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Energia. António Costa confiante de que vai convencer Macron sobre gasoduto ibérico

07 out, 2022 - 19:57 • Lusa

O primeiro-ministro português mostra-se otimista em relação ao Presidente francês, que ora é de 'nãos', ora é de 'sins'. Os chefes de Governo de Portugal e Espanha querem que França cumpra com a sua palavra, mas Macron parece não acreditar na utilidade do projeto.

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O primeiro-ministro, António Costa, disse hoje em Praga que Portugal vai “persistir” na tentativa de convencer a França relativamente às interconexões, até porque “o Presidente Macron que disse 'não'” agora “é o mesmo” que já disse 'sim' várias vezes.

Um dia após o Presidente francês ter voltado a manifestar, em Praga, a sua oposição a um gasoduto que ligue a Península Ibérica ao resto da Europa, designadamente o projeto "Midcat", através dos Pirenéus, Costa, ao ser questionado sobre se Portugal e Espanha vão desistir de tentar convencer França, respondeu que não, até porque, apontou, a rejeição por parte de Emmanuel Macron a este projeto tem sido “entremeado com 'sins'", incluindo por escrito.

“Acho que é preciso persistir, além do mais porque o Presidente Macron que disse 'não' é o mesmo Presidente Macron que, em 2018, assinou em Lisboa uma declaração que previa quer o incremento das interconexões elétricas, quer o incremento das interconexões gasíferas”, disse, referindo-se à Cimeira das Interligações celebrada na capital portuguesa em 2018, com a participação de Costa, Macron e do chefe de Governo espanhol, Pedro Sánchez.

De acordo com António Costa, “o 'não' da França não é novo, mas tem sido sempre entremeado com 'sins'”.

“Pronto, agora está na fase do 'não', esperemos que rapidamente volte à fase do 'sim'”, declarou o primeiro-ministro, que reiterou a importância de a Europa avançar com as interconexões de gás da Península Ibérica ao resto da Europa, através dos Pirenéus, e lembrou que este é um tema que se arrasta há já muitos anos, sendo que a realidade agora é diferente, sobretudo à luz da guerra lançada pela Rússia na Ucrânia.

“É sabido que esse tema é um tema que eu diria já crónico no quadro da União Europeia. Antes mesmo de eu tomar posse como primeiro-ministro, houve uma cimeira em Madrid [em 2015] onde foram fixadas metas para o nível das interconexões e já como primeiro-ministro tive oportunidade de acolher em Lisboa uma cimeira com o Presidente Macron e o presidente Sánchez, a Comissão Europeia e o Banco Europeu de Investimento, onde ficou definido qual era o quadro das interconexões do gás e da eletricidade”, recordou.

Depois, prosseguiu, “em 2019, os reguladores espanhol e francês consideraram que essas interconexões não tinham viabilidade económica”, mas, sustentou, hoje é sabido que o quadro “é completamente diferente daquele que tínhamos em 2019, desde logo porque grande parte dos países do centro da Europa, como a Alemanha, que se forneciam habitualmente na Rússia, hoje deixaram de se fornecer na Rússia e, portanto, precisam de novas fontes de energia, por um lado, e também de novas rotas de abastecimento”.

“E por outro lado, há uma nova realidade geopolítica, que creio que todos os países da Europa aprenderam: é que não podemos estar tão dependentes de um ou dois fornecedores, porque isso obviamente limita muito a capacidade geopolítica da Europa. Portanto, a diversificação é fundamental”, disse.

O chefe de Governo insistiu então que “a Península Ibérica é a região da Europa que tem uma maior capacidade de gasificação de gás natural líquido, em particular a Espanha”, mas sendo também o caso de Portugal, que tem “o porto [de Sines] que é mais próximo de alguns dos principais fornecedores de gás natural, a começar pelos Estados Unidos, a Nigéria, ou Trindade e Tobago”.

“Portanto, temos vantagens comparativas muito grandes para o desembarque do gás no nosso território e o transporte para o norte e centro da Europa, ou por via naval ou diretamente por ‘pipeline’ quando ele existir. Se queremos ter uma Europa mais autónoma do ponto de vista energético, é absolutamente fundamental incrementar as interconexões do conjunto da Península Ibérica com a Europa”, reforçou, apontando que “vários países hoje o disseram publicamente”, sendo essa ideia também apoiada pela própria Comissão Europeia.

Costa, que falava à imprensa depois de uma cimeira informal de líderes da União Europeia, que teve como principal ponto em agenda um longo debate sobre a resposta do bloco comunitário à escalada dos preços da Energia, disse compreender “as preocupações que a França tem suscitado relativamente à necessidade de preservar os valores ambientais dos Pirenéus”, mas advogou que é necessário encontrar um “bom equilíbrio”.

“Todos nós somos solidários com a França nesse sentido”, mas é necessário “encontrar o bom equilíbrio entre a preservação dos valores ambientais com aquilo que são as necessidades de abastecimento de energia a toda a Europa”, disse.

A terminar, Costa frisou que há um ponto que hoje está “claramente entendido”, o de que “a infraestrutura a ser construída tem de ser preparada desde o início para hidrogénio verde, e o hidrogénio verde é também uma realidade nova relativamente àquela que tínhamos em cima da mesa em 2018”.

“E, portanto, hoje devemos vocacionar essa infraestrutura para aquilo que serão as energias do futuro, mas permitindo também a utilização em energias de transição como é o gás natural”, uma energia “que vai ser utilizada em muitos países por uma, duas ou três décadas”.

Macron torce o nariz quanto ao gasoduto ibérico

Na quinta-feira, à entrada para uma reunião da nova Comunidade Política Europeia, que antecedeu este Conselho informal, Macron voltou a manifestar a sua oposição a um gasoduto que ligue a Península Ibérica ao resto da Europa, argumentando que a Europa deve sim investir nas interconexões elétricas.

Questionado sobre o assunto à chegada a Praga, Macron começou por referir que já falou “muitas vezes” sobre esta questão, apontou que as atuais ligações são subutilizadas, sendo que até é a França que exporta gás para Espanha, e voltou a opor-se a um projeto que levaria “cinco a oito anos” a concretizar, mantendo a Europa muito dependente das importações de gás de países terceiros.

O chefe de Estado francês disse que já há “muitas interconexões”, que permitem, de resto, à França “exportar gás por exemplo para a Alemanha e até para a Espanha” – dois países, além de Portugal, que têm insistido na importância do gasoduto -, e alegou que a atual ligação é subutilizada, considerando que tal demonstra que o projeto de interconexão designado "MidCat" não é a solução de que a Europa precisa.


“Apoio os projetos de interconexões, mas a Europa precisa de quê nos próximos anos? De produzir mais eletricidade no seu solo e ter uma estratégia renovável e nuclear. E utilizamos a plena capacidade das ligações existentes? Não, estamos a 50% ou 60%”, declarou.

Além disso, prosseguiu Macron, o projeto do gasoduto a ligar a Península Ibérica ao resto da Europa através dos Pirenéus “levará cinco a oito anos” a concretizar.

“E temos vontade de sermos duravelmente grandes importadores de gás? Não, a nossa estratégia passa sobretudo pelo hidrogénio. Se se trata de hidrogénio, devemos dizê-lo já. A questão que nos devemos colocar é se vamos fazer circular o hidrogénio por toda a Europa, ou, melhor, a eletricidade para fazer eletrólise [para gerar hidrogénio verde]. É uma verdadeira discussão estratégica que devemos ter. Creio que a nossa prioridade é antes uma interconexão elétrica na Europa, e por isso sou mais favorável a esse projeto”, concluiu.

Há muito que Portugal e Espanha têm pressionado França a honrar os seus compromissos, assumidos designadamente numa cimeira de interligações celebrada em Lisboa em 2018 – já com Macron -, e, anteriormente, numa cimeira em Madrid, em 2015.

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