostas vão ser dadas aos desafios na defesa e segurança? Um novo equilíbrio entre europeístas e eurocéticos pode mudar a face da União Europeia?

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Quem vai mandar na União Europeia depois das eleições europeias de 2024? O que vai ser feito para resolver os problemas sentidos pelos europeus? Muitos qualificam a economia como má, e colocam a luta contra a pobreza e o apoio à saúde pública como principais temas da campanha, segundo as sondagens mais recentes do Eurobarómetro.

É comum dizer-se que a eleição que está à nossa frente é a eleição mais importante de sempre. Apesar da ameaça do crescimento da extrema-direita a nível europeu já ser um tema recorrente, talvez esta nunca antes tenha estado em posição de ter tanta influência no Parlamento Europeu. E isso significa ter poder para moldar a UE pela primeira vez.

Um parlamento mais dependente da extrema-direita

Face à atual composição do Parlamento Europeu, os dados das sondagens por toda a União Europeia apontam para a continuação do crescimento dos partidos e grupos de extrema-direita.

Segundo o “Poll of Polls” do “Politico”, a extrema-direita pode até ultrapassar o maior grupo do Parlamento Europeu, apesar de estar dividida. Entre os grupos Conservadores e Reformistas Europeus (ECR) e Identidade e Democracia (ID), e contando com os partidos suspensos de um desses grupos (como a AfD) ou simplesmente não inscritos em nenhum grupo, o número de eurodeputados desta ala pode atingir os 184, ultrapassando os 170 lugares projetados para o PPE.

Esse crescimento será feito, segundo os mesmos números, principalmente à custa dos grupos dos liberais e dos verdes. E isso pode mudar a face das leis – ou, em linguagem de Bruxelas, os regulamentos, diretivas e decisões – aprovadas pelo Parlamento.

Muito pode mudar com esse novo panorama, mas talvez em nenhum capítulo como na agricultura isso se note tanto. Com um início de ano marcado por protestos de agricultores, leis para introduzir medidas de sustentabilidade e bem-estar animal e reduzir as emissões do sector podem deixar de ter apoio suficiente no Parlamento.

É também no setor da extrema-direita onde a organização dos eurodeputados pelos grupos mais pode mudar. Marine Le Pen está a cortejar Giorgia Meloni para formar um único grupo, mas o que se sabe para já é que os eurodeputados da AfD foram suspensos do ID.

Fora desse setor, os liberais podem perder o neerlandês VVD – o Renovar a Europa vai votar a expulsão do partido a 10 de junho, podendo assim punir a decisão de entrar em coligação com o partido de extrema-direita liderado por Geert Wilders para formar governo.

Progressos ambientais podem ficar em risco

Há propostas legislativas cujo trabalho ficou a meio com a paragem do Parlamento Europeu para as eleições. A criação de um euro digital, uma diretiva sobre a responsabilidade da Inteligência Artificial, a luta contra o abuso sexual de crianças e a proteção de animais durante o transporte são algumas delas.

Quer esteja unida num único grupo político, quer esteja dividida em dois ou mais, a extrema-direita deve crescer e ganhar peso na realidade europeia. E isso vai refletir-se nos regulamentos e diretivas aprovadas pelo Parlamento.

Os setores da agricultura e do ambiente podem ser o maior exemplo disso. Os partidos do ECR e ID têm feito campanha contra as políticas ambientais dos últimos anos, e são contra potenciais regras ambientais mais exigentes para os agricultores e a já aprovada proibição de venda de novos carros com motores de combustão a partir de 2035.

O novo Parlamento também deve decidir os objetivos de cortes de emissões para 2040 – a ambição desse objetivo, e a sobrevivência dos que já existem, dependerá dos eurodeputados. Há ainda os capítulos do Pacto Ecológico Europeu que não tiveram leis aprovadas, como a restauração dos ecossistemas e proteção das florestas.

A eterna dúvida: aumentar a integração europeia?

Depois há as questões da defesa, um dos principais temas de campanha. A forma de financiar um maior investimento e o nível de cooperação entre os países da UE neste setor estão por definir, mas ECR e ID não concordam sobre o que fazer – o primeiro é a favor e até propõe o exército europeu, o segundo não quer mais integração.

Há ainda para resolver questões noutros setores. Quanto à imigração, não é claro se o pacto para a migração e asilo aprovado em abril – do qual poucos verdadeiramente gostaram –, fica intacto, ou se o tema volta à discussão.

Na energia, é preciso decidir se a expansão das energias renováveis vai continuar, e como se apoia o setor contra a competição da China e dos Estados Unidos da América ao mesmo tempo que se quer evitar mais subidas de preços para os consumidores.

Na tecnologia, é preciso supervisionar a aplicação, pela Comissão Europeia, dos grandes regulamentos aprovados na última legislatura – as leis dos mercados e serviços digitais, e da inteligência artificial. E um Parlamento com mais peso à direita pode preferir reduzir a regulação para favorecer a existência de maiores empresas tecnológicas europeias, para competir com os outros blocos económicos.

Na saúde, não é claro se o avanço para uma maior integração europeia no setor vai ser concretizar, ou se vai perder o ímpeto dado pela pandemia da covid-19.

No capítulo do financiamento e do orçamento da UE, o debate deve ser entre a emissão de mais dívida em conjunto e a criação de mais impostos a nível europeu para pagar os investimentos necessários - ou cortes no próximo orçamento plurianual, já que será difícil convencer os países a contribuir com mais dinheiro.

O maior peso da direita mais radical pode ainda bloquear a aprovação de acordos comerciais. O acordo com os países sul-americanos do Mercosur ainda não foi aprovado nem pelo Conselho, nem pelo Parlamento Europeu, e as cláusulas sobre cadeias de abastecimento sustentáveis e livres de desflorestação presentes neste e noutros acordos com aprovação pendente podem começar a cair.

O que são as eleições europeias? Fizemos desenhos para descomplicar
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Ursula fica? Com que equipa?

Uma das maiores consequências das eleições europeias é a subsequente escolha de quem ocupa os cargos europeus de topo. Entre esses cargos estão a presidência da Comissão Europeia, o Alto Representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança (e a restante Comissão Europeia), a presidência do Conselho Europeu e a presidência do Parlamento.

Existe a possibilidade de os principais cargos serem todos ocupados por mulheres. Mas também é possível que Ursula von der Leyen não tenha apoio suficiente para voltar a ser aprovada pelo Parlamento Europeu.

Em 2019, von der Leyen recebeu 383 votos a favor, uma margem pequena face à maioria necessária de 374 votos. Recebeu o apoio dos Socialistas e Democratas (S&D), mas não dos Verdes, e agora parece estar a arriscar perder esse importante apoio do grupo de centro-esquerda.

Isto porque Ursula von der Leyen tem evitado recusar trabalhar com eurodeputados do ECR, que Giorgia Meloni lidera – o que está a fazer os socialistas, com o chanceler alemão Olaf Scholz à cabeça, lançar um aviso: ou von der Leyen estabelece uma linha vermelha, ou o apoio a um segundo mandato na Comissão desaparece.

Os comissários europeus e a presidência do Conselho são decididas pelos governos dos países da UE. O facto de alguns serem chefiados pela extrema-direita praticamente assegura que a Comissão vai contar com elementos desse setor político, e vai pesar na escolha da presidência do Conselho - que habitualmente faz parte da negociação dos cargos, e depende do equilíbrio de forças atingido nas eleições.

A presidência do Conselho é o objetivo dos socialistas desde que perderam a presidência do Parlamento em 2022. O então presidente, David Sassoli, morreu uma semana antes do fim do mandato de dois anos e meio.

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