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“Desafio de Lula é resistir às pressões do próprio PT”

01 jan, 2023 - 07:27 • Sérgio Costa

Inácio Lula da Silva toma posse como presidente da república do Brasil, mas o caminho estará longe de ser tão tranquilo como as duas anteriores presidências. O editor do jornal Estado de São Paulo, Itamar Montalvão, descreve os desafios da nova presidência, entre os quais as pressões do PT.

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Tensão, diálogo, pressão, coligação, economia. Serão apenas palavras isoladas, sem qualquer ligação, mas poderão ajudar a antecipar o terceiro mandato de Lula da Silva como presidente do Brasil. É Lula quem toma posse este domingo, mas a anunciada e previsível ausência de Jair Bolsonaro da cerimónia emite sinais claros para os próximos quatro anos.

Lula regressa a Brasília com uma certeza: praticamente metade do eleitorado não o escolheu para liderar o país, e o facto de não receber pessoalmente do seu antecessor a faixa presidencial simboliza o clima de extrema polarização política, e a forte rejeição de Lula entre mais de 50 milhões de eleitores brasileiros.

A ideia é expressa à Renascença por Itamar Montalvão, editor do jornal “Estado de São Paulo” sublinhando que a ausência de Bolsonaro da cerimónia era já “um desfecho previsível, porque o presidente cessante nunca demonstrou apreço pelos valores mínimos da democracia”. O analista afasta um cenário de incidentes graves na tomada de posse, até porque a segurança em Brasília foi reforçada. Interessante, diz, será perceber os grandes desafios da presidência Lula

Real partilha de poder é estratégia a seguir

Por forma a não adensar o clima de tensão política, Lula da Silva terá de assumir como estratégia central o diálogo, a partilha de poder. Itamar Montalvão sugere, contudo, que o sucesso da nova administração passa por interiorizar que a partilha de poder “não se limita à concessão de lugares, mas sim uma coligação real” com abertura ao diálogo sobre a agenda nacional.

A adoção de políticas mais centristas e até “mais liberais” que vão ao encontro do universo empresarial e de outros sectores da sociedade, poderá ser a chave para uma presidência de sucesso.

Contudo, nota o analista, o grande obstáculo poderá surgir internamente. Outro grande desafio de Lula é “ter capacidade de resistir às pressões do seu próprio partido”, e acrescenta que o PT cometerá um erro se acreditar que ganhou as eleições sozinho.

Itamar Montalvão sustenta que Lula estará consciente dessa necessidade, não só de contrariar o “obscurantismo de Bolsonaro”, mas também de resistir às pressões internas, e lembra que o próprio verbalizou essa ideia no discurso de vitória eleitoral.

No entanto, “resta saber se o presidente terá de facto essa capacidade de adotar políticas públicas que não contemplem interesse exclusivos do PT”, conclui.

Tentativa de destituição é sempre uma possibilidade

As pressões não serão o único obstáculo no caminho da nova presidência. Lula reassume o poder num momento económico desfavorável, e a anunciada decisão de retirar os apoios ao combustível, com consequente aumento de preços pode motivar “uma alteração de ânimo dos cidadãos em relação ao governo”, sobretudo entre os mais desfavorecidos.

Por agora será difícil prever como a oposição irá desenvolver a sua atividade, mas num quadro em que Lula não detém a maioria no Congresso, o presidente eleito poderá não escapar a uma tentativa de destituição se apostar apenas numa política iminentemente “petista”.

Outra consequência, para além da tentativa de “impeachment”, é ficar comprometida a vitória da ala política mais à esquerda em 2026. Mas será Lula a assumir uma nova candidatura? Itamar Montalvão considera que tudo é possível, que Lula tem um “enorme apetite político”, mas ressalva que daqui a quatro anos o presidente terá 81 anos e o desgaste, "até físico", será inevitável.

Por outro lado, o editor do Estado de São Paulo sublinha o facto inédito de a nova administração incluir no seu elenco quatro ex-candidatos presidenciais: Geraldo Alckmin, Fernando Haddad, Marina Silva e Simone Tebet. “Não há memória de algo assim”, exclama Itamar Montalvão concluindo que serão figuras que tentam desenhar o seu futuro com olhar fico em Brasília e que Lula também terá que lidar com isso.

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