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OPEN CONVENTOS

“Queremos que as pessoas entrem e se apaixonem por estes edifícios”

23 mai, 2024 - 05:15 • Ângela Roque

Há antigos mosteiros de Lisboa que são hoje hospitais, tribunais, museus, hotéis. Até sábado, é possível visitá-los gratuitamente e conhecer a sua história. Hélia Silva, da Direção Municipal de Cultura da autarquia, e José Manuel Pimenta, da Pastoral do Turismo do Patriarcado, falam à Renascença sobre a iniciativa que abre portas a 36 antigos conventos da cidade.

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Esta é já a 3ª edição do Open Conventos, e os organizadores esperam conseguir atingir os níveis de 2023.

“O ano passado, entre visitas guiadas, visitas livres e itinerários, chegámos às cinco mil. Este ano, acredito que o número irá rondar essa ordem de grandeza”, diz à Renascença José Manuel Pimenta, da Pastoral do Turismo do Patriarcado de Lisboa, uma das entidades promotoras da iniciativa.

A procura tem sido mais pelos itinerários e visitas guiadas, mas este responsável lembra que há inúmeras visitas livres, em muitos locais onde de outra forma não se consegue aceder facilmente. O programa tem iniciativas em 36 edificios conventuais.

"Nestes dois dias, sexta e sábado, garantimos que cerca de 12 ou 13 conventos vão estar abertos livremente, com apoios no local para as pessoas poderem fazer a sua visita autónoma. É a possibilidade de visitar espaços que habitualmente ou estão fechados, ou os horários não são adequados para quem trabalha. Ou então museus em que habitualmente tem de se pagar, e que nesta edição podem ser visitados gratuitamente”, diz.

O público é variado. “Nas visitas guiadas e nos itinerários, a grande maioria são nacionais, lisboetas, e também historiadores e alunos dos vários cursos de turismo, história e história de arte. Nessas já participam alguns estrangeiros, mas onde notamos mais turistas é nas visitas livres. Como fazemos uma divulgação bastante ampla, fazem eles as suas próprias rotas e participam".

Lisboa ainda tem 70 edifícios que foram conventos

Como nas edições anteriores do Open Conventos (2019 e 2023), está prevista a visita a edifícios emblemáticos, que muitos nem sabem tratar-se de antigos mosteiros. É caso da Assembleia da República ou do Palácio das Necessidades, onde funciona o Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Com um número de visitantes limitado, as inscrições para esses locais esgotaram rapidamente. Mas, há muito para ver e aprender, sublinha Hélia Silva, da direção municipal de cultura da câmara municipal de Lisboa (CML), que fala num caso emblemático da Baixa pombalina.

“Aquilo que para todos os lisboetas era o Brás e Brás, no antigo convento de São Domingos de Lisboa. A Igreja já estava aberta ao público, mas conseguimos autorização do hotel, que agora está a ocupar a zona do antigo claustro e da sala do Capítulo, para entrarmos. E é um espaço maravilhoso”, garante.

Entre as novidades do programa deste ano consta, ainda, “a visita ao Colégio Almada Negreiros, que é um edifício dos Jesuítas, construído no século XIX para ser colégio e que hoje é a Igreja de Santo António de Campolide. Conseguimos também entrar no convento do Menino Deus, um dos edifícios mais extraordinários da primeira metade do século XVIII”. Fica perto do Castelo de São Jorge, e “quem passar por lá vai ficar encantado”, assegura.

Desta vez não vão conseguir ir ao convento de São Domingos o Novo, no Alto dos Moinhos, dos dominicanos - o mais recente que foi construído em Lisboa -, mas vão a outro, de construção também recente. “Vamos ao convento de São Maximiliano Kolbe, em Marvila, uma visita guiada pelo próprio arquiteto Gonçalo Byrne e pelo frei Tibério, que é um dos religiosos que mora neste espaço”.

A maioria dos edifícios que vão visitar são hoje outra coisa, porque “a métrica e proporção destes edifícios permite esses usos: permite ser um museu, ser um hospital, ser um hotel, ser um colégio”. Ao todo, diz, “existem em Lisboa 70 edifícios que foram antigos conventos”. Mas, continuam a marcar a cidade? “Continuam! Eu costumo fazer sempre uma pergunta nas visitas, se as pessoas conseguem dizer antigos conventos, e geralmente fica tudo a olhar para mim… depois, lá um ou outro diz… mas, na verdade, ainda existem 70 edifícios que foram antigos conventos”. É o caso de alguns hospitais.

"Estes foram todos antigos conventos: São José, Santa Marta, Santo António dos Capuchos”. Mas também “o Tribunal da Boa hora, o Colégio do Bom Sucesso, ou o convento de São Francisco da Cidade, que tem a Escola de Belas Artes e o Museu”.

"Os conventos aguentam tudo", exceto "estarem vazios e perderem a alma"

O Open Conventos abre esta quinta-feira, 23 de maio, e o programa para este dia passa pela igreja e Museu de São Roque, e pelo vizinho centro cultural jesuíta, onde decorrerá um debate com a escritora Ana Margarida de Carvalho, a maestrina Inês Tavares Lopes, o padre João Norton e duas monjas de Belém, a irmã Anatália e a irmã Maïlys, que participarão por Zoom a partir do convento onde estão, no Couço.

“Na conversa que vamos fazer na Brotéria, com escritores, músicos e as monjas, vamos falar sobre ‘pausa e silêncio’, que é uma coisa que eu acho que todos nós estamos a precisar, de facto, nesta vida maluca que temos. Refletir um bocadinho. Parar para pensar e respirar fundo”, conta Hélia Silva, que admite que esta é uma forma diferente de marcar o arranque da iniciativa, em que muitos dos locais a visitar também convidam a essa interioridade.

ÀS 20H, no convento de São Pedro de Alcântara será transmitido o filme “O Grande Silêncio” de Philip Groning.

A maioria dos itinerários, visitas guiadas e visitas livres concentra-se na sexta-feira e sábado. Para José Manuel Pimenta, da Pastoral do Turismo de Lisboa, esta é uma proposta diferenciadora, pela qualidade e novidade que oferece, seja pelos espaços visitáveis, seja pelos guias. “Estas visitas guiadas, na maioria, são feitas por especialistas - historiadores, historiadores de arte, arquitetos - que estudaram ou estiveram envolvidos em algum projeto nestes espaços. Portanto, estas visitas têm esta riqueza e profundidade de poder apresentar estes conventos nas suas diversas faces”.

Diz que há toda uma “complexidade interpretativa” e riqueza artística que os guias vão ajudar a compreender. “Que estilo arquitetónico foi seguido na edificação daquele convento? Que artistas é que foram convidados para produzir o seu património, seja de pintura ou escultura, as alfaias litúrgicas?”, exemplifica.

Fundamental para compreender tudo o resto nestes edifícios são as “diversas vicissitudes” da História, “nomeadamente com o Marquês de Pombal e a expulsão dos Jesuítas, com o reinado de D. Maria II e a expulsão das ordens religiosas, e depois com a República”. Depois disso “estes espaços continuaram a marcar a paisagem da cidade de Lisboa, mas passaram a ter outro uso e outras finalidades”.

José Manuel Pimenta fala no “caso paradigmático” da que é hoje a Igreja das Mercês. “No Convento de Jesus, que era um espaço único, temos agora três usos distintos: no lado esquerdo um hospital, ao meio uma igreja paroquial, e no lado direito a Academia das Ciências. Desde a expulsão das ordens religiosas que houve portas que nunca mais se abriram. Aconteceu, pela primeira vez, na primeira edição do Open Conventos, em 2019: conseguiram-se abrir as portas e passar da igreja para o hospital, da Academia das Ciências para a igreja, e vice-versa. Permitiu-nos fazer uma visita guiada completa, tendo em conta os fins novos que hoje este espaço tem”, conta.

Para este responsável “há duas dimensões que é sempre importante considerar quando se fala nos conventos e mosteiros da cidade de Lisboa, e em todos em geral, é que tinham uma dupla finalidade: uns eram dedicados à vida contemplativa, conventos de clausura que tinham como objetivo a oração e fazer a assistência espiritual às várias comunidades onde se inseriam; e uma outra é que eram conventos que estavam voltados para responder às necessidades da população, nomeadamente a educação, com os jesuítas, ou a assistência aos pobres, com os franciscanos. Os dominicanos tinham um grande pendor celebrativo e dos sacramentos, e os paulistas, que estavam na calçada do Combro, com uma grande devoção à Eucaristia”, resume.

Para Hélia Silva "os conventos são edifícios que aguentam tudo, só não aguentam o estarem vazios e perderem a alma. O que nós queremos é que as pessoas entrem, que visitem, que se apaixonem por estes edifícios, porque para proteger este património, as pessoas precisam de conhecer”, sublinha.

O Open Conventos é uma iniciativa conjunta da Câmara Municipal de Lisboa, Santa Casa, Patriarcado e Universidade Nova de Lisboa. No texto de apresentação lê-se que os conventos no passado “constituíam uma verdadeira rede que, a partir do ideal cristão, respondiam a múltiplos fins: oração, acolhimento, educação e ajuda aos mais desfavorecidos”. Hoje “com novos propósitos, estas antigas casas religiosas continuam a ser uma referência ao melhor de nós”.

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  • Graça Horta
    23 mai, 2024 Linda a velha 20:53
    Sou professora de História e gostaria de visitar o convento dos Oratorianos/ Ministério dos Negócios Estrangeiros.

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