Análise

Óscares. Oppenheimer dominou, mas prémios quiseram honrar um pouco de tudo

11 mar, 2024 - 06:05 • João Malheiro

A Academia de Cinema norte-americana mantém a tendência de diversificar as premiações, quer em termos numéricos, quer em realidades que representam.

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E os Óscares vão para... Oppenheimer. Filme conquista sete prémios em noite de (poucas) surpresas
E os Óscares vão para... Oppenheimer. Filme conquista sete prémios em noite de (poucas) surpresas

A 96.ª gala dos Óscares terminou como toda a gente esperava: A consagração de Christopher Nolan, depois de tantos anos a falhar nomeações ou a não ser escolhido como vencedor, e a vitória do filme mais aclamado da época de prémios.

Nem sempre é o caso, mas desta vez o prémio de Melhor Filme foi também justificado nas restantes categorias. Cillian Murphy, que carrega a longa-metragem às costas numa interpretação excecional fora dos lugares comuns de uma biopic, venceu Melhor Ator, assim como o seu parceiro de cena Robert Downey Jr., a fazer de Lewis Strauss, o burocrata calculista que serve de contraste ao cientista romântico, em Melhor Ator Secundário.

Nos prémios, as componentes mais marcantes de "Oppenheimer" também saíram vitoriosas: Banda Sonora, Direção de Fotografia e Edição. Jennifer Lame torna-se apenas a terceira mulher a ser recompensada nesta última categoria.

E claro, o maestro desta sinfonia cinematográfica, o próprio Christopher Nolan a receber a estatueta de Melhor Realizador, logo das mãos de Stephen Spielberg. No fundo, a passagem da coroa do Rei dos Blockbusters do século XX para o novo do século XXI.

Em 13 nomeações, acabou com sete - mais de metade. Por contraste, "Barbie" apenas venceu Melhor Canção Original. Na equação "Barbenheimer", que ajudou a revitalizar a experiência de sala de Cinema, num período de greve de argumentistas e atores, numa indústria que ainda recuperava dos efeitos das restrições da Covid-19, foi o filme de Christopher Nolan que recebeu maior consenso artístico.

No entanto, as nomeações da Academia a "Barbie" devem ser vistas como um igual reconhecimento do filme mais visto no mundo (e em Portugal), em 2023. Afinal, uma comédia baseada numa boneca não é propriamente o que associamos a filme de Óscar, o que torna a sua presença na gala uma vitória por si só. E até poderia ter saído desta noite com mais prémios para lá daquele que foi atribuído a Billie Eilish, contudo a indústria tinha outro favorito.

"Pobres Criaturas", longa-metragem bizarra e surrealista, com violência gráfica e cenas de sexo explícitas, representa outro nicho, mais projeto de autor que não tem uma escala comercial, e que, mesmo assim, capturou o apreço da Academia de Cinema norte-americana. As componentes de Caracterização, Guarda-Roupa e Direção de Arte poderiam se ter traduzido em vitórias de "Barbie", mas foi o filme de Yorgos Lanthimos a dominar neste aspeto.

E ainda deu para Emma Stone ganhar o segundo Óscar da carreira, mais uma vez na categoria de Melhor Atriz, derrotando Lily Gladstone num dos duelos mais imprevisíveis dos últimos anos. Terá sido uma verdadeira valorização do contributo de Emma Stone, que também produziu "Pobres Criaturas", e a atuação arriscada e fora do que é tipicamente galardoado.

De resto, os Óscares mantêm o caminho aberto, por completo, pela vitória total de "Parasitas", em 2020, de diversificar as premiações, quer em termos numéricos, quer em realidades que representam. "A Zona de Interesse", para lá de vencer na categoria de Melhor Filme Internacional, conseguiu, ainda, roubar o prémio de Melhor Som a "Oppenheimer".

"Anatomia de uma Queda", vencedor do Festival de Cannes de 2023, estava nomeado em quatro categorias e a realizadora Justine Triet levou mesmo a estatueta dourada pelo argumento original que escreveu com o marido. "Godzilla: Minus One", recebeu o Óscar de Melhor Efeitos Visuais, vencendo "O Criador", que tinha ganho na gala especializada, há algumas semanas atrás. No ano em que faz 60 anos, o icónico kaiju japonês finalmente venceu um prémio da Academia de Cinema norte-americana.

O Japão voltou a desafiar as expetativas em Melhor Animação. Quando a vitória de "Homem-Aranha: Através do Aranhaverso" estava praticamente garantida, acabou por ser "O Rapaz e a Garça" de Hayao Miyazaki a receber a estatueta.

E houve disponibilidade até para dar o primeiro Óscar da carreira a Wes Anderson,o primeiro Óscar de sempre a um filme ucraniano, pelo Documentário "20 Days in Mariupol", num dos discursos mais emotivos da noite e recompensar "American Fiction" em Melhor Argumento Adaptado.

O que tem sido claro nos últimos anos é que a Academia, à medida que tem convidado uma pluralidade maior de artistas internacionais, tem, igualmente, recompensado mais tipos de Cinema. Simultaneamente, em parte devido ao tempo de "Lua de mel" do streaming estar a terminar e à era dos super-heróis apresentar desgaste, agora há uma necessidade crescente de reconfigurar o espaço comercial das salas de Cinema para atrair mais público para outro tipo de produções e resgatar o blockbuster clássico. Não será, por isso, surpreendente que depois de "Top Gun: Maverick" no ano passado, este ano os Óscares tenham celebrado "Oppenheimer" e "Barbie", de formas distintas e ainda mais veementes.

Se em termos de atribuição de troféus tudo correu bem, em sentido contrário, Jimmy Kimmel revelou desgaste no cargo, produzindo piadas cansadas e dentro do estilo que já habituou os espectadores. Não deixa de ser irónico que o seu melhor momento da noite foi quando respondeu às críticas de Trump, numa piada um pouco mais incisiva do que as pequenas brincadeiras que costuma fazer à custa do Cinema.

Nota ainda para o momento "In Memoriam", que honra os artistas que morreram durante o último ano, pela negativa. Se ter Andrea Bocelli e o seu filho a cantar "Con Te Partirò" poderia ter sido um positivo, a realização falhou redondamente em filmar para a audiência televisiva as homenagens que estavam a ser feitas. Em vez de vermos claramente os nomes e caras de quem partiu, as câmaras focaram-se em planos abertos do palco ou em imagens fechadas de Bocelli. Grande parte da homenagem passou sem que se tenha percebido bem quem a integrou.

De resto, ficará a curiosidade para saber se a presença de filmes tão populares vão resultar num aumento de audiência, de uma cerimónia que a tem perdido, consistentemente nos últimos anos. A mudança de horário, antecipando bastante o começo e, subsquentemente, o fim da gala, também pode ter ajudado.

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