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Arrendamento acessível

“Tanta gente a um osso”. Sem renda acessível jovens sujeitam-se ao mercado ou não saem de casa dos pais

22 mai, 2023 - 07:00 • Tomás Anjinho Chagas

Programas de renda acessível não conseguem dar resposta à quantidade de pessoas que os procuram. Jovens insistem e adiam a saída dos pais por não conseguirem pagar as rendas praticadas no mercado.

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Foto: Beatriz Lopes/RR
Foto: Beatriz Lopes/RR

As incomportáveis rendas ou as prestações calculadas de uma casa demasiado cara estão a retardar a saída dos jovens de casa dos pais, e a empurrá-los para soluções mais realísticas. Os programas de arrendamento acessível são, mais das vezes, a alternativa fora do mercado encontrada para muitos portugueses que a ele não conseguem corresponder.

No entanto, tal como no mercado de habitação, a procura suplanta largamente a oferta, tornando os programas de habitação um privilégio para os poucos entre os muitos que se candidatam a eles. Em Lisboa, por exemplo, só 2% das candidaturas conseguem uma casa, como revelam os dados divulgados esta segunda-feira pela Renascença.

Numa pesquisa feita no site de duas grandes imobiliárias durante o dia 21 de maio, não existia nenhum apartamento disponível com renda no máximo até aos 705 euros (valor do Salário Mínimo Nacional) no concelho de Lisboa, nem no concelho do Porto.

Sem acesso a estes programas, muitas pessoas optam por não sair de casa dos pais, ou têm de se sujeitar a condições que não idealizaram para viver.

Um T0 ilegal em Lisboa

A opção é procurada por pessoas nas mais variadas situações. Rita Santos (nome fictício), já se tentou candidatar ao programa Habitar Lisboa três vezes- sem sucesso. Aos 23 anos, trabalha na área de design de interiores e não tem contrato de arrendamento legal.

Neste momento estou a viver num estúdio em Lisboa sem recibo, e dava-me imenso jeito para o IRS”, desabafa. “Estou a conseguir pagar um estúdio T0”, descreve.

O arrendamento acessível seria uma opção viável para regularizar a sua situação. “Candidatei-me três vezes. O que eu queria mesmo é ter recibo, e neste momento não tenho”, explica Rita Santos. Mas não desiste: “Ainda tenho esperança, quando abrir mais vagas vou candidatar-me”.

Sem o programa? “Dificilmente posso pagar”

“Tenho 28 anos, vivo numa casa sobrelotada e quero emancipar-me”, suspira André Aquino, que vive em Lisboa e trabalha para uma grande empresa de tecnologia. É experiente, uma vez que já se candidatou seis vezes no programa de arrendamento acessível do Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU), programa do Estado central.

André conta que quer iniciar “uma vida nova, longe dos pais e da família”, e apesar de já ter vários anos no mercado de trabalho, não tem conseguido saltar do ninho e viver sozinho em Lisboa.

E se não houver programa? “Dificilmente tenho capacidade para pagar uma casa em Lisboa com os preços que estão a capacidade”, admite André Aquino, que até conseguiria “com muito esforço” pagar uma casa, mas teria de ser sempre fora do concelho de Lisboa. No centro de Lisboa “não seria possível”, lamenta.

Mesmo depois de seis tentativas frustradas de conseguir um arrendamento acessível “a esperança é a última a morrer”, ironiza este homem de 28 anos, que pretende continuar a tentar: “aquilo não custa nada, é só fazer uma candidatura e ir concorrendo várias vezes e esperar”.

“Tanta gente a um osso. É impossível”

Margarida Lee tem 24 anos, uma licenciatura e um mestrado. Mesmo a trabalhar e formada não consegue pagar uma renda: “É impossível pagar uma renda de 600 ou 700 euros, mesmo que seja a dividir por dois”.

Os preços praticados no mercado de habitação empurram-na para os programas onde as rendas estão controladas. Já se candidatou duas vezes ao programa da Câmara Municipal de Lisboa, mas não lhe saiu uma chave. “Não conseguindo uma casa através deste programa, vou ter de recorrer a familiares, mas para comprar uma casa. Neste momento arrendar não compensa. As rendas estão tão altas que mais vale pagar uma prestação ao banco”, afirma.

Apesar das tentativas frustradas, Margarida não perdeu a esperança, mas não deixa de assinalar o défice de casas nestes programas: “Só gostava que abrissem mais vezes e mais rapidamente, porque abrir um a cada seis meses é muito complicado”, critica.

Era tanta gente a um osso, é impossível”, descreve Margarida Lee recordando os resultados das últimas candidaturas, a última fechou nos últimos meses. Ainda não foi já que conseguiu sair de casa dos pais, mesmo trabalhando, mesmo com licenciatura, mesmo com mestrado.

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