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​Barómetro das Regiões. Pobreza e desigualdades aumentam na Europa

10 out, 2022 - 12:05 • Ana Carrilho

Documento está a ser divulgado no âmbito da Semana Europeia das Regiões e Cidades que decorre em Bruxelas até dia 13.

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A Política de Coesão tem ajudado a resolver alguns problemas, mas há desafios a que é preciso responder, como as desigualdades, a inflação galopante, as disparidades entre sexos ou o desemprego jovem. A pandemia e a guerra aumentaram os riscos de pobreza, que se deverá intensificar com a subida de preços de bens essenciais. São algumas das conclusões referidas no Barómetro sobre a Situação das Regiões e Cidades da União Europeia, apresentado na Semana Europeia das Regiões e Cidades, que decorre até dia 13 em Bruxelas.

O documento refere ainda que os eleitos locais consideram, por isso, que a Comissão Europeia tem de rever as políticas de coesão e adaptar o Quadro financeiro 2021-2027.

Guerra na Ucrânia intensificou a pobreza e desigualdades

Em 2019 cerca de 20% da população europeia – 91 milhões de pessoas – já estava em risco de pobreza e exclusão social. Há dois anos, 36 milhões de europeus não tinham condições para aquecer as suas casas no inverno ou arrefecê-las no verão, realçando assim também a pobreza energética. A pandemia e a guerra na Ucrânia intensificaram todos estes riscos, refere o Relatório sobre a Situação nas Regiões e Cidades da União Europeia.

O que na opinião de 77% dos eleitos locais que participaram no inquérito exige uma reflexão sobre as lições a aprender e as alterações a fazer na Política de Coesão. Defendem, por isso, que o Quadro comunitário 2021-2027 deve ser revisto e adequado às necessidades, nomeadamente, para resolver problemas gerado pela crise energética.

A longo prazo, mais de um terço dos inquiridos assume querer usar os fundos conseguidos para a sua região para combater o desemprego, criação de novos postos de trabalho, qualificar a mão-de-obra, assim como reduzir o desemprego jovem.

Outro dos grandes desafios deve ser o combate à pobreza infantil. Em 2020, quase 18 milhões de crianças na Europa estavam em risco de pobreza e quase nove em cada dez cidades europeias têm uma taxa de pobreza infantil superior à média do país. Por isso, as autoridades regionais e locais defendem a criação de uma Garantia Europeia para a Infância.

Guerra quebra PIB de vários países, Portugal incluído

O impacto da guerra da Rússia contra a Ucrânia fez-se sentir em toda a União Europeia, mas muito especialmente nos países de fronteira, desde a Finlândia, a Norte, até à Grécia, a Sul e ainda a Chéquia. Para os países do Mediterrâneo, incluindo Chipre, parte de Itália, Portugal, Espanha e a Alemanha, o impacto foi menor.

O Barómetro, cujo resumo já foi divulgado, refere também que os países que estão mais perto da Ucrânia vão ter uma forte quebra no PIB este ano. O mesmo acontece por causa da subida da inflação que além destes países, atinge fortemente Portugal e Espanha.

Desde 24 de fevereiro e até ao fim de junho mais de 10 milhões de refugiados da Ucrânia atravessaram as fronteiras para a União Europeia. Quase metade (4,3 milhões) escolheu a Polónia como destino. Seguiram-se a Hungria (861.000), Roménia (736.000), Eslováquia (548.000) e a Chéquia (383.000).

A capital polaca, Varsóvia, acolheu cerca de 10% dos refugiados que chegaram ao país. Desde o início da guerra, a população de Varsóvia aumentou 15%.

As entidades locais e regionais foram as primeiras a acolher refugiados e foi o que aconteceu com as cidades e regiões de três quartos dos responsáveis locais e regionais que responderam ao inquérito do Comité das Regiões. Metade enviou ajuda para a Ucrânia; 53%, referiram o envolvimento ativo no apoio aos refugiados e às organizações da sociedade; 57% manifestou apoio à causa ucraniana.

Os fundos europeus ajudaram muitos destes esforços de solidariedade com os ucranianos. Em 8% dos casos foram mesmo a única fonte de financiamento; em 21%, foram usados conjuntamente com outros apoios.

Entretanto, o Comité Europeu das Regiões lançou a Aliança Europeia de Cidades e Regiões para a Reconstrução da Ucrânia. E metade dos inquiridos considera que a forma mais efetiva de reconstruir o país passa pelo envolvimento das cidades e regiões nessa reconstrução.

Pouco envolvimento das regiões nos planos de recuperação pode pôr em causa coesão territorial

A pandemia de Covid-19 teve mais impacto numas regiões que outras, atingindo fortemente o sul da Europa. Os países que reagiram melhor foram os bálticos, a Holanda, Irlanda, Roménia e algumas regiões da Bulgária.

O Plano de Recuperação e Resiliência foi aprovado para ajudar os países mais afetados, em que se inclui Portugal. No entanto, o Comité das Regiões chama a atenção para o facto das cidades e regiões terem estado muito pouco ou nada envolvidas na preparação dos planos nacionais. O que pode contribuir para aprofundar ainda mais as desigualdades na União Europeia, pondo em causa a coesão económica, social e territorial. É que a abordagem centralizadora pode não responder às necessidades efetivas no terreno.

O Comité das Regiões manifesta preocupação com os resultados: só 1% dos eleitos locais e regionais afirmou ter estado completamente envolvido na construção do Programa de Recuperação e Resiliência do seu país. 9% estiveram parcialmente envolvidos. Mais de 40% não estiveram envolvidos, mas foram informados.

No entanto, a maior fatia (45%) é dos que não estiveram envolvidos nem foram informados pelos respetivos governos. A situação é diversa na União Europeia: oscila entre os 12% em Itália e os 77% na Dinamarca.

No caso português, só 11% dos eleitos regionais e locais revelaram ter estado parcialmente envolvidos na construção do Programa; 58% foram apenas informados e os restantes dizem não ter sido envolvidos nem informados.

A grande maioria dos inquiridos mostra-se preocupada com os riscos de não se atingirem as metas e objetivos definidos nos Planos, assim como de os fundos não serem bem distribuídos ou haver falta de coordenação com outros fundos. O que contribuirá para o aumento das disparidades entre regiões e cidades.

Ainda assim, os inquiridos concordam que a política de coesão está a fazer a diferença para muitas regiões na recuperação depois da pandemia.

Uma das áreas mais afetadas foi a da saúde. Os doentes com doenças não Covid, como cancro, foram seriamente atingidos. Por outro lado, a pandemia fez grandes estragos na saúde mental dos europeus e essa é uma área em que o Comité das Regiões sublinha que é preciso dar resposta a todos os níveis.

Cidades e regiões em alerta com as alterações climáticas

Sem uma atuação rápida e eficaz para abrandar o impacto das alterações climáticas, as cidades e regiões da União Europeia podem sofrer muito com catástrofes como inundações, grandes incêndios e temperaturas extremas. 170 mil milhões de euros é, atualmente, o impacto económico anual desses eventos. Mas a situação tende a piorar, especialmente para as regiões costeiras e expostas a temperaturas mais altas.

Segundo as previsões da Comissão Europeia, o impacto económico das inundações é hoje de 8,5 mil milhões por ano, mas pode aumentar para o dobro se as temperaturas subirem 2ºC ou atingir os 40 mil milhões de euros, se a subida for de 3ºC. Escandinávia, Alemanha, Polónia, Irlanda e norte de Itália serão as mais atingidas.

Toda a Europa vai sofrer o impacto do aumento da temperatura, mas o sul da Europa e especialmente algumas regiões da Itália, Espanha e Grécia estão mais expostas a secas extremas e grandes incêndios. Estima-se que anualmente possam ter 30-40 dias de temperaturas extremamente altas.

Segundo o Barómetro, as regiões e cidades da União Europeia estão empenhadas em combater a crise climática: já são responsáveis por 70% das medidas e 90% das ações de adaptação climática adotadas.

Mais de metade dos participantes sublinhou que os objectivos-chave do desenvolvimento das suas regiões passam pelo uso dos fundos europeus para apoiar a transição verde da economia.

Política de Coesão deve ser o pilar para a transição digital e verde

Os dez países que entraram na União em 2004 viram o PIB per capita subir de 59% da média europeia para 77%.

Mas há diferenças e algumas regiões menos desenvolvidas, cresceram enquanto outras de rendimento médio e menor desenvolvimento foram apanhadas por uma espécie de armadilha do desenvolvimento que as fez estagnar e cair.

Estudos do CoR (Comité das Regiões) referem que entre 2009 e 2020, 109 regiões aumentaram o seu PIB per capita. Em contrapartida, noutras 129, baixou. Para 2023, as previsões apontam para um aumento de 2,6% no PIB per capita nas regiões menos desenvolvidas, graças ao apoio dos fundos comunitários do Quadro 2014-2020.

Uma das áreas que ainda está a estrangular o o desenvolvimento é a da tecnologia digital. E em muitas regiões, a pandemia contribuiu para agravar as desigualdades nesta área.

Há uma divisão clara entre os meios rural-urbano na maioria dos países da União Europeia; entre pessoas que nunca tiveram acesso à internet e as que a usam regularmente; uma grande disparidade entre o norte e o sul da Europa, em relação às competências.

Mesmo assim, a pandemia trouxe algo de positivo: com o confinamento, milhões de pessoas passaram para o regime de teletrabalho. Segundo o Barómetro da situação nas Regiões e Cidades, o uso diário de internet aumentou mais de 10% em países como a Roménia, Eslovénia, em várias zonas da Grécia, mas também em Espanha e Portugal.

Os eleitos locais não têm dúvidas que os fundos de coesão acrescentam valor sua região, quando comparados com outros fundos. E sublinham que eles devem ser aplicados onde são mais necessários. 88% dos participantes no inquérito consideram que a Coesão deve ser um dos valores-chave da União Europeia.

Por outro lado, a quase totalidade frisa que as regiões e as cidades devem ter maior influência no futuro da União Europeia.

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