"Já não podíamos viver onde queríamos, agora a minha mãe nem pode morrer onde quer"

A aflição de ver as imagens de destruição de uma terra que é a deles, sem sequer conseguirem falar com os que mais amam, é muito difícil de gerir. Os dias são passados na expetativa de que alguém do outro lado atenda o telefone. Há dias em que os palestinianos que vivem em Portugal nem sequer conseguem falar com a família na Faixa de Gaza. Nader e Alshaaarawi: o retrato de dois homens que sabem o que é perder.

29 nov, 2023 - 06:30 • João Carlos Malta , Miguel Marques Ribeiro , Maria Costa Lopes (vídeos e imagem)



A mãe de Nader não quer sair de Gaza. "Quer poder escolher onde morrer"

Há muitos dias que é assim e não parece que vá mudar. As comunicações são cada vez mais intermitentes. Já o coração fica mais acelerado de todas as vezes em que o telefone chama e do outro lado ninguém responde. Nader está em Lisboa há quase dez anos, mas a mãe, um dos irmãos, a cunhada e os sobrinhos permanecem na Faixa de Gaza. “Há dez dias que não consigo falar com a minha mãe”, conta à Renascença Nader Alhabbash.

“Tento a toda a hora [ligar]. Nas pausas do trabalho, no almoço e ao fim do dia. Sinto-me mal com esta situação, nem com a minha mãe [tem 70 anos] consigo falar. Estou muito preocupado com ela…”, revela Nadder, de 40 anos, que à medida que tenta completar a frase vai ficando sem fôlego e sem palavras até quase soluçar.


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"Tento a toda a hora [ligar]. Nas pausas do trabalho, no almoço e ao fim do dia. Sinto-me mal com esta situação, nem com a minha mãe [tem 70 anos] consigo falar", Nader Alhabbash.

Não demorou muitos dias, depois do ataque do Hamas de 7 de outubro que espoletou a ofensiva israelita, a que cada comunicação com a família se tornasse uma missão cada vez mais impossível. No início de novembro, foi anunciado um corte total da rede de telefones e de internet em Gaza.

“Temos um grupo de WhatsApp, mas agora só de quatro em quatro dias o meu irmão escreve: ‘Estamos vivos. Estamos bem’”. E é tudo. Ouvir as vozes dos que mais ama tornou-se um bem raro, quase inexistente. A incerteza passou a ser a única certeza.


Estar a mais de seis mil quilómetros da família, num território em que os bombardeamentos são constantes e em que o número de mortes não para de crescer, já não seria fácil. Mas sem qualquer contacto tudo se torna mais difícil de gerir. É o que também sente Alshaaarawi Salem de 39 anos. Está há nove anos em Portugal.

É pós-doutorando e investigador em Optometria e Ciência da Visão na Universidade do Minho e tem em Gaza 150 familiares. Perante a surpresa em relação ao número, responde: “As nossas famílias são muito grandes”.

Mas estão a ficar mais pequenas. “Já morreram 22 pessoas da minha família. Feridas estão muitas mais”, conta. Alshaaarawi tem os pés em Braga, mas a cabeça em Gaza. “Imagina, estou sempre a tentar ligar. Chego a fazê-lo 100 vezes por dia”, descreve.

Neste momento, a ONU aponta para que o conflito entre Israel e o Hamas já tenha feito quase 15 mil mortos (estima-se que cinco mil sejam crianças) e mais de 36 mil feridos. Contudo, a partir de 11 de novembro com o corte de comunicações dos hospitais do norte da Faixa de Gaza, a atualização dos números não é feita diariamente e, por isso, o valor real será manifestamente maior.


Além disso, sem eletricidade, sem combustíveis, sem comida, e com grande parte dos hospitais destruídos aquela região assiste a uma das situações humanitárias mais catastróficas de que há memória.

Às vezes, Alshaaarawi lá consegue falar com um dos irmãos ou a irmã. Com os pais é muito mais difícil. O telemóvel deles ficou nos escombros da casa de família, quando esta foi destruída pelos bombardeamentos israelitas.

“Não há eletricidade. É preciso andar muito para carregar o telemóvel. A cada quatro dias lá sei que estão bem”, explica, numa situação semelhante à que Nader vive.

“Tenho muito medo, a situação é muito difícil”, lamenta o palestiniano a viver em Braga. Neste momento, os pais estão em Alzwaida com uma irmã de Salem. O resto da família vive mais a sul na faixa mais densamente habitada do mundo. Mas há vários familiares que ele não sabe onde estão atualmente, porque não os consegue contactar e lhes perdeu o rasto.


"Tenho muito medo". Alshaaarawi Salem tem os pais e irmãos em Gaza

Voltemos a Nader que está em Lisboa a trabalhar como especialista em marketing, estabelecendo a ponte entre os países do ocidente e os países árabes na compra e venda de tecnologia.

Expressa-se num português bastante razoável que mistura com algumas frases em inglês. Ao falar de Gaza os olhos inflamam-se e a expressão corporal fica tensa. De repente, recorda que ao logo ao primeiro dia de guerra, uma das certezas que tinha ruiu.

Casas arrasadas

Nos conflitos dos últimos anos, a zona leste da cidade de Gaza, onde a família vive e ele passou grande parte da vida, sempre saiu ilesa. Por não estar colada à fronteira com Israel, era poupada. Desta vez, não foi isso que aconteceu, os bombardeamentos perto do bairro em que residem a mãe e o irmão foram sempre aumentando de intensidade.

O perigo começou a rondar, até que um míssil estilhaçou os vidros dos quartos do apartamento da mãe e destrui o carro do irmão. Há de, pouco depois, mostrar as fotografias que o comprovam. Dias depois, a mãe de Nader e a família do irmão deste palestiniano tiveram de abandonar os dois apartamentos do mesmo prédio em que viviam. Ao contrário de muitos, não foram para campos de refugiados.

Seguiram para Khan Yunnis, no sul da Faixa de Gaza, a 25 quilómetros do local em que residiam, onde a família da mulher do irmão tinha uma casa disponível.


Imagem: Rodrigo Machado/RR
Imagem: Rodrigo Machado/RR

A mãe de Nader está revoltada e ele sente-lhe cada uma das dores. Os palestinianos, por razões históricas, sentem que cada vez que saem de um sítio, podem não conseguir regressar. “Já não podíamos viver onde queríamos, é injusto, mas somos palestinianos. Agora a minha mãe nem sequer pode morrer onde quer”, atira.

A mulher de 70 anos não quer sair de Gaza, apesar da insistência do filho para que possa encontrar paz e segurança perto dele.

Em relação à forma como os familiares lutam pela sobrevivência, Nader relata uma realidade que parece absurda. “Quando perguntei ao meu irmão se precisava de ajuda, de dinheiro, ele disse que dinheiro não falta e mandou fotografias a mostrar. Mas não há nada para comprar. Nem sequer há farinha para comprar”, especifica.

Já não consegue ver notícias

Puxa mais uma vez do telemóvel para mostrar como as refeições em Gaza são agora preparadas tendo de fazer fogo, porque não há eletricidade nem combustível, e as pessoas estão a comer raízes, ervas condimentadas com azeite (em que aquela terra é abundante).


"Parei de ver notícias". Nader não quer ver o "povo a morrer"

Nader diz já não aguentar estar sempre ligado às informações que chegam sobre o conflito em Gaza. É difícil assistir à destruição de tudo o que lhe é familiar. Cada bomba rebenta-lhe mais um pedaço de passado. Mas mais do que edifícios são as pessoas que são irrecuperáveis.

“Nos primeiros dias via as notícias todas, mas Gaza é muito pequena e todos se conhecem uns aos outros. Estou a ver escolas, tudo o que eu conheço, e mais importante do que todas as coisas que podemos construir outra vez são as pessoas que estão a morrer. O meu vizinho, o meu amigo, o irmão do meu amigo”, enumera.

As imagens que chegam pelo telefone ou pela televisão terraplanam o imaginário do local em que viveu a infância e boa parte da idade adulta.

“É uma tristeza para mim, não consigo ir a Gaza há dez anos, depois de 2014, e se um dia for as minhas memórias estão todas destruídas. A universidade em que estudei, as escolas, as casas de amigos, não há nada”, lamenta.


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"É uma tristeza para mim, não consigo ir a Gaza há dez anos, depois de 2014, e se um dia for as minhas memórias estão todas destruídas", Nader Alhabbash.

Alshaaarawi Salem, em Braga, tem a mesma sensação de impotência quando olha para fotografias de Gaza. Mas à cabeça sobe-lhe sempre o mesmo pensamento: “Israel é um Estado terrorista”. Assegura que a ideia de que Telavive está apenas a aniquilar o Hamas é falsa. “Matam mulheres, matam idosos, matam crianças”, enumera.

E não esconde a fúria. “Israel já destruiu tudo, as ruas, os edifícios, as casas, tudo”. Segundo a ONU, desde que a ofensiva em Gaza começou os raides israelitas já terão destruído 50% das casas de Gaza.

E os idosos?

Ao contrário de Nader, a família de Alshaaarawi vive mesmo perto da fronteira norte de Gaza, em Beit Lahia e Beit Hanoun. Diz que nesses locais, até há pouco tempo, só havia uma casa de pé.

As pessoas não têm sequer como se deslocar. “Israel não permite o uso de carro. Não permite o uso de nada. Só andar, só andar, andar”, garante.


 Imagem: Rodrigo Machado/RR
Imagem: Rodrigo Machado/RR

A maior preocupação deste médico nem é com os irmãos, ainda novos, é com os pais. Ambos são idosos, estão doentes e são portadores de deficiência. “Eles não podem andar muito”, sinaliza.

Apesar de todo o horror e sofrimento atual, tanto Nader com Alshaaarawi esforçam-se por manter viva a ideia de uma Gaza em que, apesar do cerco que dura há décadas, nada faltava.

Nader estabelece até muitos pontos de comparação entre o território e Portugal, sobretudo na forma como a agricultura também marca as paisagens com algumas árvores bem conhecidas dos portugueses, como as oliveiras, as figueiras e as vinhas.

Preocupa-se em repetir várias vezes a mesma ideia. Gaza não é pobre, mas é roubada por Israel. “Não somos pobres, estamos fechados há 20 anos, mas mesmo assim conseguimos ter uma muito boa qualidade de vida”.


E descreve a normalidade que para quem nunca lá esteve, é difícil de imaginar. “Vamos para a escola, temos universidade, saímos a noite, vamos à praia, fazemos piqueniques, fazemos tudo e temos tudo”, resume.

O médico de Braga lamenta que nos media não mostrem o que havia de bonito em Gaza. “A minha mensagem é que quando Israel sair da Palestina, nós temos uma base [para a paz]”, sublinha em jeito de balão de ar de esperança.

“Nós, na Palestina, não somos terroristas. Nós na Palestina temos médicos, temos engenheiros, temos professores, temos cientistas, temos muita coisa”, acrescenta Alshaaarawi.


Nader Alhabbash tem 40 anos e está há quase uma década em Portugal. Foto: Maria Costa Lopes/RR
Nader Alhabbash tem 40 anos e está há quase uma década em Portugal. Foto: Maria Costa Lopes/RR

Numa casa de Agualva, em Sintra, Ana Canha, a ex-mulher de Nader, está sentada mesmo ao lado com o filho Afonso. A criança, de seis anos, é o resultado do amor entre os dois que começou na Malásia quando ela trabalhava para uma multinacional têxtil e ele estudava Ciência Política.

Casaram na embaixada da Palestina e ela engravidou anos depois. Decidiram que Portugal, dadas as circunstâncias, era o melhor destino para começar uma família e Nader logo se apaixonou pelo país. Era o local ideal para criarem o filho. Hoje, já separados, mantêm uma relação familiar forte.

Regressar a 2014 para chegar a 2023

Ana diz que se recorda de a 7 de outubro ter dito de imediato: “Israel vai arrasar com Gaza. Vão atacar forte e feio e não vão deixar cair no vazio. Tinham uma boa oportunidade para fazer aquilo que querem fazer há muito tempo.”


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"Israel diz que vai destruir a resistência, mas não faz nada para isso. Estão a matar idosos, a matar crianças, a matar mulheres", Alshaaarawi Salem.

Há anos que aquela mulher ouve as histórias que Nader conta de uma guerra que não parece ter fim. Um dos episódios mais vividos na memória daquele palestiniano é o do conflito de 2014, que durou sete semanas.

O motivo para esse embate entre Israel e a Palestina foi o da morte de três adolescentes israelitas, que levou à prisão de quase todos os operacionais do Hamas na Cisjordânia. A retaliação a partir de Gaza fez-se ao ritmo dos rockets lançados da Faixa para Israel. Do lado de lá do muro a resposta foi imediata.


As projeções do número de mortos palestinianos variam, na guerra em 2014, mas estima-se que tenham sido cerca de 2.300 nesses 70 dias de guerra, e quase 11 mil feridos. Israel somou 88 mortos.

Nesse ano, Nader saiu da Malásia para regressar a Gaza. Ia festejar o Ramadão. O plano era passar duas semanas em casa, mas acabou por ficar quatro meses. O homem de 40 anos começa a reviver esses dias. E a descrição é quase visual. O chegar à fronteira, o cantar com os amigos, os abraços para suavizar a longa ausência, e a ida à praia que ficava a 300 metros da casa de família. Tudo bom, tudo perfeito. Até que “PUM”. Rebenta a primeira bomba. “PUM” outra vez. Rebenta uma segunda bomba.


Nader Alhabbash. "Não gosto de violência", mas "ou nos matamos ou resistes"

Foram todos para casa. Começara a guerra. Ele e os amigos juntaram-se em grupos nas redes sociais, de forma a que os menos atingidos pudessem ajudar os que estavam a sofrer na pele os ataques da aviação israelita.

Perdeu muitos amigos, vizinhos, pessoas próximas. E também ele acha, e citando as palavras do secretário-geral das Nações Unidas, o português António Guterres, que o que aconteceu em 7 de outubro não resulta do nada. “Não surge do vácuo”. Nader acredita que muitos dos jovens que mataram crianças e idosos israelitas e sequestraram centenas de pessoas, são os mesmos que há quase dez anos perderam o pai à frente dos olhos.

Por isso, ele que garante que nunca teve nada a ver com o Hamas, não os consegue chamar de terroristas. Jura que politicamente está nos antípodas daquela organização.


Alshaaarawi Salem e a família na casa em que vivem em Braga. Foto: Miguel Ribeiro/RR
Alshaaarawi Salem e a família na casa em que vivem em Braga. Foto: Miguel Ribeiro/RR

“Não se pode dizer que são terroristas, como muitas vezes se ouve. O Hamas tem muitas coisas com que não concordo, são mais do que aquelas com que concordo. Os jovens que saíram de Gaza que fizeram o ataque, em 2014, eram jovens que viram as agressões contra palestinianos”, descreve.

O que veem os olhos das crianças

Ana, a ex-mulher, interrompe para concordar e acrescentar. “Há muitas crianças que perderam a família inteira e são estas pessoas que quando crescerem… são pessoas que nunca vão ter uma mente limpa, e que vão ficar traumatizadas por este tempo”.

“E isto vai gerar conflito nas pessoas, vai criar revolta. As pessoas não aceitam a situação na qual vivem. Não quer dizer que se tornem terroristas ou se juntem ao Hamas. Mas vão ser pessoas revoltadas que se vão sentir injustiçadas”, acrescenta.


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"Há muitas crianças que perderam a família inteira e são estas pessoas que quando crescerem… são pessoas que nunca vão ter uma mente limpa, e que vão ficar traumatizadas por este tempo", Ana Canha, ex-mulher de Nader.

A mesma Ana faz a ponte para o filho Afonso, e que à distância é também uma criança que vive um conflito em que a família do pai está a sofrer. Explica como se fala de guerra a um menino que acabou de entrar para a escola primária.

“Há muita coisa que ele não percebe. Mostro-lhe imagens, mas não as que têm pessoas a morrer, apenas as que mostram a destruição física do país… que é o país do pai e que está em guerra”, descreve.

Afonso tem em Gaza a “teta”, que é como se diz avó em árabe, tem lá os primos e os tios. “Quando foi bombardeada a casa [da família] disse-lhe que eles tinham perdido a casa… e que estávamos a tentar que a família do pai viesse para Portugal”, recorda.

Querer acreditar na paz, mas (quase) não conseguir

Nader volta à conversa para dizer que se não fosse o Hamas, seria outra organização a tomar o seu lugar e a fazer as mesmas coisas. Defende que Israel está a bloquear as saídas aos palestinianos, e, por isso, ele próprio começa a duvidar das ideias que sempre teve. Estudou sete anos de Ciência Política porque queria a paz, porque acreditava nela. Continua a desejá-la, mas não consegue criticar quem deixou de o fazer.

“Se eu que dediquei parte da minha vida a tentar perceber como chegar à paz, agora penso assim, imagine os radicais…”. “Imagine uma criança que olha para o pai e mais 20 pessoas da família dele que morreram”, continua.

Para concluir: “A única coisa que pode resolver isto é darem aos palestinianos aquilo que eles têm direito. Não é uma coisa estranha, está escrito nas Nações Unidas. É ler as leis que todos votaram... Só queremos implementar isso...”


Foto: Reuters
Foto: Reuters

E parte deste raciocínio para fazer uma comparação para português entender. “Se a gente de Oeiras ou Carcavelos, porque vivem junto ao mar e têm uma marginal como Gaza, as fechassem por 30 ou 40 anos, tenho a certeza que os portugueses faziam ainda mais do que o Hamas fez... e eu nunca fiz parte do Hamas”, repete.

Questionado em relação ao 7 de outubro, responde que “não é o legitimo”, “não gosto de violência”, “não acho que seja uma solução”, “nem ficamos perto da solução que queremos”.

Mas, porque há sempre um “mas”: “Acho que têm o direito de fazer o que fizeram. Estão a forçar-nos a estar numa prisão, nem os árabes, nem os irmãos, nem o mundo nos vai ajudar, o que vamos fazer? Ou nos matamos ou resistes”, enfatiza.

No Minho, Alshaaarawi vive com a mulher, Rema, que trabalha numa empresa informática de Braga, e Salma, a filha de dois anos. Há um ano e meio que tem passaporte português. O segundo filho do casal vem a caminho. A esposa está grávida de dois meses.

Também o médico palestiniano olha para o ataque do Hamas que vitimou mais de 1.200 israelitas e não consegue condenar. “Condeno é Israel. Antes morreram muitos palestinianos, mulheres, crianças, idosos, todos. Nós na Palestina não somos terroristas”, concretiza.

"Não nos veem como humanos"

A 400 quilómetros de distância, em Lisboa, Nader, olhando mais uma vez para o 7 de outubro — apesar de afirmar não ter visto nada, nem relatos, de algo que Israel já não tenha feito na Palestina —, diz que “não gosta de ver crianças israelitas a morrer”, aliás não gosta de ver “israelitas a morrer”.

“Sei como ser humano o que eles podem sentir ao perder alguém. Mas eles não nos veem como humanos. Vejam o que eles dizem de nós no YouTube. Podem votar e votam em extremistas como o Netanyahu que prometeu acabar connosco”, critica.

Há outra questão que une Nader a Alshaaarawi. O amor por Portugal. Alshaaarawi Salem dá importância à existência de grupos de apoio à Palestina no país. Nader diz que os portugueses não são xenófobos, nem racistas, “ao contrário de outros países”.

“Eu tenho passaporte português. É o primeiro país da União Europeia a escrever no passaporte Território da Palestina Ocupado. Os outros países escrevem Gaza, Ramallah, Palestina. Nós não temos país. Nós fomos ocupados. Mas os portugueses confirmam que estamos ocupados por Israel. Isso é muito bom”, escreve o investigador da Universidade do Minho, que acredita que a maioria do país defende a causa palestiniana.

Nader Alhabbash quer trazer a mãe e a família do irmão para Portugal. Já enviou um email ao Ministério dos Negócios Estrangeiros a formalizar o pedido, mas ainda não recebeu resposta. Alshaaarawi está a tentar o mesmo para os pais. Ambos querem salvar as famílias de um final como o de tantos outros palestinianos apanhados nesta guerra.


Ataque em hospital de Gaza. Foto: Reuters
Ataque em hospital de Gaza. Foto: Reuters

O especialista em Optometria e Ciência da Visão apenas vê um final para tudo isto. Quando a comunidade internacional, em especial a União Europeia e os Estados Unidos, se juntarem e “obrigarem Israel a parar”.

Já Nader não tem dúvidas de que a espiral de terror dificilmente terminará se tudo continuar como está. “Sangue só traz sangue. Violência só traz violência”, resume. Mas o futuro, para ele, só pode ter uma via: “A da paz e um Estado para nós”.

Não será irrealista esperá-lo com tudo o que a cada segundo nos entra pelos olhos adentro? Nader responde com uma citação de Nelson Mandela. “It always seems impossible until it’s done [Parece sempre impossível até se concretizar]”.


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