29 mar, 2023 - 11:24 • André Rodrigues
O crescimento dos contratos de crédito ao consumo poderá conduzir a um cenário de sobre-endividamento das famílias portuguesas no curto prazo, alerta o diretor do Gabinete de Orientação ao Endividamento dos Consumidores (GOEC).
“Pela pressão do terem mais despesas de consumo, por causa da subida dos preços que já se está a verificar, as pessoas já estão a cortar no consumo. Há de haver um ponto em que já não conseguem cortar mais no consumo e, com a subida das prestações, pelo facto das taxas de juro terem subido, mas também por estarem a contratar mais créditos para satisfazer essas necessidades básicas que não conseguem satisfazer, com certeza vai haver mais famílias sobre-endividadas nos próximos tempos”, antecipa João Calado.
Em declarações à Renascença, este economista e docente do ISEG recomenda, por isso, que as famílias tenham “muito cuidado nessa decisão de contratar agora créditos para o consumo e ponderarem se não poderão adiar um pouco mais, não poderão fazer mais algum esforço para evitar situações mais graves, que vão ser muito piores de sobre-endividamento excessivo”.
Esta é uma recomendação que João Calado estende ao setor financeiro, ainda que numa perspetiva diferente.
Se às famílias se pede prudência nos comportamentos de consumo que podem levar a um descontrolo das suas dívidas, já à banca o apelo é para evite ceder à ganância dos lucros.
O coordenador do GOEC admite que, “neste momento, as instituições financeiras têm uma certa margem para tentarem aumentar a sua oferta de crédito. E estão a fazê-lo. Não quer dizer que estejam a ser imprudentes, mas, obviamente, concedendo mais crédito, obtêm mais lucros”.
Nos últimos cinco anos, a tendência tem sido de su(...)
Perante a vulnerabilidade das famílias mais desfavorecidas – que são, também, as mais expostas ao incumprimento das obrigações de crédito – João Calado defende que as instituições bancárias façam uma avaliação séria e transparente do perfil de risco dos seus clientes e “moderem a sua ambição de crescerem e de terem mais resultados, não colocando os seus clientes em situação de risco, concedendo créditos que depois não podem ser pagos”.
Coloca-se, por isso, a questão: o incumprimento das famílias pode trazer de volta o risco de uma bolha de dívida na banca?
“Não vislumbro neste momento uma situação tão grave que leve necessariamente ao rebentamento de uma bolha, como quando tivemos a Troika”, diz João Calado.
No entanto, insiste este especialista, “dada a subida das taxas de juro, dados os elevados níveis de taxa de inflação, as famílias devem ser prudentes e adiar, se possível, algumas decisões de consumo”.
Se bem que, “a minha expectativa é que a taxa de inflação já está a inverter a sua tendência. Eu acredito com essa descida, as taxas de juro vão apresentar também uma tendência de descida. Ainda assim, mesmo que se inverta esta tendência, a verdade é que elas vão continuar em níveis muito elevados em relação àquilo que estávamos habituados”, remata o coordenador do GOEC.