08 nov, 2017 - 15:46 • Aura Miguel , Filipe d'Avillez
O cardeal Raymond Burke acredita que Portugal tem uma missão especial a desempenhar no mundo e que a devoção à Eucaristia está no centro da mensagem de Fátima.
Em entrevista exclusiva à Renascença, à margem da apresentação da edição do seu livro “O Amor Divino Incarnado – A Sagrada Eucaristia como Sacramento da Caridade”, escrito originalmente em 2012, o cardeal recordou a centralidade da Eucaristia para os pastorinhos de Fátima.
“Logo nas aparições preparatórias foi central a aparição do anjo com o cálice e a hóstia suspensos no ar, em que ele deu a comungar o Santíssimo Sacramento às crianças. Depois as próprias aparições em que Nossa Senhora enfatiza a misericórida que nos chama à oração e à penitência para estarmos na disposição correcta para receber Nosso Senhor na Sagrada Eucaristia e em reparação para as muitas formas com que Nosso Senhor é ofendido, especialmente no Santíssimo Sacramento”.
Para o cardeal, esta é a razão pela qual Nossa Senhora disse que Portugal jamais perderia a fé. “Acredito firmemente nisso, e tenho a forte sensação que Portugal tem uma missão importante para o mundo inteiro. Fui visitar o carmelo de Coimbra e a madre superiora disse-me que a irmã Lúcia recebia milhares e milhares de cartas, de todo o mundo. Tinha um mapa onde ia assinalando, para ver onde estava a chegar a mensagem de Nossa Senhora”.
A Eucaristia é o tema central do livro do cardeal Raymond Burke, que ao longo dos últimos anos tem-se tornado uma figura de referência para a ala litúrgica e teologicamente mais tradicionalista da Igreja Católica. O cardeal é um dos quatro cardeais – dois dos quais já morreram – que dirigiram ao Papa Francisco uma série de perguntas, conhecidas como “dubia” sobre o Amoris Laetitia e tem sido um grande crítico da ideia de que possa haver uma abertura para permitir o acesso à comunhão por parte de algumas pessoas que vivem em situação irregular, como por exemplo pessoas divorciadas e casadas segunda vez pelo civil. Contudo, o Cardeal não quis falar sobre estes assuntos na entrevista.
Crise de liturgia
Burke veio a Portugal integrado na peregrinação a Fátima de um instituto tradicionalista, mas em plena comunhão com Roma, e celebrou várias missas na forma extraordinária do rito romano, mais conhecido como Rito Tridentino. As fotografias dessas celebrações – incluindo algumas em que o cardeal aparece com a “Capa Magna”, uma capa encarnada de 15 metros de comprimento que era utilizada por cardeais mas que caiu largamente em desuso desde o Concílio Vaticano II – foram motivo de alguma discussão e polémica nas redes sociais.
Mas o cardeal diz que a estranheza deve-se à falta de conhecimento. “Quando não conhecemos alguma coisa, pode parecer-nos estranha, por isso precisamos de ajudar todos os católicos a compreender a natureza da Sagrada Liturgia em si, enquanto acção de Cristo no meio de nós, e ajudá-los a ver a grande beleza da forma como a missa tem sido celebrada ao longo dos séculos.”
“Acho interessante que haja tantos jovens, incluindo jovens famílias com muitos filhos, mas também estudantes universitários, que se sentem tão atraídos à forma extraordinária da missa. Penso que isso se deve ao facto de verem que há algo muito profundo, que quere conhecer e compreender melhor”, diz.
A culpa, diz, é em parte da reforma litúrgica levada a cabo depois do Concílio Vaticano II, que despiu a liturgia de alguns dos seus ritos mais complexos. “Desenvolveu-se uma ideia de que de a Santa Missa e outros ritos litúrgicos eram actividades humanas, as pessoas começaram a fazer experiências e a fazer coisas que distanciaram os ritos contemporâneos daqueles que existiam na Igreja há séculos”.
O que fazer? “O que devemos fazer, e é esse o propósito do livro, é estudar de novo o grande dom da Santa Eucaristia como nos chegou ao longo dos séculos através da Igreja. A doutrina, mas também a beleza da Sagrada Liturgia. Bento XVI tinha noção da importância de se poder celebrar livremente tanto a forma extraordinária como a ordinária, para que as pessoas pudessem ver a continuidade entre uma e outra e para que houvesse um enriquecimento mútuo, como ele disse, para que a forma ordinária fosse celebrada com um sentido mais profundo da divina realidade que está presente, do encontro entre o Céu e a terra, como ele a chamava.”
O livro “O Amor Incarnado” é editado pela Caminhos Romanos.