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Abusos na Igreja. Grupo VITA apresenta primeiro relatório a 12 de dezembro

26 mai, 2023 - 07:00 • Ana Catarina André

"Estamos a apelar às pessoas que possam precisar de algum tipo de ajuda que nos contactem diretamente", ainda que já tenham falado com a Comissão Independente, diz a psicóloga Rute Agulhas.

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O VITA, grupo de acompanhamento das situações de abuso sexual de crianças e adultos vulneráveis no contexto da Igreja Católica em Portugal, irá apresentar o primeiro relatório a 12 de dezembro, em Lisboa.

A notícia foi avançada à Renascença por Rute Agulhas, a psicóloga que coordena a equipa criada em abril pela Conferência Episcopal Portugal, na sequência do trabalho desenvolvido pela Comissão Independente.

Em entrevista à Renascença, no final da primeira semana de funcionamento da linha telefónica de apoio às vítimas e acompanhamento aos abusadores, Rute Agulhas adianta que a lista dos profissionais disponíveis para colaborar com o VITA deverá ser entregue pela Ordem dos Psicólogos no início de junho, e a dos psiquiatras, enviada pela Ordem dos Médicos, no fim desse mesmo mês.

Todos os que pretendam contactar este grupo de apoio podem fazê-lo através do 915 090 000, de segunda a sexta-feira entre as 9h00 e as 18h00, ou por email (geral@grupovita.pt).

Que balanço faz desta primeira semana em que a linha telefónica criada pelo grupo VITA começou a funcionar?

Tem sido uma primeira semana com muitas chamadas telefónicas, mais até do que do que emails. O apartado postal será partilhado em breve. Já temos o nosso site ativo, www.grupovita.pt, mas ainda não tem um formulário onde se possa escrever – a breve prazo terá.

Temos recebido muitas chamadas telefónicas de pessoas que tinham contatado a Comissão Independente previamente. Outras estão agora a fazer o primeiro contato.

Achamos que é importante partilhar aqui uma questão relevante, que é o facto de não termos os contactos das vítimas que previamente pediram ajuda, ou partilharam a sua história com a Comissão Independente – a própria Comissão Independente não nos pode passar essa informação por questões de privacidade e de confidencialidade. Estamos a apelar às pessoas que possam precisar de algum tipo de ajuda que nos contactem diretamente. Não temos forma de chegar até elas.

Disse que pediram à Comissão Independente que contactasse as vítimas, nos casos em que isso é possível, no sentido de ver se estariam disponíveis para ser ajudadas pelo Grupo VITA.

Nós pedimos isso à Comissão Independente, que se mostrou muito disponível, mas até ao momento, efetivamente, não recebemos qualquer contato que fosse mediado pela Comissão. Por isso, sentimo-nos um pouco preocupados com a possibilidade de haver pessoas que já partilharam sua situação com a Comissão Independente e que possam, neste momento, ter uma expectativa de receber da nossa parte um processo de ajuda. Queria deixar claro que não temos esses contactos. Portanto, se as pessoas não nos contatarem diretamente, nós não temos qualquer forma de chegar até elas.

O que é que as pessoas encontram quando recorrem à linha?

Trata-se de uma linha de acolhimento, na perspetiva de perceber um pouco o que se passou. Estamos a marcar atendimentos presenciais ou online, dependendo da residência da pessoa, e nesse atendimento vamos recolher mais informação para poder perceber a natureza daquela situação, e que tipo de ajuda e de encaminhamento é preciso. Poderá haver situações em que sentiremos necessidade de ter mais do que um atendimento.

Das vítimas que vos contactaram até ao momento, há algumas que já foram encaminhadas para acompanhamento psicológico ou outro?

Há algumas pessoas que chegam até nós a dizer que não precisam nem de apoio psicológico, nem de apoio psiquiátrico. Mas no decorrer da interação e do atendimento, percebemos que há ali algumas situações que, de facto, requerem ajuda especializada. Quando se abre essa possibilidade, as pessoas estão a mostrar uma grande recetividade.

Neste momento, no que diz respeito à psicologia, estamos prestes a receber a indicação por parte da Ordem dos Psicólogos Portugueses dos profissionais que estão disponíveis para integrar esta bolsa. Já articulámos também com o Colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos e com a Ordem dos Advogados, também no sentido de ter uma bolsa de profissionais para apoio jurídico, se for necessário.

Estamos, nesta fase, a criar esta estrutura, mas em paralelo, estamos já a articular com as estruturas que existem em Portugal e que dão resposta também a este tipo de casos, para que situações mais urgentes não fiquem jamais pendentes, à espera que tenhamos as nossas bolsas constituídas. Estamos, de alguma forma, a tentar seguir aqui vários caminhos em simultâneo para que nenhuma pessoa fique sem a resposta que precisa.

Dessas então algumas já estão a receber apoio?

Estão neste momento em processo de encaminhamento. Abrimos esta linha telefónica na segunda-feira. Estamos a terminar uma semana de atendimento e, portanto, há um primeiro atendimento com a pessoa.

Depois há um atendimento presencial ou mais detalhado, com mais tempo, que tem de ser agendado também em função da disponibilidade dos horários de trabalho das pessoas e da sua vida pessoal, familiar. Mas já percebemos que há aqui algumas situações que necessariamente vão ser encaminhadas para apoio psicológico, outras para apoio psiquiátrico.

Enquanto aguardamos aqui pela constituição da bolsa de profissionais, estamos a articular com estruturas que já existem em Portugal.

Têm alguma previsão sobre a data em que a Ordem dos Psicólogos irá enviar-vos essa lista de profissionais disponíveis?

Prevemos que a Ordem dos Psicólogos envie essa lista agora no início do mês de junho. A Ordem dos Médicos provavelmente só [o fará] talvez mais para o final do mês de junho, no que diz respeito à psiquiatria. [E relação à] psiquiatria da infância e da adolescência, o processo está a ser um pouco mais moroso e, portanto, ainda não consigo adiantar nenhuma data.

Uma das valências do grupo VITA é também o acompanhamento dos abusadores e das pessoas com tendência para cometer esse tipo de crimes. Já receberam contatos neste âmbito?

Ainda não, mas muito honestamente não estávamos à espera que começasse tão cedo. Sabemos que pedir ajuda, especificamente para essas pessoas que cometeram ou estão em risco de cometer crimes sexuais, é especialmente difícil. Portanto, não, não fomos contactados até ao momento, mas vamos continuar este trabalho de sensibilização, para chegar junto das diferentes estruturas, para que as pessoas saibam que essa resposta também existe.

Vão tomar a iniciativa de contactar essas pessoas?

Não temos a lista das pessoas que foram sinalizadas, ou que são suspeitas de ter cometido algum crime natureza sexual. Vamos tentar, sim, através da própria Igreja sensibilizá-las no sentido de pedirem ajuda. Pode haver pessoas que efetivamente dizem que não cometeram qualquer crime de natureza sexual, mas sentem-se injustiçadas e sentem necessidade de apoio psicológico ou psiquiátrico. Pode haver outras que assumam os seus comportamentos e precisem de ajuda para não reincidir. Há aqui uma diversidade de situações, mas não podemos, nem vamos ser nós a ir ter com essas pessoas. Tal como não temos identificação das vítimas, também não temos a identificação desses suspeitos e, portanto, não podemos ser proativos. Nesse sentido, apelamos a que as pessoas venham ter connosco.

O que é que está previsto em termos de prevenção?

Ainda estamos a fazer esse mapeamento, não só com a Igreja, mas também com também com outras entidades, nomeadamente com a Direção-Geral da Educação, com a Associação Portuguesa de Educadores de Infância, com os Escuteiros. Estamos a estabelecer um conjunto de parcerias e a tentar ver quais é que são as necessidades, para percebermos se efetivamente serão os elementos do grupo que, em algumas circunstâncias, vão sensibilizar e agir de uma forma mais direta junto dos destinatários, ou se – e parece-me que esta segunda hipótese terá maior probabilidade de abranger mais pessoas – poderemos trabalhar com pessoas e estruturas intermédias que possam depois, por sua vez, acabar por trabalhar de uma forma mais direta com os destinatários finais.

O grupo VITA vai ter algum papel ou intervenção num eventual encontro das vítimas de abusos sexuais com o Papa Francisco, quando vier a Portugal no Verão?

Até ao momento, não fomos informados sobre essa possibilidade. Naturalmente se nos for pedido algum tipo de colaboração, estamos totalmente disponíveis.

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