Opinião

Primárias abertas, sim. Congresso, já!

06 abr, 2014 • João Tiago Silveira, dirigente do PS, apoiante de António Costa

As primárias são um passo positivo. Mas a situação no PS exige uma definição urgente da liderança. Aconselha que se sigam processos já oleados e não um caminho por trilhar.

Primárias abertas, sim. Congresso, já!

As últimas eleições revelaram o que já se sabia. As pessoas estão descontentes com partidos e políticos e o PS não pode continuar a evitar o tema.

O fenómeno não é novo e já foram sugeridas medidas. No último congresso, cerca de 50 militantes e simpatizantes apresentaram propostas para abrir o PS à sociedade como a apresentação de petições ao congresso por cidadãos, as medidas do programa eleitoral passarem a ser calendarizadas e quantificadas e a adoção de um processo participativo de apresentação de medidas para o programa do PS. Além disso, propunha-se a atribuição do direito de voto a simpatizantes nas eleições para secretário-geral (SG) do PS. Estava em causa iniciar um processo que teria permitido discutir, aprovar e executar medidas sem a pressão dos acontecimentos.

Infelizmente, esta iniciativa não foi sequer apreciada pelo congresso por se ter entendido que não era o momento para o fazer.

A direção do PS passou agora a defender a realização de eleições abertas à sociedade, quando antes rejeitou o seu debate. São boas notícias, que, aliadas à capacidade agregadora e mobilizadora de António Costa, permitirão acentuar a ligação do PS à sociedade.

Porém, este não é um processo que possa ser adotado de qualquer forma e a todo o custo.

Por um lado, as eleições abertas à sociedade através do voto de simpatizantes fazem sentido para a eleição do SG, e não apenas para escolher o candidato a primeiro-ministro (PM).

Admitir eleições primárias apenas para o candidato a PM do PS supõe que este e o SG poderiam ser duas pessoas diferentes, continuando este último a ser eleito apenas por militantes. Ora, lideranças bicéfalas nunca deram bom resultado. Um PM sem uma ligação forte ao partido e ao grupo parlamentar é certamente mais fraco e o seu Governo menos estável. Por essa razão, as eleições abertas a simpatizantes devem servir para escolher o SG do PS que é, por regra, o candidato a PM.

Por outro lado, este novo processo eleitoral deve ser transparente e oferecer garantias de isenção à prova de críticas que minem a sua legitimidade. Tal como se sugeriu na proposta apresentada ao congresso de 2013, esta é uma iniciativa que deve ser pensada, debatida e cuidadosamente definida. Deve ser adotada por convicção e não ao saber dos acontecimentos.

Permitir o voto de simpatizantes sem a preparação adequada, com uma disputa eleitoral já à vista e candidatos na linha de partida, pode significar o seu posterior abandono em resultado de uma experiência mal preparada e pouco refletida.

Finalmente, alargar o direito de voto aos simpatizantes é uma decisão que respeita a aspetos fundamentais do funcionamento do PS. Não se compreende como possa ser tomada sem que o órgão máximo do partido – o congresso – se pronuncie.

As primárias abertas aos simpatizantes são um passo positivo. Mas a situação no PS exige uma definição urgente da sua liderança. Aconselha, por isso, que se sigam processos já instituídos e oleados e não um caminho que está por trilhar. Para isso, é necessário proceder à eleição do SG entre militantes através de diretas e realizar já um congresso, que aprove o voto de simpatizantes para futuras escolhas.

João Tiago Silveira, dirigente nacional do PS, docente universitário, apoiante de António Costa. Escreve de acordo com o novo acordo ortográfico

Leia também a opinião de Álvaro Beleza, também apoiante de eleições directas, mas defensor da continuidade de António José Seguro