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Sínodo: Lisboa começa hoje a sonhar chegar a todos

30 nov, 2016 - 06:29 • Filipe d'Avillez

É o primeiro sínodo do género desde 1640 e foram muitos os leigos que participaram no processo. Mas são poucos os que agora estão representados na assembleia sinodal, dizem António Marujo e o padre Alexandre Palma.

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Começa esta quarta-feira a Assembleia do Sínodo de Lisboa, que vai decorrer até domingo no Centro Diocesano de Espiritualidade Imaculado Coração de Maria, no Turcifal, a 30 quilómetros da capital.

Trata-se do momento final de um processo que começou há cerca de dois anos e que vai culminar com a publicação de um documento que servirá de orientação para cumprir o lema dado a este sínodo: "O sonho missionário de chegar a todos".

Mas o padre Alexandre Palma, que participa como delegado e esteve envolvido na redacção do documento de trabalho, alerta que é preciso mais para que no final tudo não se resuma a um texto.

“Não tenhamos ilusões nem expectativas deslocadas. A dita conversão missionária, a conversão pastoral, esse dito sonho de chegar a todos, não é tarefa que esteja ao alcance de um documento. Portanto, não será um documento que vai ser a resposta a este desafio. Pode ser um instrumento, um catalisador, mas a assunção deste desafio está muito para lá do que este documento ou qualquer outro documento possa alcançar.”

“Tem de ser uma tomada de consciência eclesial, como povo de Deus, como comunidade, como comunhão; tem de partir do encontro com o Evangelho de Jesus, ao mesmo tempo com uma grande disponibilidade para o encontro, para com o diálogo, para com o convívio, no sentido radical de viver com”, afirma o padre Alexandre.

“Tantos e tantas que no espaço desta diocese vivem connosco, uns crentes, outros não crentes, outros à procura, uns questionando-se. Isto vem de algo que está muito a montante e muito para lá do que um documento pode ser”, sublinha.

Já o jornalista e católico António Marujo, que esteve profundamente envolvido no processo sinodal através da iniciativa leiga “Escutar a Cidade”, diz que, para encarar o futuro, a Igreja de Lisboa deve inspirar-se na parábola da ovelha perdida, mas com uma diferença: “Quando Jesus conta a parábola da ovelha perdida ele fala do pastor que deixa as 99 ovelhas que estão no redil para ir encontrar a ovelha que se perdeu. Ora, hoje, a lógica e a realidade mostram que é exactamente o contrário que se passa. Ou seja, há 5, 10 ou 20 ovelhas que estão no redil e o grosso está fora do redil, fora do circuito da Igreja.”

“A pergunta inicial é, portanto, o que se faz para ir buscar estas pessoas que se perderam, ou que quiseram perder-se, ou que se desencontraram dos nossos caminhos ou preferiram outros caminhos”, diz António Marujo.

Mais do que “ir buscar essa gente, ir chamar”, acrescenta, é “o que se faz para ir ao encontro dessas pessoas”.

Ao longo dos últimos dois anos, vários grupos e indivíduos fizeram chegar ao Patriarcado as suas reflexões e propostas. Há ideias novas e há também casos concretos que já funcionam bem e que podem servir de inspiração para o futuro, refere o padre Alexandre, que sublinha a experiência nas universidades, onde crescem os núcleos de estudantes católicos e as missões universitárias ganham cada vez mais participantes.

António Marujo aponta o exemplo de Loures e de Óbidos, “que têm uma pastoral planificada, pensada com o objectivo de chegar ao maior número possível de pessoas”.

Ali, programam-se acções para chegar a quem “normalmente não vai à Igreja, pessoas que estão menos disponíveis para escutar a proposta do Evangelho – que no fundo é a proposta que a Igreja transporta e que deve anunciar”.

Leigos sub-representados

Desde o início do processo que houve um grande incentivo à participação dos leigos, que responderam em bom número. Mas a assembleia sinodal propriamente dita terá apenas uma pequena minoria de leigos, sendo o grosso composto por clero.

É algo que o padre Alexandre aponta como um desafio, embora prefira realçar o facto de não se realizar um sínodo destes em Lisboa desde o século XVII. António Marujo mantém-se optimista, mas reconhece o perigo de a assembleia se transformar num encontro de clero alargado, com convidados.

“Tenho pena que isso aconteça, porque 50 anos depois do Concílio Vaticano II vivemos tempos na Igreja em que o papel dos leigos deve ser mais reconhecido, mesmo em termos de participação canónica neste tipo de assembleias.”

O jornalista manifesta ainda a esperança de que importantes temas, que são apenas aflorados no documento de trabalho, encontrem maior expressão no texto final e dá como como exemplo as questões ambientais e a crise da democracia.

Cinco dias de reflexão e discussão

A Assembleia do Sínodo de Lisboa vai ter 137 participantes e ocorre no âmbito das celebrações do tricentenário da criação do Patriarcado de Lisboa.

Este sínodo foi anunciado pelo Cardeal Patriarca D. Manuel Clemente em Janeiro de 2014, com o objectivo de concretizar as "orientações do papa Francisco" – designadamente o reforço pela opção missionária e a reforma das estruturas, segundo o comunicado do Conselho Presbiteral da diocese lisbonense.

Durante os cinco dias, vai ser analisado o documento de trabalho "O sonho missionário de chegar a todos", título retirado da Exortação Apostólica "Evangelii Gaudium" ("Alegria no Evangelho"), do Papa Francisco.

Os trabalhos organizam-se, segundo nota do Patriarcado, em três temas principais: "Escutar o mundo e olhar a Igreja", "Discernir sobre os critérios evangélicos para acção eclesial" e "Lançar desafios para uma conversão pastoral e missionária no Patriarcado de Lisboa".

Vão ainda realizar-se "momentos de oração, reflexão, discussão e intervenções", segundo a mesma nota.

Terminada a Assembleia Sinodal, "o Cardeal Patriarca de Lisboa vai elaborar um documento que apresentará as linhas orientadoras para a acção pastoral da Igreja de Lisboa para os próximos anos".

A apresentação oficial deste documento, que marcará o encerramento do Sínodo Diocesano, realiza-se no dia 8 de Dezembro, às 15h30, durante a celebração solenidade da Imaculada Conceição, no Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa.

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