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Especialista em Direito. Procuradores têm direito a não acatar ordens que considerem ilegais

06 fev, 2020 - 10:37 • Marina Pimentel com Redação

O parecer do Conselho Consultivo da PGR sobre relações hierárquicas está a causar polémica.

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Um parecer da Procuradoria-Geral da República sobre a possibilidade de interrogar altas figuras do Estado, que a Renascença revelou em primeira mão, está a causar grande polémica na Justiça.

O texto do Conselho Consultivo da Procuradoria deu razão ao diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal, que proibiu os procuradores do caso de Tancos de ouvirem o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa e o primeiro-ministro António Costa, tendo em conta a dignidade dos cargos.

No fundo, este parecer diz que as ordens "vindas de cima" são para cumprir pelos procuradores, o que é visto como uma limitação à independência de quem tem de conduzir as investigações judiciais. O mesmo texto vai mais longe e considera que essas ordens não têm sequer de constar do processo.

Esta interpretação que é contestada por Luís Fábrica, especialista em Direito Administrativo e autor de um estudo que é apresentado esta quinta-feira sobre a autonomia do Ministério Público. “Em termos genéricos, é evidente que eu não digo que o procurador não deva acatar as ordens que lhes são dadas, mas não as deve acatar se entender que são ilegais. Aí o seu juízo sobre a ilegalidade da ordem que lhe é dirigida é um juízo definitivo – ele pura e simplesmente entende que a ordem é ilegal e tem o direito e o dever de não a acatar.”

Ordem deve ou não constar do processo? “Salvo o devido respeito, acho intolerável que esse comando não conste do processo. É uma responsabilização para quem dá a ordem e, consequentemente, a verificação de que quem acatou essa ordem o fez acatando hierarquicamente aquilo que lhe foi dito e não através de uma sua decisão autónoma”, justifica.

Nestas declarações, alerta para os riscos que podem surgir quando se coloca em causa a autonomia dos procuradores do Ministério Público, incluindo o risco de influência política e dá o exemplo da recente controvérsia sobre a nomeação do Conselho Superior do Ministério Público.

O estudo conduzido por Luís Fábrica aponta justamente a importância de garantir e mesmo reforçar essa autonomia dos procuradores face à hierarquia. A apresentação acontece na Universidade Católica de Lisboa, onde vão estar entre outros a ex-procuradora-geral Joana Marques Vidal e o diretor nacional da PJ, Luís Neves.

Procuradores transformados em “marionetes”. O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público considerou “grave” o teor do parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República sobre relações hierárquicas, admitindo que transforma os procuradores "em marionetes" da chefia do Ministério Público.

Em declarações à agência Lusa, António Ventinhas referiu que o parecer e a diretiva da procuradora-geral da República (PGR), Lucília Gago, que determina que a doutrina do parecer deve ser seguida pelo MP, cria no fundo um "processo penal paralelo em que nem juízes nem advogados sabem efetivamente quem toma as decisões no processo - se é o procurador titular do processo crime ou se é a hierarquia".


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