05 set, 2017 - 21:33 • Ana Carrilho
O empregador pode aceder às mensagens privadas de correio electrónico dos seus funcionários enviadas no trabalho e usando os equipamentos e a conta de correio da empresa, mas só se avisar antecipadamente e esclarecer as regras de utilização, proibindo o uso para fins particulares, explica o professor de Direito de Trabalho, Luís Gonçalves da Silva.
Se não o tiver feito e, inclusive, costuma tolerar o uso do email para fins pessoais, “não se pode lembrar, um dia, de controlar as mensagens”, diz o especialista à Renascença.
Estando avisados, os trabalhadores também têm o dever de saber que, se violarem as regras, sofrem as devidas penalizações, que podem ir de uma simples advertência ao despedimento, refere o professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Não se fala muito na questão, mas aos tribunais portugueses chegam cada vez mais casos destes.
No entender de Luís Gonçalves da Silva, os tribunais decidem, em regra, segundo duas tendências: “uma mais conservadora, que defende a proibição de acesso dos empregadores às comunicações dos seus funcionários, invocando o direito à privacidade. E uma outra, mais moderada, que admite o acesso, desde que a empresa tenha avisado que faria a monitorização das mensagens e estabelecido regras”.
Tribunal Europeu diz que empresas não podem ler emails sem avisar
O assunto ganhou novo fôlego, esta terça-feira, com a decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), que inverteu a decisão tomada em Janeiro do ano passado sobre o caso de um trabalhador romeno que foi despedido depois de trocar mensagens com o irmão e a noiva.
A empresa invocou o facto do seu funcionário ter usado uma conta de correio electrónico destinada a responder às questões dos clientes. Foi despedido e nenhum dos tribunais romenos lhe deu razão. Recorreu para o Tribunal Europeu que lhe deu agora razão, pondo até em causa a competência dos tribunais nacionais.
“Falharam porque não perceberam se o trabalhador tinha sido avisado que as suas comunicações estavam a ser monitorizadas, de não saber a natureza e extensão dessa monitorização ou o grau de intrusão na sua vida privada e correspondência”, refere um comunicado de imprensa.
O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem conclui que “foi violado o direito ao respeito pela vida privada e familiar, do domicílio e da correspondência”.
Ainda assim o TEDH explica que isto não significa que os empregadores não possam, em qualquer circunstância, controlar as comunicações dos trabalhadores ou despedi-los por usarem a internet para fins privados.
Podem fazê-lo, se o trabalhador foi avisado com antecedência; se esclarecer o grau de extensão da monitorização e intrusão na privacidade do empregado, explicando se está em causa o controlo dos envios ou o conteúdo ou quantas pessoas a este têm acesso.
É assim para todas as profissões? Não
E o que acontece com os jornalistas que trocam mensagens com as suas fontes e devem protegê-las? E os advogados, médicos, que têm que salvaguardar a privacidade dos seus clientes e pacientes?
O professor Luís Gonçalves da Silva considera que há profissões sujeitas a códigos deontológicos e deveres constitucionais que não podem estar sujeitas a estas mesmas regras. E defende que esta é uma questão que merece reflexão e debate.