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​OE 2021: BE estica a corda até véspera do debate, PCP relativiza e no PSD as opiniões dividem-se

12 out, 2020 - 18:09 • Paula Caeiro Varela e Susana Madureira Martins

Ambos os partidos da esquerda dizem que sentido de voto no Orçamento ainda não está decidido, mas comunistas querem marcar a diferença e consideram prematuro falar num chumbo do Orçamento e na necessidade de uma segunda proposta.

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O Bloco de Esquerda (BE) só deve tomar uma decisão sobre o sentido de voto no Orçamento do Estado (OE) para 2021 no fim de semana que antecede o início do debate orçamental. Esta partido tem vindo a aumentar a pressão, ameaçando mesmo votar contra a proposta do Governo tal como é conhecida até agora. Já o PCP tenta diminuir a pressão, considerando prematuro falar em chumbo do OE.

As dúvidas sobre a aprovação ou não do Orçamento do Estado tornaram-se o prato do dia na última semana e tomaram de assalto o dia de apresentação do documento. Para muitos é difícil acreditar que não estamos apenas perante mais uma encenação entre os partidos à esquerda, para ver quem sai cantando "vitória" mais alto do que os outros.

Mas não é disso que se trata, garante à Renascença fonte próxima das negociações. António Costa mantém o namoro com a esquerda, mas do lado do Bloco é para "levar a sério" o que dirigentes do partido têm dito, em público e em privado sobre o facto de não estarem garantidas as condições para compromisso do Bloco de Esquerda no Orçamento do Estado.

Não há condições para isso, embora também ninguém esteja disponível para assumir uma rotura: as propostas continuam em cima da mesa e a pressão vai manter-se, com "negociações até ao fim", acredita uma fonte, que insiste: "Não estamos perante a pressão negocial do costume".


O Bloco coloca nas mãos do Governo as condições para a aprovação ou não do Orçamento, que estão desde 4 de outubro expressas na resolução da Mesa Nacional do partido, e que passam pela nova prestação social (abrangente e sem condições como quer o Governo); a penalização dos despedimentos nas empresas com lucros ou que recorrem a apoios público; a reposição das regras do subsídio de desemprego anteriores a 2010; a criação da carreira de técnico auxiliar de saúde e a contratação de mais 8.400 profissionais para o SNS do que em 2019 e mais vagas para a formação de médicos. Soma-se ainda a exigência de não haver nem mais um euro para a Lone Star, empresa que comprou o Novo Banco.

O acordo que não foi possível até agora tem de ficar escrito antes da votação do Orçamento em plenário, no final do mês. O Bloco quer passar para o papel tudo o que diz respeito à legislação laboral e que não diz respeito a questão orçamentais. Sem esse compromisso, de papel passado, nada feito.

É a posição largamente maioritária, garantem, e a Mesa Nacional marcada para o final do mês tem a última palavra.

Se esquerda não apoiar, “PSD pode estar interessado”

Da parte do PCP, o cenário traçado é bastante menos tremendista e um dirigente comunista contactado pela Renascença diz mesmo que para o partido que é “prematuro” falar de um chumbo do OE e ainda mais de uma eventual segunda proposta do Governo. Isso "não se coloca", diz esse dirigente, “é prematuro falar disso".

Este membro do Comité Central reconhece que "todos os cenários são possíveis", mas adianta que não há no PCP a "perceção" de que as coisas com o Governo estejam tão estragadas, até porque "as coisas estavam a evoluir", ou seja, as negociações.

Para os comunistas, o cenário de um Orçamento do Estado chumbado e a existência de um segundo documento “nesta altura do campeonato" levanta "dúvidas", com o dirigente do PCP a salientar que não é claro que "o PS esteja interessado num segundo orçamento por causa dos duodécimos”.


De resto, o fantasma de um país a viver em duodécimos foi agitado pelo primeiro-ministro este fim de semana, na resposta que deu aos jornalistas na conferência de imprensa durante a cimeira luso-espanhola.

Questionado sobre as reais condições de viabilização do Orçamento do Estado, António Costa respondeu que "em época de crise não se pode ter o sobressalto dos duodécimos".

Recado do primeiro-ministro sobre o qual os comunistas terão o mesmo entendimento, com o dirigente comunista com quem a Renascença falou e que mostrou em linha com esta tese, lembrando ainda que o país está inibido de ser chamado a eleições legislativas antecipadas a curto prazo.

Agora, há uma convicção para os comunistas. É que este Orçamento do Estado dá respostas em várias direções, com o membro do Comité Central contactado pela Renascença a salientar que, se o documento do Governo "não servir a um sector serve a outro". O que é que isto quer dizer? Simples, trata-se de "uma questão de interesses, há alguma coisa que serve a uns ou a outros".

Mais simples ainda: se o Orçamento do Estado não servir ao Bloco de Esquerda ou ao PCP, o "PSD pode estar interessado".


Uma coisa é certa, lembra este dirigente comunista, é que "as coisas são exatamente como se tem dito publicamente", reforçando que o partido "não faz discussões na rua ou através da comunicação social", rematando com um "não fazemos pressões". E mais, o que o líder do PCP, Jerónimo de Sousa tem dito é exatamente a versão que vale e é esse o estado das coisas.

Em relação ao sentido de voto do PCP na generalidade, este mesmo elemento do Comité Central refere que "não está arrumado", "não está decidido", mas que será "decidido por estes dias", apontando que "a partir de terça-feira as coisas ficam mais claras em relação ao sentido de voto".

Há uma coisa que este dirigente do PCP faz questão de reforçar. É que o PCP votou contra na votação final global do Orçamento Suplementar em junho, apontando ao Governo que "não passou das palavras aos atos" e que neste Orçamento ordinário "vamos ver", deixando claro que nem tudo está decidido. Ou perdido.

E se houver crise?

Imaginemos que o orçamento do Estado para 2021 é chumbado. Marcelo Rebelo de Sousa já avisou, quando António Costa ameaçou com uma crise, que não queria cenários de instabilidade política a somar-se à crise de saúde pública e à crise económica. Mas agora, nem que quisesse poderia, uma vez que entrou no último semestre do mandato presidencial, tempo durante o qual não tem, nos termos da constituição, o poder para dissolver o Parlamento.

Pediu por isso diálogo aos partidos e até lembrou que em tempos idos, ele próprio aprovou enquanto presidente do PSD orçamentos do governo minoritário do PS. O que muitos viram como uma pressão inaceitável sobre o PSD de Rui Rio, é visto por outros como uma oportunidade.

Fontes partidárias dão conta da hipótese de um chumbo do Orçamento à esquerda abrir caminho para a apresentação de um segundo Orçamento por parte do Governo de António Costa.

Seria Rui Rio a evitar a crise política, salvando a face (porque não aprovaria um primeiro orçamento) mas António Costa também não teria de arcar com as consequências de quebrar o entendimento à esquerda que tanto disse desejar.

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