17 jul, 2024 - 11:26 • Daniela Espírito Santo , Pedro Mesquita , Susana Madureira Martins com Redação
O Tribunal de Justiça da União Europeia considera que a Comissão Europeia não deu ao público "acesso suficientemente amplo" aos contratos efetuados para a compra de vacinas contra a covid-19. A informação é avançada esta quarta-feira pelo Politico.
A decisão significa que a atual presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, perdeu o caso de transparência no principal tribunal da UE, numa altura em que precisa de garantir o apoio de 361 eurodeputados para ser reconfirmada no cargo.
Um grupo de eurodeputados dos Verdes pediu para ter acesso aos contratos efetuados a nível europeu para a aquisição de vacinas para combater a pandemia, em 2021, sendo que a Comissão apenas concordou em conceder acesso parcial a estes dados.
O argumento avançado na altura foi o da proteção de interesses comerciais, bem como questões de privacidade. Insatisfeitos, os eurodeputados levaram a Comissão a tribunal e ficaram agora a conhecer a resposta: o tribunal entende que, de facto, a decisão de não revelar parte dos contratos contém "irregularidades" e não ficou provado por que razão revelá-los "prejudicaria efetivamente os interesses comerciais" das empresas em questão.
A presidente da Comissão Europeia está a ser investigada pela Procuradoria Europeia devido a alegadas irregularidades na negociação com a Pfizer para a compra de vacinas Covid-19. O processo passou nos últimos meses do Ministério Público (MP) belga para os procuradores europeus, num caso já conhecido como “Pfizergate”.
As suspeitas envolvem “interferência em funções públicas, destruição de SMS, corrupção e conflito de interesses”, de acordo com um porta-voz do MP de Liège e documentos oficiais consultados pelo jornal Politico. O acordo entre a Comissão Europeia e a farmacêutica Pfizer, para aquisição de vacinas para a Covid-19, foi celebrado em 2021 e representa um custo de 20 mil milhões de euros.
Entretanto, a Comissão Europeia já reagiu à decisão do Tribunal sobre as vacinas. Lê-se num comunicado a que a Renascença teve acesso, que a Comissão teve de encontrar um equilíbrio difícil entre o direito do público à informação, incluindo os deputados europeus, e os requisitos legais que resultaram dos próprios contratos COVID-19 que poderiam culminar em pedidos de indemnização à custa dos contribuintes. O comunicado conclui que nesta fase, a Comissão reserva as suas opções jurídicas.
A Renascença já pediu uma reação de Sebastião Bugalho, que integra o PPE de Von der Leyen, e também de Marta Temido – em nome da família socialista - e por agora, ninguém quis comentar esta decisão judicial, que é conhecida precisamente na véspera de ser votada a recondução da atual presidente da Comissão Europeia. Como dizia há pouco à Renascença um eurodeputado português, que prefere não ser identificado,” isto tem tudo para correr mal”.
A verdade é que, apesar do compromisso alcançado há mais de um mês entre o PPE, o grupo dos Socialistas Europeus e os Liberais – um acordo que foi validado no Conselho Europeu de 27 de junho – a decisão cabe aos eurodeputados, o voto é secreto e é fácil perceber nos corredores do Parlamento de Estrasburgo que o nome de Von der Leyen não agrada a todos os eurodeputados, sejam eles socialistas ou do PPE, a sua própria família política. Há, contudo, outras fontes contactadas pela Renascença a garantir que nada disto irá impedir a reeleição de Úrsula, em nome da estabilidade e do acordo alcançado entre as principais famílias políticas.
À Renascença, fonte diplomática diz que esta decisão do Tribunal de justiça da UE "ajudar não ajuda" à votação do nome de Von der Leyen esta quinta-feira no Parlamento Europeu, mas que o recente ambiente político global pode ajudar. Exemplos disso são as viagens "provocação" do primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán à Rússia e à Ucrânia ou o atentado ao Trump, que a mesma fonte considera que "podem ter aumentado as chances de um voto favorável" na candidata indicada pelo PPE e apoiada por diversas famílias políticas, incluindo os socialistas europeus.
"Muitos deputados rebeldes do S&D, Liberais, PPE e até os Verdes podem ter ficado assustados com os riscos de uma crise institucional e passarem a votar a favor de Von Der Leyen", admite esta fonte diplomática à Renascença que assume que a sentença vem dar força aos Verdes "recalcitrantes", mas que "está tudo em aberto". No caso de a votação e eleição de Von Der Leyen falharem não há um plano B "imediato", reconhece esta fonte e " os efeitos serão muito sérios no desprestígio da UE e na criação de desconfiança entre os grupos políticos no Parlamento Europeu".
Ainda assim, as hipóteses de que se fala no meio político de Bruxelas para compensar um eventual desaire são nomes como o da recém-eleita presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, que passaria facilmente entre os eurodeputados, mas que é reconhecido que não tem experiência executiva, o primeiro-ministro croata Andrej Plenkovic, que é público que quer muito, mas tem anticorpos ou ainda o primeiro-ministro grego Kyriákos Mitsotakis, que fonte diplomática diz à Renascença que seria o "mais bem acolhido" no Conselho Europeu, mas é uma incógnita se quer o lugar.
[Notícia atualizada às 14h38 de 17 de julho de 2024]