07 abr, 2018 - 14:01 • Marina Pimentel
“Houve manipulação” na forma como os crimes foram classificados no Relatório Anual de Segurança Interna, recentemente entregue na Assembleia da República (em março). A acusação é da juíza desembargadora Maria Matos.
Em causa está a descida de 8,7% da criminalidade grave e violenta, referida no relatório (RASI 2017). Diz a juíza do Tribunal da Relação de Guimarães que destes dados foram excluídos, nomeadamente, os assaltos às máquinas multibanco, que registaram um aumento de 76% no último ano.
Maria Matos considera, por isso, que “esses assaltos foram classificados como criminalidade geral, para que fossem obtidas estatísticas mais favoráveis”.
A secretária-geral do Sistema de Segurança Interna, Helena Fazenda, que elaborou o relatório, nega qualquer manipulação de dados, que diz serem fornecidos por entidades certificadas e “seguirem critérios internacionais de classificação”.
Helena Fazenda argumenta mesmo que “não seria um conjunto de 230 assaltos a caixas multibanco que iria pôr em causa a descida registada na criminalidade grave, em 2017”.
A juíza desembargadora de Guimarães contra-argumenta, defendendo que “a tipologia usada não espelha a realidade”, pois “trata-se de um tipo de criminalidade que causa grande alarme social, utiliza meios explosivos e funciona normalmente em associação criminosa”.
“Estamos, portanto, perante criminalidade grave ou mesmo muito grave”, defende Maria Matos.
O Relatório Anual de Segurança Interna 2017 revela uma descida da criminalidade comparando com a registada em 2016. E, ao contrário do que aconteceu nesse ano, não houve uma descida da criminalidade geral – mas antes uma subida, ainda que ligeira.
Um dos países mais seguros do mundo?
A secretária-geral do Sistema de Segurança Interna desvaloriza a comparação entre os dois últimos anos e defende que “o decréscimo de mais de 8% da criminalidade grave, embora sendo menor do que o registado em 2016, é muito importante para o turismo e para a perceção dos portugueses”.
Helena Fazenda diz que Portugal “está entre os países mais seguros do mundo, lembrando que um relatório recente colocava o nosso país como o terceiro mais seguro do mundo, atrás da Islândia e da Nova Zelândia.
António Nunes, presidente do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT), coincide na avaliação de que Portugal é um país seguro. Mas defende que “é preciso estudar melhor a realidade portuguesa”, porque o retrato feito pelo relatório anual de segurança “não é completo”, dado que “só regista a criminalidade participada”.
O presidente do OSCOT defende, por isso, “a realização de inquéritos de vitimação” – uma opinião partilhada por Frederico Marques, dirigente da Associação de Apoio à Vítima, para quem é preciso “seguir o exemplo de outros países europeus e perguntar às pessoas se foram vítimas de crime, se participaram o crime e, se não o fizeram, qual foi a razão”.
Helena Fazenda, secretária-geral do Sistema de Segurança Interna, concorda com a necessidade desses estudos, mas explica que “ainda não se avançou, por falta de recursos”.
António Nunes, Frederico Marques, Helena Fazenda e Maria Matos foram os convidados deste sábado do programa Em Nome da Lei, que debateu o Relatório Anual de Segurança Interno 2017.