01 jul, 2020
Os alemães têm fama – justificada – de serem eficientes trabalhadores. E também de serem alérgicos a esquemas de corrupção. Ora, esta segunda suposição tem recebido nos últimos anos alguns desmentidos.
São exceções, naturalmente, mas que mancham a imagem da Alemanha. Recordo, por exemplo, o escândalo da Volkswagen, que durante anos fugiu fraudulentamente aos limites da emissão de CO2 nos automóveis que fabricava. Ora, a VW não é propriamente uma pequena empresa.
Agora, o escândalo atingiu uma empresa alemã de pagamentos digitais, que estava cotada no DAX de Wall Street (um índice de cotações de empresas tecnológicas). As suspeitas de que haveria algo errado na contabilidade da Wirecard começaram a surgir há cinco anos. Mais recentemente, o jornalismo investigativo do britânico “Financial Times” contribuiu para agravar essas suspeitas.
O regulador financeiro alemão desprezou esses alertas. E chegou a processar jornalistas que levantavam dúvidas sobre a contabilidade da Wirecard. O regulador alemão inicialmente acreditou na versão da Wirecard, atribuindo as acusações contra ela a manobras especulativas anglo-saxónicas. E instituições respeitáveis, como o Deutsche Bank, defenderam a empresa em causa.
Mas faltavam quase 2 mil milhões de euros nas contas da Wirecard. Esta começou por dizer que esse dinheiro estava nas Filipinas. Era mais uma falsidade. A empresa teve que reconhecer que se tratava mesmo de um “buraco” ilegal.
O fundador da Wirecard, Markus Braun, até há pouco considerado um visionário, demitiu-se e foi preso, saindo em liberdade sob fiança. A Wirecard vai a caminho da falência ou de uma venda.
Há quem compare este caso ao escândalo da Enron, em 2001. Esta empresa americana de energia tinha grande sucesso em Wall Street; o próprio Presidente Bush (filho) a elogiava. Mas faliu, pondo à vista numerosas irregularidades. Foi um símbolo do capitalismo selvagem e do abismo onde ele pode levar.
Como se vê, não é só em Portugal que existem escândalos financeiros. E deficiências na supervisão. Fraca satisfação esta, de haver problemas sérios em países considerados fiáveis. É que a crise da Wirecard pode representar mais um sintoma de que o setor financeiro internacional pouco aprendeu com as crises anteriores.
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