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Relatório que justificou ataques do ocidente contra a Síria terá sido censurado

24 nov, 2019 - 09:16 • Filipe d'Avillez

A Organização para a Proibição de Armas Químicas é acusada de censurar o relatório sobre o possível uso de armas químicas em Douma, por parte do regime de Bashar al-Assad.

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Um dos especialistas que esteve no terreno em Douma, na Síria, para investigar o alegado uso de armas nucleares contra aquele território, então nas mãos de rebeldes, diz que o relatório final da Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPAQ) censurou as posições dos cientistas e apresentou uma imagem falseada dos factos.

A revelação foi feita pelo jornal britânico “Daily Mail”, que cita um email interno, que lhe chegou às mãos, escrito por um dos especialistas que esteve a fazer investigações em Douma.

O alegado ataque com armas nucleares teve lugar em abril de 2018. Vídeos publicados pelos rebeldes de Douma mostraram imagens chocantes de crianças a espumar da boca e a chorar enquanto equipas médicas as tentavam ajudar. Os autores das imagens culpavam o regime sírio, que na altura tinha Douma totalmente cercada e procurava recuperar o controlo do território.

Apesar de ter sido impossível verificar a veracidade das imagens na altura, os líderes do Reino Unido, Estados Unidos e outros países ocidentais deram-lhes crédito imediato e usaram-nas para justificar ataques de retaliação contra posições das Forças Armadas Sírias.

Mais tarde, em julho, a OPAQ publicou um relatório, supostamente baseado no trabalho dos seus especialistas, que sugeria que de facto tinha sido utilizado um agente químico, nomeadamente cloro, e que este teria sido emitido de dois cilindros lançados por via aérea, isto numa altura em que os únicos aparelhos que circulavam por cima de Douma eram os helicópteros do regime. O relatório foi apresentado pela imprensa como confirmação da culpa do Governo pelo ataque.

Contudo, o email agora divulgado pelo jornal britânico acusa a direção da OPAQ de ter manipulado alguns dados-chave e de ter suprimido outros. Segundo este cientista, cujo nome não é divulgado, os factos encontrados no terreno não suportam a ideia de que ocorreu um ataque químico.

Diz o especialista que embora seja verdade que foi detetado cloro no terreno, foi em quantidades minúsculas e que podiam perfeitamente ser justificadas pelo uso de lixívia caseira. Também não existe qualquer prova de que os cilindros apresentados tenham contido o cloro, ou qualquer outro agente químico, e até a ideia de que foram lançados pelo ar é contrariada pelo testemunho de outro especialista, o engenheiro da OPAQ Ian Henderson, que diz que tudo indica que lá foram colocados manualmente.

O especialista anónimo citado pelo “Daily Mail” diz ainda que os sintomas que se vêem nas imagens divulgadas na altura, bem como os que foram mais tarde apresentados aos cientistas que foram ao terreno, não são compatíveis com a exposição a agentes químicos com base no cloro. No texto da sua missiva exige que o relatório original dos especialistas seja divulgado na íntegra.


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A divulgação do email abala fortemente a credibilidade da OPAQ. O “Daily Mail” recorda que embora a organização seja oficialmente independente recebe grande parte do seu financiamento de estados ocidentais, precisamente os mesmos que acusaram Assad e depois atacaram posições das Forças Sírias.

Douma acabou por ser libertada por tropas sírias, com o apoio de forças russas, pouco tempo depois do alegado ataque. Logo na altura alguns jornalistas que acederam ao local foram confrontados por habitantes que diziam que o ataque tinha sido encenado pelos rebeldes, embora houvesse dúvidas se mesmo essas afirmações não estavam a ser feitas sob pressão do regime.

A Síria encontra-se em guerra civil há mais de oito anos. Nos últimos o regime de Bashar al-Assad, com o apoio de Moscovo e do Irão, tem conseguido recuperar quase todo o território nacional.

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