30 abr, 2018 - 14:00 • Liliana Carona
Os 25 habitantes da pequena povoação de Ima, na freguesia de Jarmelo São Pedro, concelho da Guarda, vão receber quatro famílias de refugiados, cedendo casas e terrenos que estão ao abandono.
Em Ima, não se vê gente de um lado para o outro, não há cafés, restaurantes ou lojas, mas não faltam hectares de terreno para cultivo. E há, também, um forno comunitário para quem souber cozer pão, além de uma paisagem verdejante e florida, onde se avista algum gado.
A quietude do dia-a-dia é interrompida pelos jornalistas que têm procurado a aldeia. Alcina Trindade, 74 anos, apressa-se a informar que “beber café só na máquina lá de casa”, mas não quer que chamem a aldeia de “fantasma”.
“Se os jovens vierem e quiserem trabalhar, isto dá, mas nós já estamos velhos”, desabafa. Em tempos, houve até uma leitaria em Ima. O edifício ainda existe, mas já ninguém vai recolher o leite. Agora, leite, só para consumo próprio.
As famílias de refugiados vão chegar no âmbito de um projeto-piloto que está a ser desenvolvido por uma jovem do Porto. Trata-se de uma espécie de intercâmbio que visa a integração contínua das pessoas, designado por um "LAR - Love And Respect".
A união fez a força e o sonho da jovem de cabelos negros do Porto conquistou os habitantes de Ima. "Não vamos fazer isto sozinhos, temos uma equipa excecional, somos uma equipa de quatro pessoas”, revela Barbara Moreira.
A jovem, de 28 anos, formada em Gestão de Marketing e a concluir o mestrado em Segurança, Defesa e Resolução de Conflitos, quer que, “o projeto social LAR seja um projeto de integração de refugiados, migrantes e pessoas altamente carenciadas do meio urbano que tenham gosto pela agricultura, no meio rural”.
Bárbara conta que estão a trabalhar em conjunto com entidades de primeira linha como a JRS Portugal - Serviço Jesuíta aos Refugiados e a PAR - Plataforma de Apoio aos Refugiados. “Funcionamos como entidade de segunda linha, procurando olhar para duas vertentes - as pessoas e a comunidade de acolhimento - onde há algumas lacunas, como a população envelhecida e muitos terrenos ao abandono”, diz Bárbara Moreira, que pretende ver este projeto-piloto replicado noutras aldeias do país.
E porquê a escolha de Ima? “Pela proximidade com a Guarda e com os serviços e porque as pessoas foram excecionais na forma como acolheram o projeto”, explica Bárbara, sublinhando que a aldeia acolhedora também vai intervir, “seja com cursos de português ou com o ensino da tecelagem e de outras atividades tradicionais”.
Por aqui há muito trabalho a fazer e a maioria dele é voluntariado. A Habitat for Humanity, uma organização não-governamental, ficará encarregue da reabilitação, a custo reduzido, das casas a ocupar pelas famílias de refugiados.
Três hectares de terreno vão ser cultivados com bagas de "goji", groselha e açafrão para venda numa conhecida marca de supermercados. E quatro casas vão ser cedidas. Agostinho da Silva, 52 anos, professor da área de Aartes, tem uma casa e terrenos para ceder em Ima. “Seria muito mau que, perante alguém com o coração da Barbara, não compreendesse este projeto. Vou ceder uma casa com dois quartos e uma sala”, conta.
Também Joaquim Almeida, 79 anos, está disposto a acolher os refugiados de braços abertos, até porque terreno não falta. “É o que mais ai há: terrenos abandonados, que deviam estar cheios de batatas. Tudo foi à procura de melhor vida, está tudo abandonado. Acho muito bem que venham. Se estivéssemos num caso desses, também gostaríamos de ser acarinhados. Não lhes dâem peixe, ensinai-os a pescar”, diz.
O contrato de cedência das casas tem uma duração de 10 anos e, no final, as famílias terão primazia no aluguer, caso pretendam ali continuar a viver.
Na aldeia de Ima todos querem contribuir para que as quatro famílias de refugiados se sintam em casa, e quem está longe também pode dar uma mãozinha. No site do LAR, é possível fazer doações ou preencher a proposta de sócio por 12 euros anuais.
Debaixo de teias de aranha e de muito pó, é aberta uma casa intacta, na Rua do Marmeleiro - está tal como a deixou há 15 anos José de Sousa, que teve de partir para um lar de idosos.
O vizinho Joaquim mete a chave na porta daquela que pode vir a ser uma das quatro casas que vão acolher os refugiados até ao final deste ano. “Eles já estão em Portugal”, garante Bárbara Moreira.