António Pinho Vargas assume que pertence ao “grupo dos inquietos” que mudam de estilo musical

15 dez, 2023 - 18:24 • Maria João Costa

O pianista e compositor acaba de lançar “Lamentos”, um disco com três novas peças que escreveu para orquestra. Pinho Vargas confessa que “o jazz está guardado num sítio secreto” do seu coração e que, agora, prefere escrever para orquestra.

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O seu nome confunde-se com a música. Aos 72 anos, o pianista e compositor António Pinho Vargas está a lançar um novo disco. “Lamentos” é álbum que conta com a Orquestra Metropolitana de Lisboa, com a direção do maestro Pedro Neves, as solistas Ana Pereira no violino e Joana Cipriano na viola.

Em entrevista à Renascença, António Pinho Vargas confessa-se “muito satisfeito com as gravações”. O músico, que admite ter saído de “uma situação não muito fácil”, mostra-se contente com o resultado do disco.

Pinho Vargas lembra que este disco apresenta “música tocada e gravada em sessão de estúdio”, o que segundo o próprio “não é uma coisa frequente nesta área”. O autor lembra que muitas das vezes as “gravações eram de concertos ao vivo”, incluindo alguns erros ou momentos menos bons.

“Aqui não. É um trabalho à maneira antiga. E é um gosto enorme ver a qualidade, o empenho, a alegria com que todos eles se entregaram ao projeto”, refere Pinho Vargas, que explica que o disco inclui três peças.

“A primeira é um Concerto para Violino que foi estreado em 2016, e composto nos dois anos anteriores. Depois o Concerto para Viola composto em 2016, e a Sinfonia Subjetiva estreada em 2019, e composta nos dois anos anteriores”, apresenta o compositor.

Segundo Pinho Vargas, “tanto o Concerto para Violino, como a Sinfonia Subjetiva estrearam no Centro Cultural de Belém, com a Orquestra Metropolitana, em diferentes contextos, com diferentes maestros, mas estão ligados à Metropolitana e ao CCB”, indica.

“O Jazz está guardado num sítio secreto do meu coração”

Em entrevista ao Ensaio Geral, da Renascença, António Pinho Vargas fala do seu percurso como compositor. Ao longo da vida foi mudando de rumo. Diz que pertence ao “grupo dos inquietos”, como Stravinsky.

“Há compositores que toda a vida fazem, mais ou menos, a mesma música. Há alguns músicos de Jazz que tocam sempre da mesma maneira. Eu pertenço ao outro grupo, ao grupo dos inquietos, daqueles que mudam de estilo. São os Stravinsky deste mundo. Como sabe, o Stravinsky teve três estilos. A fase russa, a neoclássica e a serial. Essa inquietude faz parte”, explica.

Olhando para o fio da vida, António Pinho Vargas recorda que a sua primeira fase passou pelo jazz. “Gravei discos e isso era uma prática musical. Ao mesmo tempo, estava a começar a compor peças de música contemporânea. Nessa fase predomina a música de câmara e música para poucos músicos. Depois há uma fase que componho óperas, e finalmente tenho composto especialmente música para orquestra”, detalhe.

Questionado sobre essa transformação musical, Pinho Vargas diz que “implica muito estudo sobre orquestração”. “Não tem nada a ver com o jazz que pratiquei em tempos. Tudo isto implica a aquisição de uma série de ferramentas de outro tipo”, explica o pianista, que confessa que essa aprendizagem demorou “10 anos”.

“Continuo a tocar piano. Por vezes, a composição passa pelo piano, mas às vezes não passa! Não é obrigatório que passe”, explica Pinho Vargas sobre a forma como as suas composições nascem. Já sobre o jazz que fez no passado, Pinho Vargas não mostra nostalgia.

“O jazz está guardado num sítio secreto no meu coração, porque foi uma fase muito importante na minha vida".

"Adoro aqueles discos, adoro as músicas que compus e tocámos. Tenho uma enormíssima atitude afetiva em relação aquela música e aquele período da minha vida. Simplesmente, já passou. Agora faço outra coisa que até nem é Jazz, não é improvisado, nem nada!”, refere.

“A presença da tradição religiosa da História da música ocidental é potentíssima”

Ao longo da sua vida, António Pinho Vargas tem no seu reportório várias óperas, e também muita música de caráter religioso. Questionado sobre essa inquietação, o compositor admite que é “não crente”.

Apesar de ter lido “a Bíblia aos 15 anos”, numa altura de “crise de fé”, Pinho Vargas alega que não voltou a abraçar a dimensão espiritual. Mas isso não o impediu de compor.

“Tratei muitos textos religiosos. Devo dizer que aquilo era música para coro e orquestra. Aí a presença da tradição religiosa da História da música ocidental é potentíssima”, refere o compositor.

Na sua opinião, “aqueles textos são muito importantes para a nossa cultura no seu todo. Muitas vezes são peças de uma enorme beleza literária e sobretudo, são coisas que todos percebemos de uma maneira ou de outra, porque ouvimos falar desde muito novos. São presença na nossa cultura, independentemente da crença que não voltei a ter”.

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