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Entrevista Renascença

Moedas não se compromete com recandidatura à Câmara de Lisboa: "Não é o momento"

26 mar, 2024 - 07:00 • Tomás Anjinho Chagas

Autarca de Lisboa fala em "especulação futura" e diz que tem a cabeça no presente. Moedas lança farpa a António Costa que teve "mudança de atitude" quando o social-democrata foi para a Câmara.

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Entrevista a Carlos Moedas, presidente da CM Lisboa
Oiça aqui a entrevista a Carlos Moedas, presidente da CM Lisboa. Foto: Ricardo Fortunato/RR

Carlos Moedas, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, com mandato até 2025, não diz se quer recandidatar-se ao cargo nas próximas eleições autárquicas.

Em entrevista à Renascença - a propósito do seu novo livro "Liderar com as Pessoas", que chega às bancas esta terça-feira - o autarca do PSD afirma que este "não é o momento" e acredita que a pergunta alimenta uma "especulação futura".

No novo livro, que conta com prefácio do Presidente francês, Emmanuel Macron, Carlos Moedas revela que a sua relação com António Costa azedou desde que se tornou autarca de Lisboa em 2021, recua à polémica do altar-palco da JMJ que contaminou o período antes do evento, e afirma que venceu a corrida à Câmara de Lisboa "sem a bolha".

A reboque do lançamento do livro que mistura o seu percurso pessoal com a experiência que tem tido a governar a maior autarquia do país em minoria, Carlos Moedas recebe a Renascença no seu gabinete, nos Paços do Concelho, e não se compromete- pelo menos para já - em manter-se no cargo para lá de 2025.

Como é que surgiu a ideia de escrever um livro sobre a sua governação e também sobre o seu percurso pessoal?

É uma maneira muito anglo-saxónica de prestar contas. Um balanço daquilo que foi feito, dois anos de muita dificuldade, mas também muita concretização. Uma parte autobiográfica e depois a minha visão sobre a política hoje. O que é que mudou na política e porque é que deve ser feita de uma maneira diferente. Penso que muitos políticos não perceberam isso e afastaram-se das pessoas. Hoje temos de apostar em ser próximos, co-construir e co-desenhar a cidade com as pessoas.

Fala muito de liderar com as pessoas, tal como diz o título do livro, acha que essa proximidade de que fala é uma forma de combater forças populistas?

Sem dúvida. Hoje o populismo acontece porque os políticos se afastaram das pessoas. Isso criou desânimo a muito desespero, aliás, muito do voto populista é um voto de desespero, as pessoas já não acreditam na política nem nos políticos. Por isso é que é tão importante voltar às pessoas e trabalhar com elas lado a lado.

É como o caso dos cartazes do Marquês de Pombal, as pessoas no autocarro diziam-me que queriam tirá-los. Muitos deles [políticos] disseram que não podemos tirar, vamos pô-lo em tribunal se tirar os cartazes, o que mostra que o mundo político está desligado das pessoas. A maneira de combater o populismo é realmente essa ligação às pessoas e também um impacto nas nossas medidas.

Carlos Moedas tem governado a minoria na Câmara de Lisboa. Já falou com Luís Montenegro? Vai ter um desafio semelhante, só que na Assembleia da República...

Eu falo muito com o Luís Montenegro. Aliás, no livro conto que há muitos anos ele já me tinha dito que eu me deveria candidatar à Câmara de Lisboa. Aprendemos muito um com o outro, ele conhece bem o que tem sido a minha experiência e a capacidade de negociação que é necessária quando estamos em minoria. No mundo em que vivemos, em que os populismos estão a crescer, os países vão ter de viver com governos minoritários e isso exige da parte da oposição uma responsabilidade enorme.

As pessoas não querem ir a eleições todos os anos, querem que os mandatos sejam cumpridos. Para isso é preciso a responsabilidade de quem governa, mas também uma maior responsabilidade de quem não governa, que não pode estar constantemente a tentar fazer cair os governos. Há uma responsabilidade, neste caso, muito grande do Partido Socialista.

A Câmara de Lisboa tem conseguido fazer aprovar os orçamentos, o executivo não caiu até agora. Acha que Luís Montenegro vai conseguir cumprir os quatro anos de mandato?

Espero bem que sim, é muito importante para o país e eu acho que Luís Montenegro vai fazer tudo para que isso aconteça através, como eu, do concreto das pessoas e das medidas que vai tomar. Um Governo, hoje em dia, é muito difícil de montar. As pessoas já não querem ir para a política, não querem ser ministros. Luís Montenegro está a montar uma equipa e, portanto, é muito importante que ele esteja nesse recato e nesse silêncio, acho que ele faz muito bem.

Diz no seu livro que venceu “sem a bolha” nas autárquicas de 2021, acha que aconteceu o mesmo com Luís Montenegro?

Senti muitos paralelos, é verdade, mas nunca se pode comparar eleições locais com eleições nacionais. É todo um país, mas o que eu vi foi também em Luís Montenegro, como aconteceu em Lisboa, a uma caminhada em crescendo. Quando chegou ao fim, os portugueses disseram que sim, disseram que queriam que fosse Luís Montenegro o primeiro-ministro. Há uma mudança de ciclo que era muito desejada.

No seu livro não resiste em falar da sua relação com António Costa e marca diferenças nessa relação de quando Carlos Moedas era comissário europeu e quando depois se tornou presidente da Câmara. O que é que mudou? Que críticas são essas?

Não é uma crítica, gosto de ser transparente a contar a história. Nós tínhamos uma relação muito construtiva quando eu fui comissário europeu, até era criticada por alguns militantes do meu partido. Mas dei sempre tudo pelo país acima dos partidos, era importante defender o país e fizemos isso, na altura, trabalhámos muito bem em conjunto.

Quando me tornei presidente da Câmara de Lisboa houve uma mudança de atitude e no livro conto muito pontos em que, para mim, essa mudança era óbvia. António Costa tinha dito, anteriormente, que era importante que a Câmara de Lisboa tivesse sempre um representante na Santa Casa da Misericórdia, mas, quando me tornei presidente da Câmara, ele já não pensava da mesma maneira. Quando estávamos a desenvolver o projeto da Fábrica de Unicórnios, há um lado da ala do Beato, que é do Ministério da Defesa e que estava prometido por António Costa a Fernando Medina. Quando fui eu foi retirada. São muitos exemplos, mas eu respeito muito quem foi primeiro-ministro neste país, é muito difícil.

Também sentiu isso em relação à Jornada Mundial da Juventude?

Na Jornada Mundial da Juventude, aquilo que eu senti, e que o Tribunal de Contas veio confirmar, é que quando nós chegámos [2021] não havia nada feito e isso teve um custo grande. Eu tive de arriscar, sempre dentro das normas e daquilo que era a total transparência. Nas adjudicações diretas que fizemos, consultávamos muitos fornecedores, tentávamos encontrar o melhor preço. Mas quando chegámos não havia nada feito para um evento que era mega, o maior evento de sempre. Conto aí essa minha solidão, sobretudo no momento do famoso altar-palco, que era grande e depois se tornou pequeno .

Ao dia de hoje, sem essa agitação mediática em torno do altar-palco, como é que descreve essa polémica?

A polémica morreu no dia em que chegou o Papa. A cidade viveu um momento que nunca se repetirá na história para além da religião, da própria Igreja, vivemos um momento de união absolutamente extraordinário.

Tenho tantas pessoas que me dizem que estão muito arrependidas de terem saído de Lisboa naquela altura e eu digo-lhes que tem razão em estar arrependidos, porque aquele momento nunca se voltará a repetir. Isso foi graças ao trabalho que fizemos e a Câmara de Lisboa foi, de facto, um ator principal. Toda a parte religiosa correu lindamente e a relação que tive com o D. Américo e todos aqueles que representam a Igreja foi extraordinária. Mas a logística toda do evento, com algumas exceções em Oeiras em Cascais, vem daquilo que nós investimos em Lisboa. Não tem paralelo, devemos ter todos um orgulho enorme.

Descreve-se neste livro como um homem inconformado, sem medo de desafios e constantemente a estimular-se a chegar mais longe. O seu futuro político pode ir além da Câmara de Lisboa?

O meu futuro político é na Câmara. Os atores políticos estão sempre a pensar para onde é que vão e o que vão fazer. É típico da política antiga, a nova política tem de ser genuína e no momento. Nunca sonhei ser comissário europeu nem presidente da Câmara de Lisboa, mas sou hoje um privilegiado, não podia gostar mais do que faço. Se a sua pergunta é se estou a gostar e estou bem, estou.

A minha pergunta é se pretende continuar à frente da Câmara de Lisboa para lá de 2025...

Essa é uma pergunta sobre uma especulação futura. Não é o momento. Agora o momento é de trabalho, de construir, fazer, continuar a fazer aquilo que faço bem que é retribuir às pessoas aquilo que foi, no fundo, a minha vida com algo muito concreto. É isso que eu estou a fazer, não é o momento de falar nem 2025 em 2026, até porque não estamos em 2025 ou 2026.

Não gostava de ver algumas das obras que iniciou, como Plano de Drenagem ou as obras no Metro de Lisboa, a ser inauguradas enquanto presidente da Câmara?

Gostava e farei tudo por isso. Vivemos ainda num país com muita burocracia e em que, muitas vezes, não depende de nós. O famoso túnel do Plano de Drenagem já esteve parado vários meses por questões arqueológicas. Acho que a arqueologia é muito importante, mas também não justifica estar meses parada, porque cada dia que passa custa muito dinheiro ao contribuinte. Depois um dia vão dizer “ai afinal a obra foi mais cara?”. Sim, foi mais cara porque esteve parada três meses porque não tínhamos um aval da Direção do Património. Temos uma boa relação com a Direção do Património Cultural do Estado, mas já houve alguns atrasos em que eu não fiquei muito contente. Há atrasos, não vou aqui dar um timing. Posso dizer que o túnel já escavou mais de 100 metros.

Deve ficar para depois de 2025?

A minha expectativa era que se conseguisse antes do final de 2025, mas com as paragens que temos, eu penso que não ficará. Do ponto de vista político, o importante é que ela seja feita e que a tuneladora não pare. O furo há de chegar a Santa Apolónia.

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  • Anastácio José Marti
    26 mar, 2024 Lisboa 11:29
    Será bom que pense várias vezes, após a vergonha que passou aquando da JMJ em que foi preciso vir o PAPA de Roma a Lisboa para o informar de que o Bairro da Serafina também pertence a Lisboa, mas que apesar disso, o mesmo que acusa os portugueses da falta de audácia para fazer seja o que for, desde que assumiu o cargo, nem uma diligência fez para que os seus concidadãos do Bairro mencionado, da Quinta do Ferro, etc alguns que nem água potável têm neste século XXI, pudessem vir a ter acesso a uma habitação com um mínimo de dignidade, segurança e higiene, que nunca tiveram em todo este tempo, porque este sujeito e a sua vereadora da habitação rigorosamente nada fizeram em todo o mandato, para terminarem de vez com estas vergonhas municipais, motivos pelos quais a fingirem que resolver os problemas da cidade e dos seus concidadãos não precisamos destes políticos que apenas usam o país e as suas autarquias para vingarem e nunca para os servirem, como os exemplos aqui mencionados disso são prova. Onde estão a audácia, vergonha, responsabilidade e honestidade intelectual dos políticos que assim se comportam para com os seus munícipes a quem sabem pedir o voto quando dele necessitam e que não mechem uma palha para resolver as vergonhas municipais mantidas e agravadas com o tempo pelas inércias, inoperâncias, passividades e irresponsabilidades destes políticos da treta que Lisboa sempre teve.

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