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O primeiro-ministro apontou o nervosismo e a fadiga como causas da polémica em torno das celebrações do 25 de abril no Parlamento. Há dias, partilhou no Facebook um texto manifestando a sua oposição aos moldes tradicionais da celebração do 25 de abril, dizendo que não fazia sentido que a mesma se realizasse este ano, atendendo ao quadro excecional da pandemia. Sentiu-se visado por este recado de António Costa?

Não, de forma nenhuma. Não estou nada de acordo com a interpretação que está a fazer. Eu tenho, aliás, o sentimento de que as coisas estão a encaminhar-se para se poder fazer uma transformação revolucionária, como é desejável, daquilo que é a tradicional celebração do 25 de abril no quadro da Assembleia da República.

Uma celebração, devo dizer, que se estava a tornar cada vez mais enfadonha, como é sabido. Digo isto com a autoridade de quem, pelo menos duas vezes, falou em nome da bancada do Partido Socialista nas sessões solenes do 25 de abril na Assembleia da República.

Acho que a forma como o presidente da Assembleia da República, de quem sou amigo e que conheci ainda antes do 25 de abril, no movimento estudantil contra a ditadura, tenha conduzido este processo de forma tão desastrada e desajeitada, tentando impor um modelo tradicional de celebração da revolução.

Dito isto, não admito é que me suspeitem de não pretender que o 25 de abril seja celebrado.

O que, para mim, não faz sentido é impor às pessoas medidas que, de uma maneira geral, estão a ser respeitadas com enorme civismo e sentido de responsabilidade e, depois, não as aplicarmos nós próprios.

Mas o que defende, exatamente, quando sugere uma transformação revolucionária das celebrações do 25 de abril?

Eu socorri-me de um texto de um amigo e camarada de partido, o Luís Fagundes Duarte, e invoquei o exemplo do Papa Francisco nas celebrações pascais, sozinho, na Praça de São Pedro.

É, para mim, um exemplo absolutamente fantástico de capacidade de comunicar.

Bem sei que nem Ferro Rodrigues - sendo, além do mais, um não crente - nem mesmo o Presidente da República - um crente declarado - terão a capacidade de comunicar do Papa Francisco.

Ou seja, acho que deveríamos fazer bom uso dos instrumentos de que dispomos, sobretudo das novas ferramentas de comunicação, para que estejamos à altura das nossas responsabilidades contemporâneas, porque não devemos deixar de celebrar o 25 de abril, mas sempre respeitando a esmagadora maioria dos portugueses que, por força do estado de emergência, estão obrigados ao confinamento.

Por isso, penso que é, também, por aí que deverá passar a tal transformação revolucionária para o 25 de abril, dentro e fora da Assembleia da República.

Até porque a esmagadora maioria das gerações mais jovens não tem quaisquer referências da revolução, a não ser aquelas que lhes foram transmitidas pelos pais ou pelos avós.

No calor da polémica, assistimos a trocas de argumentos em que uns diziam que não faz sentido festejar o 25 de abril nos moldes tradicionais, depois de se ter proibido a celebração a Páscoa. Do outro lado, houve quem acusasse os saudosistas do Estado Novo de quererem impedir a celebração da data. Como interpreta este extremar de posições?

Não devemos inventar falsos fantasmas que são agitados de uma forma disparatada, a meu ver.

Rejeita, portanto, que se tenha tratado de uma luta ideológica entre esquerda e direita.

Absolutamente, até porque não há extrema-direita em Portugal. E transformar o senhor do Chega num expoente da extrema-direita e dizer que aquilo é protofascismo é um disparate sem nome. Para além do mais, isso é promover, do ponto de vista mediático, uma pessoa que não é de extrema-direita como é óbvio.

Tal como dizem que o CDS é um partido de extrema-direita. É um perfeito disparate. O CDS é um partido da direita democrática que, aliás, tem sido mais de centro-direita do que algumas fações do PSD que se têm manifestado noutros momentos da nossa história democrática.

Não é o caso, agora, com Rui Rio, tenho de lhe fazer essa justiça e tenho de lhe dirigir uma palavra de gratidão pela forma responsável como tem assumido a liderança do principal partido da oposição.

Concorda com quem defende que Ferro Rodrigues tem sido, ainda que de forma involuntária, um promotor dessa visibilidade?

Não é só o Ferro Rodrigues. Há muita gente que tem embarcado nessa cantilena que é completamente disparatada.

Não há nenhuma ameaça fascista em Portugal. A revolução do 25 de abril de 1974 acabou com isso tudo. Não há salazarismo em Portugal, isso não tem nem teve qualquer expressão, nem nos tempos áureos do PREC.


A cerimónia que assinala o 25 de Abril no Parlamento vai mesmo realizar-se no sábado, mas com menos de 100 pessoas na Assembleia da República.