31 jul, 2020 - 20:38 • Lusa
Mais de 300 pessoas homenagearam, ao final da tarde desta sexta-feira, em Lisboa, o ator Bruno Candé, que morreu baleado no último sábado, e exigiram medidas proativas para combater o racismo, um problema que “vem de há muitos séculos”.
“Sinceramente, acho que isto [a homenagem a Bruno Candé e a manifestação contra o racismo] não vai mudar nada. A mentalidade das pessoas racistas é que tem de mudar, mas é uma bonita homenagem que estamos a fazer ao Bruno e à família dele”, disse à agência Lusa Aminata Gebate, de 19 anos.
A homenagem ao ator, que tinha 39 anos, começou com cinco minutos de aplausos. As mais de 300 pessoas que se concentraram no Largo de São Domingos, em Lisboa, aplaudiram voltadas para uma das varandas laterais do Teatro Nacional D. Maria II, onde foi colocada uma enorme faixa com o rosto de Bruno Candé.
Alguns smartphones ao alto registaram o momento, enquanto outros transmitiam a homenagem em direto através das redes sociais.
Depois dos aplausos, um semicírculo formou-se no meio da multidão. No centro estavam as irmãs de Bruno Candé, acompanhadas por outros familiares e amigos, que vestiam camisolas com o rosto do ator.
Em uníssono, os manifestantes entoaram várias palavras de ordem, como, por exemplo “justiça, justiça, justiça pelo Bruno Candé”.
Várias pessoas empunhavam cartazes onde era possível ler, por exemplo, “Bruno Candé ninguém te esqueceu! Portugal escuta nosso silêncio!” ou “racismo é burrice coletiva sem explicação”.
Uma manifestante fazia esvoaçar uma bandeira de Portugal onde estava escrito “o racismo não está a piorar, está a ser filmado”.
E nem os decisores políticos ficaram de fora deste protesto.
Um cartaz empunhado por um manifestante exigia ao Presidente da República “uma resposta proativa e não reativa, como tem sido há 45 anos”, enquanto outro era direcionada para os deputados na Assembleia da República, acusados várias vezes de inação durante o protesto: “Racismo é crime, tanto na rua, como no parlamento.”
A manifestação desta sexta-feira é necessária para “acabar com um problema que já vem de há muitos séculos”, sublinhou Joana Sabino, de 18 anos.
A opinião de Joana é partilhada por Mauro Barros, que espera que o homicídio de Bruno Candé “sirva de exemplo” e seja o último crime de origem racial. Contudo, o manifestante de 20 anos mostrou-se pouco confiante.
“Sabemos que isto vai voltar a acontecer, só não sei se será este ano, se mais tarde”, explicou.
Já Martinho Fonseca, também de 20 anos, mostrou que se debruçou sobre o assunto e apontou para a alteração “dos planos educativos” como forma de acabar, de uma vez por todas, com o racismo.
O Governo tem de utilizar a Educação “para mudar mentalidades”, vincou o manifestante, uma vez que “muitas pessoas crescem, em casa, com mentalidades que não são as melhores”, alimentadas pelo pensamento “do antigamente”.
Referindo-se ao período dos Descobrimentos, Martinho Fonseca considerou que a História de Portugal é “grande e muito rica”, mas durante essa mesma História “foram cometidos muitos erros”.
“Não podemos voltar atrás, mas podemos reconhecer que aconteceram [erros] e que têm peso atualmente”, prosseguiu.
“Eu próprio, sendo branco, já ouvi muita coisa com a qual não concordo, mas não posso aceitar isso. Todos temos de ter um papel ativo nesta mudança”, explicitou.
E do papel que todas as pessoas para combater o racismo foi também aquilo que mais se entoou durante a manifestação, porque o racismo “é uma luta de todos” e este flagelo só poderá ser vencido “por todos”, gritou um dos manifestantes com um megafone.
Bruno Candé iniciou o seu percurso no grupo de teatro da Casa Pia, ainda na adolescência, tendo posteriormente frequentado o curso de formação teatral do Chapitô, onde chegou em 1995 e participou em vários espetáculos, dirigidos pelo encenador Bruno Schiappa.
O suspeito do homicídio vai aguardar julgamento em prisão preventiva.