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Da Capa à Contracapa

Estados Unidos ou China? Com a pandemia chegou o "momento da escolha" para Portugal

10 mai, 2020 - 17:54 • José Pedro Frazão

Portugal vai ter de escolher quem é o parceiro que melhor serve os seus interesses permanentes. A opinião é partilhada pelos professores universitários Carlos Gaspar e Miguel Monjardino, no programa "Da Capa à Contracapa" da Renascença.

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A pandemia acelerou a divergência entre Estados Unidos da América e China e Portugal vai ter de escolher quem é o parceiro que melhor serve os seus interesses permanentes. A opinião é partilhada pelos professores universitários Carlos Gaspar e Miguel Monjardino no programa "Da Capa à Contracapa" da Renascença, em parceria com a Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS).

Os investigadores sugerem que Portugal vai ter de optar pela relação mais forte com os Estados Unidos em detrimento de uma parceria económica e tecnológica aprofundada com a China.

Carlos Gaspar sustenta que "neste momento não é possível a um país da Aliança Atlântica fazer um alinhamento tecnológico com a China no domínio das infraestruturas de comunicação de forma impune e sem consequências". O autor do novo ensaio "O Mundo de amanhã", publicado pela FFMS, argumenta que a pandemia acelerou um processo que leva a uma reorganização de alianças com base em escolhas estratégicas.

"O momento da escolha já chegou. Já não há a possibilidade de não escolher politicamente, tecnologicamente, na politica internacional. As escolhas estão aí e vão ser imperativas", complementa o investigador do Instituto Português de Relações Internacionais, para quem Portugal e a União Europeia têm de ter um alinhamento político e estratégico com os EUA e com a NATO.

Para Miguel Monjardino, professor convidado do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica, é também claro que a escolha está à porta das autoridades portuguesas, após um período em que Lisboa quis beneficiar de uma posição de ligação entre os diversos poderes globais.

"Portugal posicionou-se na política internacional como querendo fazer parte da cadeia logística das grandes potências industriais. Um país-plataforma onde toda a gente poderia conviver", salienta Monjardino. Vários países, incluindo Portugal, têm agido "na base de que não precisavam de escolher" entre uma potência e outra, complementa o investigador.

Ruptura entre China e EUA

A escolha portuguesa tem como pano de fundo um cenário de "afastamento e competição" entre as principais potências numa "polarização crescente e crescentemente conflitual" entre os EUA e a China, na análise de Carlos Gaspar.

"Até à epidemia e ao principio deste ano não era evidente que a estratégia de desacoplamento económico e tecnológico fosse levada até ao fim e não pudesse ser invertida. Neste momento, parece claro que é essa a decisão quer de Washington quer de Pequim", analisa o investigador do IPRI e antigo consultor da Presidência da República.

Já para Miguel Monjardino, a opção da China de usar a pandemia como oportunidade para fortalecer a sua influência mundial pode ser precipatada para os seus próprios interesses. "A história julgará se Xi Jinping avaliou bem ou mal esta oportunidade. Nesta fase muito preliminar suspeito que uma parte da liderança do partido comunista chinês se tenha antecipado excessivamente", alvitra o professor universitário e comentador da atualidade internacional.

O afastamento americano e a segurança europeia

Carlos Gaspar argumenta que a retração estratégica dos EUA começou com a resposta à crise financeira de 2008, que marcou a emergência não só da China como da Índia ou o Brasil. O investigador acredita que essa tendência vai manter-se até porque as consequências financeiras da crise de 2008 "são uma brincadeira" comparadas com as desta epidemia.

A devolução das responsabilidade estratégicas aos aliados dos americanos levará à necessidade de uma iniciativa mais decisiva por parte da Europa, incluindo Portugal.

"As principais potências europeias e aliados dos EUA, Portugal incluído, têm que assumir responsabilidades crescentes no domínio da segurança e não apenas no domínio da segurança regional", antecipa Gaspar para quem Portugal deve continuar a sua tentativa de "organizar um partido atlântico na Europa Ocidental".

A "sub-contratação" da União Europeia e da Nato por Portugal para a sua segurança vai estar em risco, diz Monjardino para quem, mais relevante que entender o próximo passo dos EUA, é decisivo definir o que Portugal está disposto a fazer. "Essa é a questão decisiva. Em Portugal temos sido muito preguiçosos nesta matéria", sublinha o investogador da UCP.

Uma tragédia no meio do anedótico

Monjardino diz que é "trágico" que, quase quatro anos após a eleição de Donald Trump, o debate em Portugal se centre mais na figura caricatural do Presidente do que o significado histórico da escolha dos americanos.

"Nós divertimo-nos imenso a fazer humor e a criticar a figura de Donald Trump. Quase metade dos eleitores norte-americanos rejeitaram ou têm muitas dúvidas sobre a estratégia hegemónica que os EUA seguiram desde 1989. Acho extraordinário é que em Portugal não pensemos sobre as consequências que isto tem. Porque toda a nossa integração na União Europeia e toda a nossa relação com os EUA pressupõe uma certa orientação estratégica norte-americana que, do meu ponto de vista, deixa de poder estar garantida", afirma Monjardino que adianta ainda que a pandemia revelou Trump como ele realmente é. "Um lider polítco inexperiente e sem qualidades, que não parece ter aprendido nada nos ultimos anos como Presidente dos Estados Unidos".

O "Da Capa à Contracapa" é uma parceria da Renascença com a Fundação Francisco Manuel dos Santos, que pode ouvir todos os sábados às 9h30 ou a qualquer hora em podcast nas plataformas digitais habituais.

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  • Ivo Pestana
    11 mai, 2020 funchal 14:11
    Fácil! A escolha certa é UE.

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