Emissão Renascença | Ouvir Online
A+ / A-

Reportagem

​Vacinação Covid-19 ao domicílio. “Do fundo do coração, muito obrigada”

11 mai, 2021 - 06:37 • Cristina Nascimento , Joana Bourgard (fotografia)

SNS tem identificado pessoas que não conseguem comparecer nos centros de vacinação, porque estão acamados ou porque têm mobilidade reduzida. De norte a sul do país, dezenas de equipas esforçam-se para que as vacinas cheguem a todos.

A+ / A-

Por todo o país, milhares de pessoas acamadas ou com mobilidade reduzida não conseguem ir aos centros de vacinação. Nesses casos, se não podem os utentes ir às vacinas, vão as vacinas ter com os utentes.

A logística é pensada ao pormenor: acondicionamento das vacinas, percursos definidos ao detalhe para poupar nas deslocações, um médico de prevenção para o caso de surgirem complicações e enfermeiros que, por meia hora, são o rosto do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Em Lisboa, a Renascença acompanhou os trabalhos de uma destas brigadas de vacinação ao domicílio. Ponto de encontro: antes das 9h00, no Centro de Saúde de Sete Rios. Manuel Santos, enfermeiro coordenador desta unidade de saúde, dá as instruções a seis enfermeiros contratados pela Câmara Municipal de Lisboa - distribuem-se rotas e vacinas com o objetivo de vacinar 24 utentes de manhã, outros tantos à tarde.

A primeira paragem é num condomínio fechado. Um professor universitário reformado, de quase 90 anos, acamado, tem assistência profissional e familiar. Mal dá pela administração da vacina. A enfermeira Filipa Henriques age com segurança e firmeza.

“Já está, senhor professor”, diz, dando depois à cuidadora todas as instruções sobre o que fazer perante possíveis reações à vacinação.

Enquanto se cumpre a meia hora de vigilância, chega a filha do utente, agora já com uma dose da vacina. Teresa Ascensão demonstra que não está de acordo com a forma como o processo de vacinação decorre, mas, no que toca à vacinação do pai, não tem nada a apontar. “Indicámos as razões pelas quais o meu pai não podia ir e pronto. Foi rápido”, diz.

Cumprido o tempo de controlo, Filipa Henriques sai de casa do utente e faz um telefonema. Poucos minutos depois, surge a carrinha de apoio a esta missão, conduzida por um bombeiro. O veículo recolhe os enfermeiros que já estão despachados e leva-os ao encontro da ambulância onde as doses de vacina que vão ser administradas estão acondicionadas numa geleira elétrica.

Nova vacina, novo domicílio

Desta vez, encontramos Joaquim, 83 anos, sentando no sofá, da sua pequena casa. Joaquim não consegue andar, tem graves problemas de visão e uma doença oncológica. Perguntamos se sabe o que vai acontecer. “Sim, senhora. Vou ser vacinado." Sabe também que é a vacina “contra a pandemia”.

Em tempos, foi ladrilhador. Chegou a viver na Venezuela e na África do Sul. Solteiro, vive com os cuidados da irmã, Maria do Carmo, 10 anos mais nova, também já vacinada com uma dose. Muito atenta e meiga com o irmão, Maria do Carmo abre a porta de casa com alegria e não se cansa de agradecer. “Muito obrigada, do fundo do coração”, diz, por várias vezes.

Cumpre-se outra vez o protocolo. Vacina administrada, recomendações dadas, meia hora de vigilância feita e ruma-se à última casa da manhã.

Aqui vai ser vacinação dupla - um casal de 82 e 87 anos. Ela com Alzheimer, ele já "meio apardalado", diz o filho, acompanhado da mulher, ambos no desemprego. Preferem não prestar declarações pois, dizem, são uma família discreta. Oferecem um bolinho, falam com a enfermeira sempre prestando atenção se há alguma reação adversa. Nada a registar, fazem-se as despedidas.

O relógio indica meio-dia e a manhã de vacinação está cumprida.

Filipa Henriques está na vacinação Covid há cerca de um mês, é um extra do trabalho a tempo inteiro na urgência pediátrica do Hospital de Santarém.

“Tem sido muito gratificante”, diz, de imediato. “Aprendemos muito, vamos buscar muita coisa a esta faixa etária que muitas vezes até está esquecida e é quase rotulada ‘já não tem nada para nos oferecer’ e eu acho que é contrário”, explica.

OuvirPausa
Aprendemos muito, vamos buscar muita coisa a esta faixa etária que muitas vezes até está esquecida e é quase rotulada já não tem nada para nos oferecer."

Filipa Henriques diz ainda ter ficado positivamente surpreendida com as realidades que tem encontrado. “Pode haver um ou outro caso mais complicado e um ou outro caso em excelentes condições, ou seja, os extremos, mas, no geral, todos têm apoio”, diz.

“Todos têm visitas de prestadoras de serviços que vão cuidar dos idosos de manhã, à noite, têm fornecimento de alimentação, têm alguém que os supervisiona, estão contactáveis… Com melhores ou piores condições hoteleiras, mas não estão sozinhos. Passam muito tempo sozinhos, mas não estão abandonados”, remata.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+