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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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O preço de um Brexit sem acordo

19 out, 2020 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


Boris Johnson elogia uma provável saída da UE sem acordo. E acusa a UE de intransigência. É preciso ter descaramento para ignorar que, há um ano, Boris tinha firmado um acordo com a UE, acordo que ele próprio renegou há semanas. Mais: fez aprovar leis que inviabilizam o acordo de outubro de 2019.

Depois do Conselho Europeu de quinta e sexta-feira passadas, o primeiro-ministro britânico Boris Johnson anunciou ao seu país que se devia preparar para uma saída da UE sem acordo. Apesar da preocupação de indústrias do Reino Unido que empregam milhões de trabalhadores – a indústria automóvel, por exemplo. Também os agricultores britânicos se opõem a uma saída sem acordo, que faria subir em mais de 40% os direitos alfandegários sobre exportações de carne do Reino Unido para a UE.

Há meses Boris J. tinha considerado o Conselho Europeu da semana passada como a última oportunidade para chegar a um consenso com a UE sobre um novo acordo de saída. Como em tantas outras ocasiões, afinal haverá negociações adicionais em Londres, para onde partiu Michel Barnier e a sua equipa de negociadores.

O que se passa, afinal? Boris J. afirma que tudo depende de a UE mudar de atitude, aceitando as novas propostas britânicas. É preciso ter descaramento para ignorar que, há um ano, o primeiro-ministro britânico tinha firmado um acordo com a UE, acordo que ele próprio renegou há semanas. Mais: fez aprovar leis que inviabilizam o acordo de outubro de 2019, que, repito, foi assinado por ele.

Um ministro britânico reconheceu, na Câmara dos Comuns, que essas leis, ou partes delas, violam o direito internacional. Pior do que isso, ao dar o dito por não dito Boris Johnson manchou o prestígio britânico de seriedade e de honrar a palavra dada. Nunca antes algo deste género havia acontecido.

Boris ficará na história do Reino Unido pelos piores motivos. Por isso e porque a sua popularidade está em queda devido a uma errática condução do combate à pandemia, Boris J. quer fazer acreditar que a falta de um acordo de saída se deve à alegada intransigência da UE.

Ora as posições negociais da UE nesta matéria têm sido decididas por unanimidade pelos 27 membros atuais da Europa comunitária. Mas, se parecem mínimas as hipóteses de se chegar a um acordo a tempo de entrar em vigor a 1 de janeiro próximo, porque aceita a UE prosseguir as negociações? Para que se torne claro que Boris Johnson é um negociador de má-fé, de nula credibilidade.

E já se entrou na fase em que Boris elogia uma provável saída sem acordo. É o que queriam e querem os fanáticos eurocéticos da campanha do referendo de 2016, entre os quais o atual primeiro-ministro britânico era figura destacada. Assim, diz Boris, os britânicos ficarão totalmente independentes e soberanos face à UE. Sem sentenças de tribunais europeus, sem regras do mercado único, etc. Veremos o que lhes vai custar esta alegada “soberania”.

Este conteúdo é feito no âmbito da parceria Renascença/Euranet Plus – Rede Europeia de Rádios. Veja todos os conteúdos Renascença/Euranet Plus

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