18 mai, 2024 - 08:00 • Sandra Afonso , Arsénio Reis , Beatriz Pereira (vídeo)
António Mendonça admite que até pode vir a ser convencido do contrário, mas agora não tem dúvidas em considerar que "é um desperdício, neste momento, de recursos" a eliminação das portagens nas ex-SCUT, seja na Via do Infante ou no Interior Norte, por exemplo.
Em entrevista à Renascença, ao programa Dúvidas Públicas, o antigo ministro das Obras Públicas de José Sócrates acrescenta ainda que "foi sobretudo utilizado para motivos eleitorais", também por isso a decisão lhe merece "reservas".
Em causa está uma medida aprovada no Parlamento, apesar dos votos contra dos partidos que sustentam o governo. A eliminação destas portagens passou com os votos de uma coligação negativa, entre o Chega e o PS.
O diploma socialista contou com o apoio do Chega, (...)
Questionado sobre se uma eventual sucessão de aprovações de medidas despesistas por esta coligação negativa pode pôr em causa a continuação do Governo, António Mendonça pede bom senso, uma expressão que repete várias vezes ao longo desta entrevista.
O ex-ministro das Obras Públicas diz ainda que ficou surpreendido com a decisão rápida do Governo sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa, mas não entende o prazo de 10 anos dado por Luís Montenegro para concluir a obra, que segundo António Mendonça pode ficar pronta em apenas 5 anos. Avisa ainda que o interesse nacional deve estar acima do interesse da Vinci, que tem a concessão dos aeroportos e com quem o Governo tem agora de negociar.
Para o Bastonário dos Economistas, a discussão entre o anterior e o atual ministro das Finanças sobre o estado das contas públicas "não é útil" e é até "prematura". António Mendonça lembra que há duas formas de registar estas despesas e receitas: em contabilidade pública, que serve para controlar a gestão e a tesouraria, e a contabilidade nacional, mais dirigida à avaliação macroeconómica, e que é utilizada nos reportes a Bruxelas.
O economista sublinha que ainda é cedo para apresentar os números em contabilidade nacional, pelo que esta troca de acusações entre Fernando Medina e Miranda Sarmento não passa de ruído, que até pode prejudicar a imagem que o país mantém no espaço europeu.
Transportes
Os estudos para a ponte rodoviária e ferroviária e(...)
Questionado sobre se há margem orçamental para todas as medidas apontadas como prioritárias pelo Governo, António Mendonça avisa apenas que será necessário fazer escolhas, já que é certo que este ano Portugal não irá apresentar um excedente orçamental da mesma magnitude de 2023.
Portugal fechou o último ano com o maior excedente em 50 anos de democracia, 1,2%. O bastonário não atribui este resultado ao trabalho de Fernando Medina, mas à conjuntura.
Sobre o exercício deste ano, defende que "é óbvio que tem de haver ajustamentos", o Governo "tem muitos desafios pela frente" e os compromissos assumidos com os professores e os polícias, entre outros, colocam "problemas sérios".
António Mendonça lembra que o executivo está limitado pelo anterior Orçamento do Estado na despesa que pode realizar. Também por isso, o Orçamento Retificativo é uma opção que "tem sempre de ser colocada".
Nesta entrevista, António Mendonça critica a política seguida pela presidente do BCE, Christine Lagarde, de forte subida dos juros para travar a inflação, mas que acabou por reter o crescimento ao ponto de vários países europeus estarem sob a ameaça de recessões.
O Bastonário espera agora que o alívio dos juros por parte do Banco Central Europeu surja de forma acelerada. O BCE prometeu começar a descer as taxas já em junho.
Este alívio é ainda importante no atual contexto, em que entraram em vigor as novas regras orçamentais. Mendonça fala numa "quadratura do círculo", a Europa quer relançar o crescimento económico, conciliando o investimento, as reformas estruturais e fiscais, a contenção da dívida e a redução dos défices. "Vamos ver como é que eles conseguem fazer isso", diz.
O professor catedrático do ISEG defende ainda a intervenção do regulador na banca, no atual contexto de juros altos, para garantir que as alterações nas taxas de juro são refletidas nas comissões e na remuneração dos depósitos e não apenas nos créditos. Esta deve ser uma intervenção ao nível nacional e europeu, "introduzindo regras, contendo os apetites naturais (da banca)". Cabe aos reguladores "conciliar o interesse particular dos bancos com os interesses da economia no seu conjunto".
"Eu recuso-me!" É como reage António Mendonça à ideia de reduzir o país a um beneficiário de fundos europeus, que anda de mão estendida, como já foi apresentada por candidatos às eleições europeias. Para o bastonário dos Economistas, é preciso olhar para a política de redistribuição europeia de outro prisma.
"Provavelmente, já deveríamos estar mais autónomos relativamente à dependência europeia em matéria de financiamentos", admite. No entanto, "os financiamentos têm uma função económica importante que não é apenas ajuda a Portugal, é criação de condições para que a Europa, no seu conjunto, possa adquirir competitividade e eficiência", conclui.
O economista diz ainda que falta coerência nas políticas europeias, e dá como exemplo as atuais dificuldades que sentem vários países, incluindo o motor económico da Europa, a Alemanha.
Sobre as próximas eleições, António Mendonça diz que gostava que se discutisse mais na campanha o papel de Portugal e o projeto europeu. "A Europa precisa de criar uma identidade no mundo e Portugal tem uma história e excelentes relações com outros países", lembra o economista. Portugal pode abrir caminho por África, pela América do Sul ou pela Ásia.
Estes são apenas alguns dos temas abordados pelo Bastonário da Ordem dos Economistas e ex-ministro das Obras Públicas, António Mendonça, nesta entrevista ao programa Dúvidas Públicas da Renascença. Um programa que é transmitido aos sábados, depois do meio-dia, e que fica também disponível online e em podcast.