09 jan, 2023 - 02:31 • Fábio Monteiro
Milhares de apoiantes de Jair Bolsonaro invadiram, destruíram e vandalizaram, no domingo, o Congresso, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal, em Brasília. É, por isso, muito incerto como é que irá acordar o Brasil esta segunda-feira.
Lula da Silva reagiu de forma veemente aos eventos de domingo, apelidou os invasores de “fascistas” e ainda apontou responsabilidades a Bolsonaro. O tom conciliatório com que começou o mandato desapareceu.
Neste momento, o número de detidos ainda está a evoluir, não é conhecido o registo de feridos. Há factos por apurar. Mas já há algumas certezas.
Para fazer face ao caos em Brasília, Lula da Silva decretou, até 31 de janeiro, uma "intervenção federal para conter segurança de ordem pública". Ou seja, o Brasil vai acordar em estado de sítio.
O secretário executivo da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Garcia Capelli, irá encabeçar a intervenção.
O responsável poderá requisitar os recursos financeiros, tecnológicos, estruturais e humanos de Brasília e quaisquer órgãos, civis e militares, da administração pública federal, que considerar necessários.
O decreto de intervenção ainda precisa de ser analisado pelo Congresso, que tem 24 horas para deliberar.
Tudo indica que sim. O contingente responsável pela segurança do espaço que acolhe o Congresso, Palácio do Planalto e Supremo Tribunal Federal, em Brasília, “não atuou”. O porquê de isso ter acontecido vai ser alvo de uma investigação, já garantiu o ministro da Justiça do Brasil Flávio Dino.
Existem múltiplos relatos de uma atuação conivente das forças policiais com os manifestantes. Desde agentes que, enquanto decorria a invasão, foram fotografados a beber águas de coco. Outros foram apanhados a tirar selfies com manifestantes.
O secretário de Segurança do Distrito Federal de Brasília, Anderson Torres, é um ex-ministro de Bolsonaro, está fora do país (de visita aos EUA) e tinha conhecimento que, para este domingo, estava prevista uma grande manifestação.
Entretanto, Anderson Torres já foi demitido. E o Governo de Lula da Silva pediu a sua detenção.
Já o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, vai ser afastado do cargo durante 90 dias, por decisão do Supremo Tribunal Federal. O governante é acusado de atos preparatórios de terrorismo, associação criminosa, dano, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.
“A escalada violenta dos atos criminosos (...) somente poderia ocorrer com a anuência, e até participação efetiva, das autoridades competentes pela segurança pública e inteligência, uma vez que a organização das supostas manifestações era facto notório e sabido" , escreve o juiz Alexandre de Moraes.
Pelo menos 400 pessoas foram detidas entre domingo e esta segunda-feira, em Brasília, em flagrante por participação no ataque ao Congresso, segundo a imprensa Brasileira. O ministro da Justiça, Flávio Dino, diz que o número de detenções poderá aumentar.
Nas próximas horas o número de detidos deverá aumentar. Quarenta autocarros utilizados por grupos manifestantes foram apreendidos em Brasília e os seus financiadores identificados.
Lula da Silva garantiu que todos os que tenham participado ou estado por trás do ataque serão punidos exemplarmente. "Fica decretada intervenção federal no Distrito Federal [Brasília] com o objetivo de pôr termo ao grave comprometimento da ordem pública", disse Lula da Silva, em conferência de imprensa.
Lula da Silva apelidou os invasores de "verdadeiros vândalos" e "fascistas fanáticos", e garantiu que "todas as pessoas" que participaram no ataque "serão encontradas e punidas".
O Presidente do Brasil responsabilizou também Jair Bolsonaro pela invasão.
"Esse genocida não só provocou e estimulou isto como, quem sabe, está a estimular pelas redes sociais. A culpa também é dele. É da responsabilidade dele e dos partidos que o sustentam", acusou.
Numa primeira reação à invasão, Lula da Silva acusou o ex-presidente do Brasil de estar ligado à invasão do Congresso – mas não disse expressamente e em que nível de organização.
Jair Bolsonaro, que está nos Estados Unidos da América, desde o final do ano passado, não tendo, inclusive, estado presente na tomada de posse de Lula da Silva, a 1 de janeiro deste ano, reagiu ao sucedido através das redes sociais.
O ex-presidente do Brasil condenou as “depredações e invasões de prédios públicos” e rejeitou qualquer envolvimento.
“Repudio as acusações, sem provas, a mim atribuídas por parte do atual chefe do executivo do Brasil”, escreveu.
Há algumas semelhanças, mas também diferenças importantes.
No caso dos EUA, a invasão ocorreu ainda antes de Joe Biden ter tomado posse. Não houve indicações de que a polícia do Capitólio tenha sido conivente com os seguidores de Trump. E o ex-presidente norte-americano esteve presente e incitou, diretamente, os manifestantes a avançar.
No Brasil, Lula já é Presidente há uma semana. Terá existido algum tipo de colaboração das forças policiais. E Jair Bolsonaro está fora do país.
Sem surpresa, tanto o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, como o Governo já vieram a público repudiar o sucedido em Brasília.
Em declarações à Renascença, Marcelo Rebelo de Sousa manifestou o apoio de Portugal ao novo Presidente do Brasil, Lula da Silva, e lamenta o que apelida de atos "inconstitucionais e ilegais".
"O que se trata é de afirmar que é inaceitável e é de repudiar uma atuação como esta, que é manifestamente inconstitucional e ilegal", disse.
Por sua vez, o Governo emitiu um comunicado a condenar "as ações violentas e desordem que hoje tiveram lugar em Brasília, reiterando o seu apoio inequívoco às autoridades brasileiras na reposição da ordem e da legalidade"
Já entre a comunidade internacional, Joe Biden, Presidente dos EUA, considerou "escandalosa" a violência protagonizada pelos bolsonaristas, enquanto a Presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, se mostrou "profundamente preocupada" com o que aconteceu em Brasília.
Através do Twitter, Charles Michel, Presidente do Conselho Europeu, também já demonstrou a sua "condenação absoluta" do "ataque às instituições democráticas" brasileiras, revelando ainda o "total apoio" do bloco comunitário a Lula da Silva.
António Guterres, secretário-geral da ONU, condenou igualmente a invasão, defendendo que "a vontade do povo brasileiro" e as instituições democráticas do Brasil "devem ser respeitadas".
[notícia atualizada às 11h00]