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Derrocada em Borba. Defesa critica perícia, MP mantém acusação

15 jan, 2021 - 17:38 • Rosário Silva

Debate instrutório decorreu esta sexta-feira, em Évora. Caso remota a novembro de 2018, quando a derrocada de uma estrada para uma pedreira provocou cinco mortes.

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A defesa dos autarcas arguidos no caso da derrocada em Borba critica o relatório pericial, que apelida de “não é isento”. No debate instrutório, o Ministério Público reforçou que os suspeitos “estavam cientes da gravidade da situação” e nada fizeram.

A defesa dos arguidos António Anselmo e José Espanhol, respetivamente, presidente e vice-presidente da Câmara de Borba mostra-se “confiante” na decisão do juiz de instrução criminal de Évora que, espera, seja de “não pronuncia” dos seus clientes.

“Sim, nesse sentido estou confiante e espero que o senhor juiz de instrução analise todos os factos, aprecie todas as questões que foram colocadas e profira uma decisão justa”, que será “a não pronuncia”, tendo em conta “os indícios de prova que os autos fornecem, mas vamos aguardar a decisão”, afirmou, aos jornalistas, o advogado Silvino Fernandes, no final do debate instrutório que decorreu esta sexta-feira no edifício do Parque do Alentejo de Ciência e Tecnologia (PACT), em Évora.

António Anselmo e José Espanhol são dois dos cinco arguidos, de um total de oito associados ao caso da derrocada da estrada de Borba, que requereram a abertura de instrução, que o mesmo é dizer, a fase facultativa em que um juiz decide se o processo vai para julgamento.

Além dos dois autarcas, também o antigo diretor regional de Economia do Alentejo João Filipe de Jesus, a funcionária da Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) Maria João Figueira e Paulo Alves, responsável técnico da empresa que possui a licença de exploração da pedreira, foram os outros acusados que requereram abertura da instrução.

Os restantes arguidos são a sociedade Ala de Almeida Limitada, que possui a licença de exploração da pedreira, onde ocorreu a derrocada e dois funcionários da Direção-Geral de Energia e Geologia, José Pereira e Bernardino Piteira.

O Ministério Público (MP) acusou os oito arguidos, um dos quais é pessoa coletiva, da “prática de vários crimes de homicídio e de violação de regras de segurança", depois de um inquérito instaurado com a finalidade “de apurar as circunstâncias que rodearam o colapso" da Estrada Municipal (EM) 255, ocorrido em 19 novembro de 2018.

Depois das sessões realizadas em dezembro de 2020, na fase de instrução, em que foram ouvidas várias testemunhas pelo juiz titular do processo, o MP veio, hoje, no debate instrutório afirmar que “mantém todos os factos da acusação imputados aos arguidos”, considerando que “deverão ser pronunciados” nos termos dessa mesma acusação.


"Estavam cientes da gravidade da situação"

Para o procurador, as testemunhas ouvidas “nada trouxeram de novo”, reafirmando que os arguidos “estavam cientes da gravidade da situação e do perigo de rutura estrada”, e nada fizeram “pela integridade dos trabalhadores e das pessoas que circulavam na estrada”.

Afirmações refutadas pelo advogado Silvino Fernandes, alegando que o MP sustenta a sua acusação num relatório pericial que “não é isento”, pois “descartou documentos importantes elaborados por catedráticos do Instituto Superior Técnico e da Universidade de Évora, que atestavam que o talude em causa estava em condições e não oferecia qualquer perigo”.

A defesa de António Anselmo e José Espanhol considerou ainda que a perícia ignorou “elementos” de ordem natural, dando como exemplo a chuva, que caiu intensamente nesse período, a atividade sísmica verificada e explosões associadas à pedreiras e que terão sido ouvidas na ocasião.

“O MP imputa aos arguidos comportamentos que não estão consubstanciados em factos que possam ter interesse para a decisão a proferir no âmbito desta instrução”, argumentou o advogado, alegando que “dever-se-á concluir pela decisão de não pronuncia” dos autarcas.

O mesmo foi pedido pela defesa do antigo diretor regional de Economia do Alentejo João Filipe de Jesus, entre 2012 e 2015.

“O arguido nunca foi alertado para o perigo grave ou iminente de derrocada no local”, não tendo chegado à sua posse “nenhum estudo que alertasse para esse efeito”, além de que o “memorando de 2014”, que abordava essa questão, “perdeu atualidade em face dos posteriores pareceres técnicos”, justificou.

Quanto à defesa da funcionária da Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) Maria João Figueira, foi referido que “deixou de ter responsabilidade sobre as pedreiras do Alentejo e Algarve”, a partir de 2015, não sendo, por isso “justo pronunciá-la, nem legalmente, nem juridicamente.”

Já a defesa de Paulo Alves, o responsável técnico da empresa que possui a licença de exploração da pedreira, argumenta que “a conduta do engenheiro nunca pode preencher estes tipos de crime e violação de regras”, uma vez que “não há relação entre este e qualquer trabalhador daquela empresa”, onde, de resto, “só se deslocava uma vez por mês.”

Terminada a instrução requerida por cinco dos oito arguidos, cabe agora ao juiz de instrução criminal de Évora e titular do processo, decidir se estes vão a julgamento.

Há pouco mais de dois anos, a 19 de novembro de 2018, um troço da EM 255, entre Borba e Vila Viçosa, colapsou, devido ao deslizamento de terras para o interior de duas pedreiras, uma das quais desativada e com grande quantidade de água.

O acidente causou a morte de dois operários de uma empresa de extração de mármore na pedreira que estava ativa e de outros três homens, que seguiam em dois automóveis no troço da estrada e que caíram na pedreira sem atividade.

À margem do processo judicial, os 19 familiares e herdeiros das vítimas mortais da derrocada receberam indemnizações do Estado, num montante global de cerca de 1,6 milhões de euros, num processo que ficou concluído em julho de 2020.

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