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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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A frente de extrema-direita

12 abr, 2019 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


As forças eurocéticas e hostis à imigração que Salvini quer federar discordam entre si sobre vários pontos. Mas todas são favoráveis a uma democracia iliberal.

Com o novo adiamento da saída do Reino Unido (que até pode acabar em “não saída”…) é quase certo que os britânicos terão de participar nas eleições para o Parlamento Europeu (PE) no fim de maio. O que é estranho, mas será legalmente necessário se, como é provável, o Reino Unido não abandonar a UE até 22 de maio.

Irão os futuros deputados eurodeputados britânicos, a existirem, participar na frente eurocética e anti-imigração que o italiano Salvini está a lançar? Pode acontecer que os britânicos que não querem o Brexit votem em massa (as sondagens dão-lhes agora dez pontos de vantagem sobre os que querem sair da UE), elegendo deputados europeístas. Nas anteriores eleições para o PE, os eurocéticos britânicos até ganharam (Nigel Farage foi eleito), porque a abstenção cresceu.

A frente internacional de extrema-direita que Salvini procura construir, com o apoio de Trump e do seu antigo chefe de campanha e ideólogo Steve Bannon, no imediato visa criar o maior grupo parlamentar no próximo PE. Para isso, terá de superar várias divisões entre os partidos de extrema-direita europeus.

Desde logo, várias posições de Salvini desagradam ao seu parceiro de coligação em Itália, o menos radical 5 Estrelas. E não deixa de ser curioso que este “nacionalista” tenha, ainda há poucos anos, liderado um partido, a Liga do Norte, que queria acabar com a nação italiana, criando, a Norte, um novo país, a Padânia…

Depois, há divergências quanto a Putin, que M. Le Pen aprecia e o partido polaco de direita, no poder, receia. Partido, aliás, que não participou na reunião que Salvini promoveu na segunda-feira passada. Também não participou o partido de V. Orbán, primeiro-ministro húngaro, nem o partido austríaco de extrema-direita que faz parte do governo. Salvini está contra a ortodoxia orçamental da Comissão Europeia, que os partidos nórdicos eurocéticos e o partido alemão de extrema-direita querem, ao contrário, reforçar.

Convém lembrar, além disso, que os chamados países de Visegrado – Polónia, Hungria, República Checa e Eslováquia (mas este país elegeu há pouco uma presidente que não é de extrema-direita) - não ajudaram a Itália quando este país recebia milhares de imigrantes que sobreviviam à travessia do Mediterrâneo. Depois, Salvini fechou a entrada aos refugiados.

Veremos se os deputados britânicos que eventualmente forem eleitos para uma curta estadia no PE serão ativos na tentativa liderada por Salvini de atacar a UE do interior. As promessas de T. May que ficaram nas conclusões da cimeira, na madrugada de ontem, são apenas uma declaração de intenções. O compromisso de que o Reino Unido, enquanto Estado membro da UE em vias de sair, se irá comportar de forma construtiva e responsável pode ser mandado para o lixo se T. May vier a ser substituída por um conservador como Boris Johnson, por exemplo.

Este conteúdo é feito no âmbito da parceria Renascença/Euranet Plus – Rede Europeia de Rádios. Veja todos os conteúdos Renascença/Euranet Plus

Comentários
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  • Estranhos dias estes
    12 abr, 2019 11:28
    Excelente texto que ajuda a reflectir sobre as mudanças políticas e ideológicas que pairam sobre a europa, grande parte, fruto do processo longo e doloroso do Brexit. O adiamento da saída do RU mais não faz que criar incertezas e espaços vazios que estão a ser aproveitados por todo o tipo de populismos. (não apenas à direita como retrata este artigo). Veja-se o que se passa em França com movimentos radicais, ideologicamente diversificados e formas de actuação mais musculadas. Seria bom que os membros da UE percebessem de uma vez por todas que a árvore pode contaminar a floresta e formalizassem um ultimatum ao RU dando-lhe um prazo curto para preparar a saída, findo o qual a mesma seria efectuada sobre os termos dos restantes Estado-Membros. Não querendo parecer precipitada com esta opinião, convém lembrar que inúmeros países (Noruega, Suécia, Suiça entre outros) não são membros da UE mas detém um estatuto especial para acordos e comércio e ninguém faz um drama com isso. Os políticos britânicos estão a sobredimensionar o problema para efeitos políticos internos e de alguns egos também.