​Em Nome da Lei

Costa absoluto, mas sob a espada de Bruxelas

05 fev, 2022 - 12:13 • Marina Pimentel

Três constitucionalistas analisam, na Renascença, os riscos dos governos maioritários de partido único e como poderão funcionar os pesos e contrapesos ao executivo de António Costa, nomeadamente o Presidente da República.

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Costa absoluto, mas sob a espada de Bruxelas
Em Nome da Lei. Ouça o programa na íntegra

O Governo maioritário de António Costa não é livre de governar a seu belo prazer, porque vai ter a Comissão Europeia à perna, adverte a constitucionalista Teresa Violante, em declarações ao programa Em Nome da Lei da Renascença.

A constitucionalista lembra que o novo Governo está obrigado a fazer as 37 reformas estruturais que constam do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), sem as quais Portugal não poderá receber os dinheiros da “bazuca europeia”.

Teresa Violante explica que “o executivo português vai estar condicionado por decisões tomadas por um outro executivo. Neste caso, o executivo europeu. E vai estar sujeito a um instrumento de governação que se tornou muito conhecido dos portugueses há uns anos, que é o instrumento da condicionalidade. Portanto, os dinheiros do plano de recuperação vão estar sujeitos a um instrumento de governação; o semestre europeu, que agora, finalmente, vai ter dentes!”, conclui a constitucionalista.

Refira-se que o desembolso dos 16,6 mil milhões de euros que Portugal poderá receber até 2026, no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência, será feito em duas tranches anuais. Mas estará dependente de outras tantas avaliações de Bruxelas quanto ao cumprimento das reformas estruturais.

Na mesma linha, também Jorge Pereira da Silva sublinha o papel condicionador sobre a atividade governativa que a Comissão Europeia terá por causa do PRR, e que irá abranger áreas que nem sequer são da competência europeia, mas da soberania dos Estados.


As vitórias e derrotas de uma noite de maioria
As vitórias e derrotas de uma noite de maioria

"Governo está aqui ensanduichado entre poderes"

O constitucionalista da Universidade Católica adverte que “maioria absoluta não é sinónimo de poder absoluto” porque há vários elementos de moderação.

“O Estado português, por um lado, está descentralizado internamente. Temos as regiões autónomas, temos as autarquias, cada uma com as suas competências. Por outro lado, faz parte da União Europeia e, portanto, o Governo português está aqui ensanduichado entre poderes acima e poderes abaixo, que por várias vias controlam aqui o exercício do poder por parte do Governo.”

Um dos poderes moderadores da maioria absoluta de partido único será o Presidente da República.

O constitucionalista Jorge Reis Novais adverte que, embora com os poderes constitucionais intactos, na prática Marcelo Rebelo de Sousa vê os seus poderes diminuídos, com o resultado obtido pelo PS nas legislativas. E dá o exemplo do poder de veto do Presidente da República sobre os diplomas do Governo. Num cenário de maioria absoluta, a oposição de Marcelo Rebelo de Sousa será facilmente ultrapassável.

O constitucionalista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e antigo assessor de Jorge Sampaio explica que, “até aqui, o Presidente da República opôs-se muitas vezes a diplomas do Governo. E esse veto, essa oposição, como tem um carácter definitivo, obrigava o Governo a ceder. No caso de uma maioria absoluta, não é assim. Porque quando o Presidente veta um diploma do Governo, este pode apresentar a iniciativa daquele decreto na Assembleia da República, como proposta de lei, e com a maioria que tem ‘obriga’ o Presidente da República a promulgar”.


Jorge Reis Novais defende que num contexto de maioria absoluta é muito importante o papel do Tribunal Constitucional. Mas duvida que, por iniciativa do Presidente da República, a entidade que pode decretar a inconstitucionalidade com carácter geral e abstrato de um diploma venha a ter um maior protagonismo ao longo dos próximos quatro anos, do que teve até agora com Marcelo Rebelo de Sousa em Belém.

“É verdade que numa situação de maioria absoluta seria muito importante a intervenção do Tribunal Constitucional”, defende Reis Novais. “Se o Presidente da República o fizer, acho que está de acordo com a lógica do sistema, mas tenho dúvidas de que o Presidente o faça, a não ser que inverta aquilo que foi a sua prática nestes seis anos”, sublinha.

Marcelo e o Constitucional

Já Teresa Violante acredita que Marcelo Rebelo de Sousa, que até agora só enviou dois diplomas para fiscalização preventiva da constitucionalidade, vai recorrer mais ao Tribunal Constitucional. Isso fará parte de uma mudança que a constitucionalista acredita que irá acontecer na forma de o Presidente intervir na vida pública.

Por outro lado, acredita que “haverá uma mudança também por via dos poderes informais, com mecanismos do género presidências abertas ou outros mecanismos de influência, marcando o debate público e obrigando o Governo a ir atrás da agenda”.

Já o constitucionalista da Universidade Católica Jorge Pereira da Silva acredita que Marcelo usará as tradicionais reuniões das quintas-feiras com o primeiro-ministro como um instrumento de influência sobre a ação governativa.

“Quinta-feira é um dia importante na praxe constitucional portuguesa”, lembra, ”porque o primeiro-ministro vai a Belém informar o Presidente da República sobre todos os assuntos de política interna e externa. Não sei se o atual Presidente terá a disciplina, o método, que tinha Cavaco Silva, para percorrer assunto a assunto aqueles pontos cruciais da governação. Mas estou convencido que esses encontros poderão servir para o Presidente pressionar o Governo a cumprir o tal programa de reformas a que está obrigado pela União Europeia.”

Comentários
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  • Manuel costa
    06 fev, 2022 Viana do castelo 09:52
    O giverno tem a maioria na assembleia é lá que se debatem os problemas, o presifente pode atrasar vetando volta assembleia e botam por maioria, a Europa tem mais com que se preocupar, se eles fizerem asneiras enviam a troica que nos custa um balurdio e emprestan -nos o dinheiro ó preço que bem entenderem os Portugueses só vão ter o que meressem legalizaram um governo que já conheciam pela negociata no govetno anterior

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