Cheira a incêndios e a lama na freguesia de Sameiro, no concelho de Manteigas, que tem pouco mais de 300 habitantes. As primeiras chuvas de setembro trazem recordações pesadas à população que teve o fogo à porta ainda há um mês.

O negro mantem-se agora, feito de lama. Maria Alcina, de 66 anos, e Maria da Conceição, de 62 anos, acordaram para outro susto. “A piscina, o campo, trouxe os carros para baixo, foi tudo rio abaixo, a água rebentou com muros, grades”, descreve Maria Alcina, 66 anos, que acordou por volta das 03h00 da manhã com o ruído das pedras a rolarem encosta abaixo.

“Depois, às 04h30 da manhã, era tanta água e tanto barulho que metia medo. Há um mês, tivemos os incêndios... ainda não tínhamos recuperado e vem isto. Parecia o fim do mundo”, conclui Maria da Conceição, 62 anos, residente na freguesia de Sameiro.

“De noite tudo escuro, sem luz, vi os bombeiros, a lama era tanta, que eles metiam os pés e enterravam-se logo. A próxima há de acontecer deste lado, ando cheia de medo”, admite Maria Alcina, recordando os prejuízos dos incêndios.

“Para mim foi um milagre termos sobrevivido, mas ficámos sem nada, ardeu tudo, oliveiras, tínhamos azeite para todos e não temos nada. Tínhamos matas para mim, para as minhas filhas e netas e não temos nada”, lamenta, revelando que já foi contactada pelo município para o levantamento dos prejuízos que não consegue quantificar em euros.

Trabalhos de prevenção no terreno

Miguel Sabugueiro, 42 anos, ajuda a irmã a limpar a casa, que foi surpreendida pelas terras e detritos das áreas ardidas a entrarem cozinha adentro.

“A água veio com muita força e mais alguma, trouxe tudo à frente. Um bocado moroso isto, a lama agarra-se e vai ser muito difícil limpar, entrou pela casa adentro, na cozinha que fica na parte de baixo”, mostra o morador.

Um rasto de destruição que António Alves, comandante dos Bombeiros Voluntários de Loriga e Comandante das Operações de Socorro deste teatro de operações, não quer ver repetido.

“Temos 150 homens, 30 viaturas, o apoio de bombeiros, alguns homens do ICNF, populares e apoio da Câmara Municipal de Manteigas. Estamos a remover todo o entulho da linha de água, estamos a planear remover a montante, para que não haja derrocadas novamente para este local, e vamos trabalhar toda a noite, até de manhã, porque está prevista chuva para amanhã. Há um trabalho de prevenção que já está a ser feito pelo ICNF a montante para consolidar alguns terrenos, para que não volte a acontecer”, anuncia o responsável, salientando que “três veículos estão a ser retirados, e mais duas viaturas que estavam aqui à frente”, conta à Renascença.

“É natural isto vir acontecer. É derivado dos incêndios. Estamos a falar de zonas muito inclinadas de muito declive, onde a queima de combustível nas encostas, levou a esta situação”, acrescenta António Alves, sublinhando que “a câmara municipal de Manteigas fará certamente a seu tempo, o levantamento dos prejuízos”.

O que é já certo que não vai acontecer, pelo menos nos moldes de festividade, é a festa em honra de Santa Eufémia. “Ao domingo tínhamos uma festa já não vamos ter. Fazíamos os bailes aqui, tínhamos uma piscina grande, tudo relvado, ficou tudo destruído. Já não há festa, só a missa e mais nada, já ninguém tem vontade de festas”, diz comovida Maria Alcina.

“Vê-se no Facebook e não é nada do que se vê aqui, é muito pior”, admite Maria da Conceição.