O professor de Direito do Desporto Lúcio Correia estranha e questiona se não terá havido precipitação na decisão do Conselho de Disciplina (CD) da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) de instaurar um processo disciplinar à Benfica SAD, na sequência de um mega-processo que investiga factos que podem incorrer no crime de corrupção desportiva.

O CD admite a possibilidade de surgirem novas informações relevantes que podem levar a uma nova avaliação da atuação da SAD benfiquista à luz da justiça desportiva. Lúcio Correia estranha a abertura de um processo sobre factos que estão em segredo de justiça.

"O que causa estranheza é o fato de o Conselho de Disciplina ter aberto um processo disciplinar sem que antes o Ministério Público tenha deduzido acusação, e é o Ministério Público que tem todos os factos, que estão em segredo de justiça. Só depois da acusação é que os arguidos que são constituídos ao longo do processo têm conhecimento dos factos que contra si são deduzidos e, normalmente, só depois disto é que surge a justiça desportiva. Porque a justiça desportiva tem a obtenção de meios de prova muito limitados. Fica a aguardar os resultados dos processos criminais para, depois, o Conselho de Disciplina pedir uma certidão ao Ministério Público, para poder conduzir o processo desportivo", recorda.

Para Lúcio Correia, a decisão só se justifica se o CD tiver conhecimento de factos suficientes para acusar a SAD do Benfica, algo que por si só já suscita dúvidas, dado que também é necessário responder pela sua obtenção. Se, pelo contrário, o organismo federativo não tiver material para uma acusação, "se calhar, foi um pouco precipitado":

"Se existem esses factos, há um prazo para deduzir acusação, sendo certo que o conhecimento desses factos e de quando ocorreram também são importantes para que se faça agora acusação e não se tivesse feito anteriormente. Porque os factos por que a Benfica SAD foi constituída arguida não são novos, já têm muito tempo, e também há um prazo que o Conselho de Disciplina tem para poder promover essa acusação."

Conselho de Disciplina tem de ser transparente


Nestas declarações à Renascença, Lúcio Correia sublinha que, se o CD da FPF tiver "dados novos ou importantes" para uma acusação, é seu dever entregá-los ao Ministério Público: "É isso que diz a lei."

"Se os órgãos de justiça desportiva tiverem dados que possam ser crime, têm o dever de participá-los", frisa o professor de Direito do Desporto.

Lúcio Correia não sabe "se os factos que estão no processo criminal são exatamente os mesmos que estão no processo desportivo". No entanto, seja qual for o caso, "normalmente aguarda-se pelo fim da investigação e depois deduz-se uma só acusação, quanto a todos os factos".

"Não se faz acusações parcelares ou acusações quanto a um determinado tipo de crime, depois fecha-se o processo e abre-se outro, para outro tipo de crime. Agora, caberá ao Conselho Disciplina esclarecer a SAD do Benfica e todos os intervenientes porque é que o fez", conclui.