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Tomada de Posse da Assembleia da República

Dia de loucos no Parlamento (sem presidente): o que era protocolo deu um nó político

27 mar, 2024 - 00:02 • Tomás Anjinho Chagas

Na tomada de posse, a Assembleia da República tornou-se palco de braço de ferro político. Ainda no primeiro dia, a história de deputados perdidos, CDS de volta e um funcionário que conheceu Sá Carneiro e agora recebe Montenegro.

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Os dias de tomada de posse na Assembleia da República são, habitualmente, dias calmos de e de alguma magia. Normalmente são assim, este não foi.

A normalidade tombou quando se votou o presidente da Assembleia da República. José Pedro Aguiar-Branco, era um eleito pré-anunciado. A direção de Montenegro já tinha assumido que não se opunha a um vice-presidente do Chega e esse lugar era visto como moeda de troca para superar o facto de não ter maioria. Não foi.

De forma inesperada, o nome de Aguiar Branco foi chumbado ao não conseguir os 116 votos necessários para ser eleito. Apesar do voto ser secreto, as contas demonstram que terão sido os deputados do Chega a inviabilizar o nome do antigo ministro da Defesa. “Não é não”, ironizou André Ventura no final, culpando o PSD por ter rompido um acordo.

O travão a fundo mergulhou a escolha do próximo presidente da Assembleia da República num fosso político marcado, antecipando aquilo que o país pode viver nos próximos meses. Não há maioria, não há acordo para a colmatar, e o Chega está a pressionar o PSD a ceder.

A terceira votação voltou a falhar e o partido de André Ventura aproveitou o momento para avisar a AD que não será muleta nesta legislatura.

Tomada de posse além do drama

Uns entram agora, outros conhecem bem os cantos à casa. A tomada de posse no Parlamento tem sempre uma energia própria (desta vez foi muito própria). António Filipe, do PCP, quase faz parte da mobília: entrou na Assembleia da República pela primeira vez em 1987. Outros ainda não se orientam nos corredores labirínticos do Palácio de São Bento.

“Já andei 10 minutos às voltas, agora ando à procura de um sítio para fumar”, desabafa um estreante deputado socialista à Renascença. Ao balcão de um dos bares pede um café e ganha ânimo para voltar a aventurar-se pelo edifício.

De manhã os deputados tiveram a primeira sessão. Os deputados do Bloco de Esquerda colocaram um cravo à frente dos seus lugares, num gesto que Mariana Mortágua apelidou de “simbólico” pela proximidade do 25 de abril.

Há uma viragem. Oito anos depois há maioria de direita no Parlamento, ainda que o PSD e o PS tenham exatamente o mesmo número de deputados. Isso serviu para o até aqui líder da bancada socialista gracejar na primeira sessão, quando se referiu à bancada do PS como a “também maior bancada do Parlamento”, numa frase que soltou gargalhadas do PS mas também do PSD.

Um funcionário que “entra e sai com a AD” no poder

O processo de acolhimento dos deputados acontece na biblioteca da Assembleia da República. Perto de uma estante está um homem que parece peixe na água, e é. Chama-se Manuel José Gama, tem 65 anos e trabalha há 44 no Parlamento, mais recentemente como auxiliar na biblioteca.

Descreve os dias de tomada de posse como “parecidos” ou “iguais” entre eles. E sabe do que fala. Quando começou a trabalhar na Assembleia da República corria o ano de 1980. “É como a gente quando entrava na preparatória, sempre a correr e a conhecer os sítios”, descreve.

Fala sem pretensiosismo mas com a segurança que só uma vasta experiência pode garantir. Poucos meses depois de se tornar funcionário do Parlamento , Manuel José Gama cruzou-se com o então líder da Aliança Democrática: Francisco Sá Carneiro.

“Estava cá há três meses”, recorda sereno. Conta que o antigo primeiro-ministro e figura eternamente acarinhada pela direita era um “homem simpático”, mas não quer revelar o tom das conversas que diz ter tido com Sá Carneiro.

Ironia do destino, 44 anos depois vai reformar-se, e o partido no poder será o mesmo: “Entrei com a AD, vou sair com a AD”, diz enquanto se ri.

Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos na eleição do presidente da Assembleia da República. Foto: Tiago Petinga/EPA
Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos na eleição do presidente da Assembleia da República. Foto: Tiago Petinga/EPA

A placa do CDS que voltou de casa de Telmo Correia

“Bom filho a casa torna”, diz o velho ditado. O CDS não é estreante, longe disso mas é, de facto, o único partido que entra no Parlamento em 2024. Os centristas foram empurrados para fora da Assembleia da República em 2022 e esta terça-feira puderam voltar.

A placa que diz “Grupo Parlamentar do CDS-PP”, está de regresso ao Parlamento. Foi Nuno Melo, líder do partido, a aparafusá-la. Com uma chave-estrela, o centrista enroscou os quatro parafusos e fê-la brilhar numa sala que na última legislatura estava ocupada pela maioria absoluta do PS.

Esta estava em casa do Telmo Correia”, confidenciou Nuno Melo à Renascença. “Era o fiel depositário”, diz bem-disposto referindo-se ao ex-deputado e vice-presidente do CDS.

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