03 set, 2017 - 13:00 • Filipe d'Avillez
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É verdade que a Coreia do Norte levou a cabo mais um teste nuclear?
A primeira pergunta a fazer em relação a qualquer notícia oficial que vem de Pyongyang é se é verdade, uma vez que a relação entre a propaganda do regime e a realidade é tudo menos linear.
Neste caso, a detecção de actividade sísmica na zona do alegado teste coincide com a que houve em vários casos anteriores em que a Coreia do Norte disse ter testado armas nucleares. Tendo em conta este facto, os especialistas acreditam que de facto houve um teste. Se correu tão bem como o regime afirma, ou mesmo se foi do tipo de explosivo que a televisão norte-coreana anunciou, é outra questão.
Que tipo de bomba é que a Coreia do Norte testou?
Segundo a informação oficial de Pyongyang, a arma testada foi uma bomba de hidrogénio. A ser verdade, trata-se da primeira vez que o país testa uma bomba deste tipo e representa um aumento significativo do seu poderio e da sua tecnologia nuclear e atómica. As bombas de hidrogénio são muito mais potentes que as armas nucleares normais, que já se sabia que o país detinha.
Mesmo que se confirme que foi uma bomba de hidrogénio, falta confirmar se o regime tem capacidade para de facto a montar num míssil intercontinental, como afirma, e se esse míssil pode sair e reentrar na atmosfera da terra sem se desintegrar.
Em todo o caso, um teste bem-sucedido implica que a ameaça nuclear da Coreia do Norte aumentou e confirma que o regime não tem a menor intenção de reduzir ou abandonar o seu programa nuclear.
Por que é que a Coreia do Norte está interessada em ter um arsenal nuclear?
Nunca é de descartar a possibilidade de a Coreia do Norte usar as suas armas nucleares de forma agressiva, atacando a Coreia do Sul ou mesmo o Japão, os seus dois grandes rivais regionais. Ter um arsenal nuclear dá a Pyongyang algum poder negocial com o mundo, nomeadamente no que diz respeito ao pedido de auxílio económico e humanitário de que depende para sobreviver enquanto Estado independente. Donald Trump referiu-se recentemente a este facto acusando a Coreia de extorsão sob o disfarce de diálogo.
A desproporção entre a capacidade bélica do Estado norte-coreano e a pobreza e o atraso de desenvolvimento do resto da nação é enorme e a fome é uma ameaça sempre presente no país.
A médio prazo parece definitivamente de descartar qualquer esperança de que o novo líder norte-coreano, Kim Jong-un, liberalizasse o país e pusesse fim ao isolamento a que Pyongyang se votou desde o final da guerra da Coreia e, sobretudo, desde o fim do regime soviético. Mesmo a China, que continua a suportar o regime, tem-se recusado a convidar o novo líder para visitar Pequim e mostra cada vez maiores sinais de impaciência. Contudo, a China sabe que qualquer instabilidade no país levaria a um influxo de refugiados, com a qual não quer lidar.
Que impacto internacional poderá ter este teste nuclear?
Os países que mais directamente se preocupam com o assunto são a Coreia do Sul, naturalmente, e o Japão, que ficam em estado de alerta. Contudo, convém recordar que a mera posse de uma bomba deste calibre não basta. É preciso que o país tenha também a tecnologia para a colocar num míssil de longo alcance, algo que não é certo que a Coreia do Norte tenha conseguido fazer (mesmo que não tenha, tal pode ser apenas uma questão de tempo).
Já o Governo americano vê-se diante de um paradoxo, uma vez que sente a obrigação de condenar os testes e apoiar a sua aliada Coreia do Sul, mas é precisamente esta “ingerência” americana que Pyongyang invoca para justificar o seu arsenal. Num anterior teste, em 2016, a apresentadora de televisão norte-coreana afirmou que “perante a atitude hostil dos EUA, abandonar o programa nuclear seria uma tolice, como um caçador baixar a arma perante a carga de um lobo feroz”.
A eleição de Donald Trump representou uma mudança de paradigma. A linha oficial dos EUA já não é apenas de apelos à calma e condenações. Trump já disse que o problema da Coreia do Norte não se resolve pelo diálogo e agora, depois de mais este teste, afirmou que o regime "só entende uma coisa", podendo-se inferir que se refere ao uso da força. Contudo, não foi ainda tomada nenhuma medida concreta nesse sentido por parte de Washington.
[Notícia actualizada no dia 3 de Setembro de 2017]