Emissão Renascença | Ouvir Online
A+ / A-

Notícia Renascença

"Risco de erros e fraude”. Tribunal de Contas Europeu pressiona Portugal a ocupar lugar vago em pleno PRR

13 mar, 2023 - 07:00 • Tomás Anjinho Chagas , Susana Madureira Martins

TCE fala num momento em que o organismo é “mais crucial do que alguma vez foi” e pressiona Governo português a encontrar um substituto. Executivo responde e garante que "indicará em breve" um nome com o "perfil adequado".

A+ / A-
OuvirPausa
Tribunal de Contas Europeu está a pressionar o Governo português a ocupar um lugar que é do país por direito

Seiscentos e vinte e dois dias. É este o número de voltas que a Terra já deu sobre si mesma, sem que o Governo português repusesse o lugar a que tem direito no Tribunal de Contas Europeu (TCE).

No dia 30 de junho de 2021, João Figueiredo, até ali juiz e membro português deste organismo, morreu subitamente. De lá para cá, o Governo não o substituiu nesta instituição sediada no Luxemburgo.

Em resposta a várias perguntas da Renascença, o Tribunal de Contas Europeu salienta que, nesta altura, Portugal “é o único Estado-membro sem um membro escolhido”. Além disso, o organismo lembra que essa “é uma responsabilidade do Estado-membro” e sugere que a pergunta seja feita ao Governo em Lisboa: “Pode verificar como está o processo com as autoridades nacionais”.

A falta de representação portuguesa, que caminha para os dois anos, torna-se especialmente crítica numa altura de aplicação de um dos maiores pacotes de fundos europeus: o “NextGenerationEU”, que em Portugal ficou cunhado como Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

“A missão do Tribunal Europeu é agora mais crucial do que alguma vez foi”, pode ler-se na resposta enviada à Renascença, onde se acrescenta que a instituição “recebeu novas responsabilidades” com este pacote.

A "bazuca europeia", como lhe chama o primeiro-ministro, António Costa, pode fazer chegar a Portugal mais de 18 mil milhões de euros, entre subvenções e empréstimos. O TCE destaca que este “aumento significativo de fundos aumenta naturalmente o risco de erros, défice de financiamento ou até fraude”.

Em contraponto, o Tribunal de Contas Europeu defende que os seus juízes podem ajudar a União Europeia “a encontrar o compromisso certo entre velocidade e eficiência”.

No entanto, e numa altura em que Portugal já recebeu a segunda tranche do PRR, o país continua sub-representado no organismo. A indicação para este lugar é da responsabilidade de cada Estado-membro, sendo que depois há um parecer do Parlamento Europeu. Por fim, o membro do Tribunal de Contas Europeu é nomeado pelo Conselho da União Europeia.

Esta instituição, sediada no Luxemburgo, lembra que os mandatos são de seis anos e que os membros do Tribunal de Contas Europeu “são obrigados a desemprenhar as suas funções com total independência e no interesse geral da União Europeia”.

Governo irá indicar "em breve" nome "com perfil adequado"

O processo de escolha do nome para representar Portugal no TCE tem sido tratado com pinças. É, de resto, visto como um tema altamente sensível. Em resposta a perguntas da Renascença, o Ministério das Finanças garante que está para "breve" a indicação de um nome para ocupar um lugar a que o país tem direito.

O gabinete de Fernando Medina refere que "o processo de seleção para o membro português do Tribunal de Contas Europeu está em curso e o Governo indicará em breve uma personalidade com o perfil adequado à importante e exigente tarefa de auditar a despesa pública europeia". Não há é propriamente a indicação de uma data para que isso aconteça.

Fica vincada a ideia de que as Finanças não se desinteressaram da escolha de um bom nome que preencha o lugar, dando a garantia que "o Governo atribui elevada importância ao funcionamento regular e eficiente dos organismos de fiscalização financeira".

Mesmo com um lugar vago há praticamente dois anos, o Governo garante que "tem vindo a dar prioridade às nomeações a que está obrigado para estas entidades, suportando as suas escolhas na experiência, qualificações e compromisso com adequado funcionamento financeiro da economia".

João Leão como possibilidade, Centeno pressiona

O nome de João Leão, antigo ministro das Finanças e atual vice-reitor do ISCTE, tem vindo sucessivamente a ser apontado ao cargo.

Quem o colocou na rota foi o jornal europeu Politico, mas em entrevista à Renascença, em janeiro deste ano, João Leão desmentiu: “Essa questão surgiu no jornal Politico, quando o jornal tinha a necessidade de pôr uma conclusão naquele impasse que tinha acontecido com a candidatura portuguesa ao Mecanismo Europeu de Estabilidade. Mas não. Não tinha fundamento, nem havia nada de concreto, nem formal”.

Não havia, mas será que agora há? O jornal ECO também avançou, em dezembro, que o nome do atual vice-reitor do ISCTE consta numa lista final de três candidatos ao lugar.

Também em dezembro, o Presidente da República tentou esquivar-se à pergunta da Renascença. À margem de um evento na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Marcelo Rebelo de Sousa disse que preferia “não se pronunciar sobre o assunto”.

É uma matéria sobre a qual não me queria pronunciar. Como sabe é uma matéria que envolve instituições europeias”, introduziu o chefe de Estado. “Envolve um tribunal, tem um melindre e uma sensibilidade maior”, desviou Marcelo, que concluiu: “Não se pode comparar a uma nomeação do Governo para um órgão político ou administrativo”.

“Vamos esperar para ver o epílogo desse processo, que é um processo mais complexo”, despachava o Presidente da República em dezembro.

Oiça a resposta de Marcelo Rebelo de Sousa abaixo:

OuvirPausa
0:00 / 0:00

Menos paciente está a Rua do Comércio, onde está instalado o Banco de Portugal. Em entrevista ao programa Hora da Verdade, da Renascença e do Público, o governador do Banco de Portugal pressionou o Governo a agir rápido nesta matéria.

“É um lugar que, obviamente, deveria estar preenchido e deverá estar preenchido, espero, em breve. Não acho que seja uma situação normal. Acho que tem mesmo que ser preenchido. O seu não preenchimento fragiliza a presença de Portugal nas instituições europeias, não tenho dúvida sobre essa matéria e, portanto, acho que era importante fazê-lo”, disse Mário Centeno.

O atual governador do Banco de Portugal desdobra-se em elogios para João Leão, que o sucedeu na pasta das Finanças: “Sobre contas, conheço muito poucas pessoas melhores do que o João Leão. Portanto, se é contas, muito provavelmente Portugal ficaria bem representado”, sentenciava Mário Centeno em dezembro de 2022.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+