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Papa deixa “vazio” na Serafina. “Vamos cair no esquecimento”

04 ago, 2023 - 14:58 • Fábio Monteiro

Visita do Papa Francisco colocou o bairro da Serafina na agenda mediática. Agora, moradores temem cair no esquecimento, e que o reforço policial e de limpeza desapareça.

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Quem de repente é visto também pode ser rapidamente esquecido. É essa a sensação que Ana Maria, moradora e proprietária de um café na Serafina, Lisboa, tem. Nos últimos meses, devido à visita do Papa Francisco, durante a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), foram muitas as notícias publicadas sobre o bairro. E as rotinas locais mudaram.

As rondas das forças policiais foram reforçadas, assim como os serviços de limpeza municipais. Mas, agora que o líder da Igreja Católica passou, a dona do café D. Ana Maria, que fica a menos de 100 metros do ao Centro Social e Paroquial (CSP) – Igreja de S. Vicente de Paulo, teme que tudo volte a ser como sempre foi.

“Não vamos ser hipócritas. O bairro vai cair no esquecimento. Claro que vai”, diz. “A voz [de Deus] não vai chegar onde deve, porque eles [os políticos] têm a mania de ter os ouvidos tapados.”

A visita do Papa Francisco, que durou cerca de uma hora, irá, então, deixar um “vazio” em mais que um sentido: espiritual, “uma sensação única”, mas também político.

“Os políticos lembraram-se agora de nós, ao nível de limpeza, a nível de policiamento mais apertado, mas nós precisamos disso nos outros dias. Não é só agora quando vem o Papa, porque têm de ter uma segurança máxima e limpeza máxima. Nós precisamos disso é todo o ano”, afirma Ana Maria.

“Frustrada”, encostada à fita de plástico da polícia que delimitava o perímetro de segurança, a moradora queixa-se à Renascença que poucos moradores conseguiram credencial para estar no CSP da Serafina, mesmo ao lado do Papa Francisco.

“Devíamos ter acesso para conseguir ver o Papa. Não é pessoal que vem de fora que vai ter mais acesso com certeza que nós”, atira.

Um exagero de segurança?

Devido à presença do Papa Francisco, a segurança em torno do Centro Social e Paroquial da Serafina foi muito reforçada. Ainda nem tinha amanhecido, por volta das seis da manhã, quando chegaram quase uma dúzia de carros de polícia com agentes.

No topo da Igreja de S. Vicente de Paulo dava para perscrutar a presença de vigilância policial.

Para muitos moradores, apesar de o bairro da Serafina ter alguns problemas e ser associado ao tráfico de droga, o contingente policial destacado para proteger o Papa Francisco foi “exagerado”, diz Joacine Pires. “Há dez anos que moro aqui no bairro e nunca tive nenhum problema”.

Adélia Pereira, 60 anos, diz que o bairro da Serafina não foi escolhido por ser “muito pobre” ou ter “muitos problemas”, mas, sim, “pela obra cá feita pela igreja, porque se não ninguém cá vinha”.

“Há bairros muito piores. Moro aqui [ao lado do CSP] há 43 anos. Sempre entrei e saí do bairro a qualquer hora. A polícia sempre veio cá”, conta.

Há 45 anos na paróquia, o padre Francisco Crespo é o principal responsável pelo crescimento do CSP da Serafina – que emprega 170 pessoas, em diferentes serviços -, nota a moradora. E confessa ainda que teme que, após a visita do Papa, “a comunicação social nunca mais volte a passar pelo bairro, a entrevistar pessoas a dizer mal das casas e das ruas.”

Pobre, mas com “coração”

Tânia Santos conseguiu uma das muito desejadas credenciais para estar dentro da Igreja de S Vicente de Paulo. É voluntária na Jornada Mundial da Juventude (JMJ) e trabalha também no Centro Paroquial.

“Foram uns bons minutos”, conta à saída, visivelmente emocionada.

“Espero que esta visita deixe muita energia aos jovens, que possam nascer mais ocupações para os tempos livres aqui no centro”, acrescenta. Ou seja, que não se perca ímpeto de crescimento.

Já Emanuel Maurício, acompanhado pela mãe e um irmão, diz esperar que o Papa Francisco tenha ficado com uma boa impressão. “Que dê para perceber: é um bairro pobre, mas com coração de Deus.”

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