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Eleições em Itália

Ex-comissária europeia candidata em Itália quer revisão dos tratados por uma UE federal

07 set, 2022 - 09:32 • Lusa

Emma Bonino é líder da formação +Europa, parte do bloco de centro-esquerda liderado pelo Partido Democrático de Enrico Letta. Eleições antecipadas disputam-se no final de setembro.

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A candidata às legislativas italianas pelo partido Mais Europa e ex-comissária europeia Emma Bonino defende a revisão dos tratados europeus no sentido da criação de uma União Europeia federal.

No âmbito de uma atribulada campanha para as eleições antecipadas de 25 de setembro em Itália, em que os partidos – a maioria dos quais coligados em dois grandes blocos, de centro-esquerda e centro-direita – parecem cada vez mais dividir-se entre pró e anti-UE, a publicação digital "Euractiv Italy" falou com Emma Bonino, de 74 anos e com uma longa carreira política nacional e internacional, sempre sob a bandeira de uma maior integração europeia.

Na entrevista, a líder da formação Mais Europa, parte do bloco de centro-esquerda liderado pelo Partido Democrático (PD), de Enrico Letta, (que inicialmente contou também com a formação Ação, de Carlo Calenda, aliado que entretanto perdeu), sublinhou a gravidade do confronto entre essas duas visões opostas.

São elas a de quem quer regressar à soberania nacional, ferozmente defendida pelo bloco de direita, composto pelos partidos de extrema-direita Irmãos de Itália (FdI), liderado por Giorgia Meloni, e Liga, por Matteo Salvini, e pelo partido conservador Força Itália, de Silvio Berlusconi, – embora “tenha durante a campanha atenuado um pouco esse discurso anti-europeu, para obter mais votos”, estimou Bonino - e o bloco de centro-esquerda, que “quer construir uma verdadeira soberania europeia”.

“Para nós é óbvio, desde logo pelo nome que demos há três anos ao partido ‘Mais Europa’, que consideramos que a União Europeia tem sido um grande êxito. Do meu ponto de vista, há ainda algumas peças importantes em falta: não só a Europa da defesa, mas também a da política externa, porque, sem política externa, nem sequer sei o que defesa significa.”

“Quem é que decide se um exército da UE deve ir para o Mali em vez de ir para outro lugar? É seguramente uma responsabilidade política, não uma coisa que o chefe das Forças Armadas possa decidir”, observou, para logo acrescentar: “Felizmente, a Europa é o nosso único destino”.

Na sua opinião, “quem, por qualquer razão, queira enfraquecer ou destruir a UE, está a fazer o jogo do [Presidente russo, Vladimir] Putin, do [primeiro-ministro húngaro, Viktor] Orbán, etc., quer queira, quer não”.

“Putin tem sido explícito em vários discursos de que prefere negociar com Estados individuais. Pelo contrário, estamos convencidos de que, apesar das suas eventuais limitações, a Europa também é importante para algumas negociações”, comentou.

“Apercebo-me de que agora toda a gente é um pró-europeu de domingo, e há aqueles que querem uma Europa da saúde, ou do gás e da energia, ou contra a evasão fiscal, etc.. Mas ninguém ou muito poucos estão empenhados em criar uma União Política Europeia, e pôr ordem nas contas e legislação italianas”, frisou, acrescentando: “Creio que isso é um erro”.

Segundo a ex-comissária europeia, “a principal clivagem política já não é entre a esquerda e a direita, ou apenas entre elas, mas entre pró-europeus e aqueles que são contra a Europa”.

“Agora, aqueles que são contra a UE reposicionaram-se um bocadinho, mas parece ser só para fins eleitorais.”

Uma das razões pelas quais a demissão do Governo de coligação liderado pelo primeiro-ministro Mario Draghi desencadeou uma crise em Itália prende-se com as condições acordadas com Bruxelas para o pagamento das ‘tranches’ do plano de recuperação económica pós-pandemia de covid-19 (PRR).

Inquirida pelo Euractiv Italy sobre a importância de uma rápida aplicação dessas verbas no país e sobre se a intenção verbalizada por algumas forças políticas de renegociar o PRR poderá dar àqueles que questionam a quantia atribuída ao país uma oportunidade, argumentando que os cerca de 35% desses fundos que Itália obteve são desproporcionados (foi o país ao qual foi concedida a maior fatia do PRR: 191.500 milhões de euros), Emma Bonino respondeu: “É claro que temos de ter muito cuidado para não abrir uma caixa de Pandora para quem já era contra a atribuição dos fundos a Itália”.

“Como disse [o comissário europeu da Economia e ex-primeiro-ministro italiano Paolo] Gentiloni, só poderão ser feitas pequenas alterações. Mas quem vier com a ideia de renegociar o PRR, na minha opinião, não só vive em Marte como está a dizer aos cidadãos italianos para irem viver para Marte”, sustentou.

De acordo com a líder política italiana, “é importante e urgente” criar uma UE da energia e da defesa, no âmbito da união política já referida, devido ao impacto da invasão russa da Ucrânia (a 24 de fevereiro deste ano) na situação energética e geopolítica, por exemplo com a Alemanha a comprometer-se a gastar 100 mil milhões de euros por ano em defesa.

“Devemos também tomar consciência de que a Itália contribui com menos de 2% para o orçamento da NATO (Organização do Tratado do Atlântico-Norte) – o que os Estados Unidos já nos apontaram em diversas ocasiões”, afirmou.

“Mas, repito, precisamos de uma política externa comum, logo, uma mudança nos tratados, o fim da unanimidade, mais poderes para o Parlamento Europeu. De outra forma, na campanha eleitoral atiramos para o ar o que quisermos, mas não fazemos qualquer bem à Europa, ou à credibilidade de Itália, que já está a ser severamente testada”, insistiu.

“Portanto, é fundamental rever os tratados para avançar para uma política externa e de defesa comum. Acredito que durante estes anos sucumbimos a uma visão intergovernamental da UE, em que os chefes de Estado e de Governo é que tomam as decisões, e que esse é o caminho errado”, sublinhou Emma Bonino.

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