O crime na internet “explodiu” no último ano, diz Pedro Verdelho, coordenador do gabinete de Cibercrime da Procuradoria Geral da República.

O magistrado do Ministério Público (MP) adianta que “de 2019 para 2020 o número de casos quase triplicou”.

Os números de março revelam já valores preocupantes que, “a manterem-se, vão significar que, em 2021, os casos de cibercrime voltam a duplicar”, por comparação com o ano anterior.

O procurador Pedro Verdelho não tem dúvida de que “o confinamento está a revelar um aumento exponencial da criminalidade na internet. No primeiro período houve um aumento de 500%. E a situação deve repetir-se no segundo confinamento”.

O responsável pelo combate ao cibercrime explica que se trata de uma consequência lógica das circunstâncias que estamos a viver: “o confinamento leva a as pessoas a estar mais na internet, a fazerem mais compras online. E por isso o cibercrime dispara”.

Pedro Verdelho adianta que “há fraudes de muita natureza na internet”.

Está a ocorrer atualmente uma fraude gigantesca com o MBWay”. Este meio de pagamento, cada vez mais usado, foi dos que “mais motivou denúncias no último ano. Mais de 5 mil queixas, desde maio de 2020”, revela o magistrado do Ministério Público.

O magistrado especialista em cibercrime revela qual é o “modus operandi “deste tipo de criminalidade: “as vítimas são pessoas que colocam à venda objetos em sites como o OLX e não sabem usar o MBWay. Aparece um comprador que diz querer pagar com a aplicação e oferece-se para ajudar o comprador a instalá-la e a associar a conta bancária. Essa pessoa pede depois os códigos e em vez de fazer o pagamento, faz uma transferência a seu favor”.

E a burla só está a começar porque depois de ter acesso aos códigos, o burlão começa a retirar dinheiro da conta da vítima.

O procurador que coordena a investigação do cibercrime recomenda que se desconfie sempre de quem nos quer comprar alguma coisa, de forma precipitada, sem querer ver o que está a comprar.

Pedro Verdelho, um dos participantes na edição deste sábado do Em Nome da Lei, em que estiveram em debate as alegadas fraudes cometidas por youtubers portugueses, diz “não ter conhecimento de que já haja conclusões de alguns dos inquérito-crime que foram abertos” e explica que “a investigação do crime que utiliza as plataformas da internet tem uma dificuldade acrescida; o facto de a maior parte das plataformas estarem sedeada em países estrangeiros, o que faz depender a investigação da colaboração das autoridades de outros países.”

É o que acontece no caso do Youtube, cujo caso mais recente envolve oito jovens influenciadores portugueses, que têm usado as redes sociais para promoverem apostas em sites ilegais de jogo e investimentos em moedas virtuais e em mercados cambiais de alto risco, como o Forex.

Um denunciante destas práticas pelos youtubers portugueses fez no Em Nome da Lei um apelo às autoridades judiciárias para que “investiguem o que está por trás do alto nível de vida que esses influenciadores mostram nas redes sociais e com o qual tentam aliciar os seus jovens seguidores”.

Os youtubers portugueses com mais seguidores mostram nas redes socias um nível de vida invejável, de que fazem parte casas com piscina, carros topo de gama, viagens a destinos exóticos e relógio de luxo.

O denunciante, que não quer ser identificado “com medo de sofrer represálias”, diz que esse lifestyle “não é pago pela publicidade, não pode ser porque ela é muito mal paga em Portugal em conteúdos de entretenimento. Mas é dinheiro do jogo, pago pelos casinos”.

O professor universitário Carlos Poiares admite que “por trás dos esquemas fraudulentos estejam associações criminosas”.

O jurista ligado à psicologia forense, diz que durante o confinamento “a internet substitui o contacto social e o risco que, dantes, a rua representava para as crianças e os jovens está agora nas redes sociais e na internet. Não há uma mudança de registo, mas uma mudança de objeto”.

E conclui, dizendo que “os danos que tudo isto vai causar vai gerar a necessidade de intervenção psicológica”.

A psicóloga Catarina Ribeiro explica que “as crianças aprendem por modelagem.

“Os youtubers são agora o modelo que os mais novos querem seguir. A influência é o fenómeno mais evidente e perigoso”, defende a professora da Universidade Católica Portuguesa, “e está muito para lá do Youtube, faz-se sentir muito também no Instagram.”

Catarina Ribeiro fala do “risco de uma cultura imediatista, onde as crianças querem tudo já e têm dificuldade em aceitar a rejeição, a frustração, a dificuldade e a adversidade. Há uma geração que está a perder resiliência. Hoje temos tudo à distância de um clique; isso tem imensas vantagens, mas também tem muitas desvantagens”.

A psicóloga sublinha “que não podemos educar os jovens para uma ausência de frustração, porque isso é uma pólvora para problemas de saúde mental”.

A especialista em psicologia forense aconselha “um envolvimento construtivo dos adultos “para alertarem para os riscos da internet. “Os pais não podem educar em modelo de outsorcing - há um problema, vamos falar com o psicólogo, vamos arranjar um explicador”.