Decorreu esta terça-feira em S. João da Madeira o I Encontro Fora da Caixa, Economia & Cultura. O imponente edifício do Oliva Creative Factory recebeu centenas de pessoas, sobretudo do distrito de Aveiro, que ouviram falar sobre políticas e incentivos europeus, mas também das experiências na primeira pessoa de vários empresários da região de Aveiro, cujo dinamismo, foi enaltecido ao longo do encontro.

A chuva que caia intensamente sobre um dos pavilhões do Oliva Creative Factory, espaço cultural e artístico de S. João da Madeira, que foi uma das mais importantes fábricas da história industrial portuguesa, silenciou para deixar ouvir na sessão de abertura, Francisco Cary, administrador executivo da Caixa Geral de Depósitos (CGD), que começou por assumir a relevância do evento organizado pelo banco.

“A importância desta iniciativa passa pela manutenção da proximidade com as comunidades locais, continuar a demonstrar a vitalidade da Caixa e estarmos próximos dos nossos clientes. Esta estratégia tem permitido atingir resultados significativos”, começou por garantir Francisco Cary.

Depois desta intervenção, subiu ao palco a “Casa Comum” - programa emitido em simultâneo na Renascença e na Euranet, rede europeia de rádios, com a moderação do jornalista José Pedro Frazão. João Taborda da Gama, jurista e professor universitário, considerou que o crescimento económico é o principal desafio da democracia.

“Continuamos a ter os salários médios mais baixos da Europa. Portugal vai ter que saltar etapas no crescimento económico”, defendeu Taborda da Gama, lamentando o facto de “empresas bem-intencionadas ficarem presas em burocracia. Foi fundamental construir estradas e infraestruturas, mas é preciso que as empresas se consigam financiar lá fora de forma madura”.

O eurodeputado Francisco Assis partilha da opinião de que o grande problema do país é o crescimento económico, porque “desde 2000 que começámos a ter dificuldade em acompanhar os ritmos de crescimento europeus. Fomos ultrapassados por vários países e corremos o risco de ser o país mais pobre do espaço europeu. A Europa desindustrializou-se exageradamente. Não foi só Portugal, mas toda a Europa. Tem de haver mais realismo e pragmatismo”, argumentou.

Sustentabilidade da Segurança Social é “o problema mais grave da Europa”

Questionados sobre a sustentabilidade da Segurança Social, João Taborda da Gama afirma que “os dados são muito claros. Temos uma população cada vez mais envelhecida e um crescimento económico anémico. O estudo da Fundação Manuel Francisco dos Santos nos jornais demonstra a discórdia em torno do tema. Não há um debate político profundo sobre isso, todas as iniciativas dos partidos são boicotadas. É o problema mais grave da Europa. Vai haver uma altura em que esse debate é inevitável. Ou há uma alteração demográfica brutal na Europa, ou vão ter que ponderar essa questão, mais vale saberem hoje que vão ter de trabalhar até mais tarde”, considerou o jurista e professor universitário.

O eurodeputado Francisco Assis salientou a seriedade do estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, “foi feito por pessoas sérias”.

“Em todas as sociedades europeias há o problema da sustentabilidade da Segurança Social. Nem o PS nem o PSD têm posições extremistas, têm posições diferentes que permitem entendimento. Ganhe quem ganhe nas eleições, tem que haver diálogo. Temos que discutir com mais seriedade e rigor”, alertou.

O moderador do debate, o jornalista José Pedro Frazão, questionou ainda o impacto do Brexit: “está a deixar escondido outro conjunto de temas?” João Taborda da Gama diz que “é um tema que só do ponto de vista filosófico nos interessa. A perspetiva de solução europeia é antagónica aos interesses de curto prazo da Europa”, rematou.

Já o eurodeputado Francisco Assis sublinha que “o Brexit não tem travado a discussão europeia. Os países europeus têm-se mantido unidos na resposta à negociação do Brexit. Os ingleses julgavam que podiam sair do espaço europeu e continuar a ter os benefícios do espaço europeu, mas isso não podia acontecer”, concluiu.

Empresário queixa-se do preço da energia

No segundo painel do Encontro Fora da Caixa, em S. João da Madeira, três empresários da região de Aveiro trouxeram um objeto que demonstra o trabalho de cada uma das empresas que representavam.

Rodolfo Andrade, diretor financeiro da Multicouro, perita em designs de peles variado, demonstrou que hoje em dia não há dois sapatos iguais. Miguel Coelho, diretor-geral da Almas Design, trouxe vasos e algumas críticas. “Os obstáculos que encontramos é afirmarmo-nos lá fora. Tivemos que percorrer um caminho longo. Tivemos que ultrapassar a má imagem que Portugal gozava lá fora. Os preços da energia em Portugal fazem-nos perder competitividade. A eletricidade é demasiado cara e nós estamos na cauda da Europa”.

“São sobretudo obstáculos internos”, insistiu também Pedro Ventura, administrador da Cartonagem Trindade, sob o slogan “uma caixa, mil sonhos”, alertou para o facto de a linha férrea estar esquecida, rede de transporte que considera vital para as empresas portuguesas.

Francisco Cary, administrador executivo da Caixa Geral de Depósitos, ouviu as diversas intervenções dos empresários e não poupou elogios. “Não é tão importante a região b ou c, mas reconheço que esta zona do distrito de Aveiro, tem um conjunto de tecido empresarial muito vibrante. Um dos poucos polos do país onde até tem havido crescimento populacional”, valorizou.

Hiperatenção ao conhecimento, decisão e execução

Já com o aproximar do final da tarde, subiu ao palco do Encontro Fora da Caixa o presidente da comissão executiva da Caixa Geral de Depósitos. Paulo Macedo realçou as três competências básicas para a agilidade das empresas: hiperatenção ao conhecimento, decisão e execução.

Nas perguntas à Caixa e abordando uma das temáticas que mais tinta fez correr nos jornais, Paulo Macedo reforçou que a CGD encerrou menos agências que outras entidades bancárias. “Ou queremos bancos mais eficientes e mais rápidos ou queremos as mesmas estruturas. Nunca encerrou nenhum gabinete empresa, por exemplo. Estamos 24 horas disponíveis. A Caixa mantém mais de 500 agências e quer servir as pessoas de várias formas, até porque metade das operações de comércio externo e factoring são feitas pela Internet, não há nenhum banco em Portugal que tenha mais clientes a fazer operações pela Internet do que a Caixa”, clarificou perante a plateia que o escutava.

Prata boa da casa, subiu ao palco um projeto musical de S. João da Madeira, com elementos entre os 5 e os 75 anos, o Grupo “Esquilos não gostam de pedras”, abrindo espaço para o último painel que cruzou indústria e cultura em ‘Polivalência Criativa’. Alexandra Alves, chefe da Unidade de Turismo, falou no conceito inovador de turismo industrial que “reúne a rede, a indústria e a cultura, com os parceiros e empresas sedeadas em S. João da Madeira. E começa neste momento a ter impacto regional e nacional com valor”, acrescentou Alexandra.

Andreia Magalhães, diretora do Centro de Arte Oliva, valorizou a existência de uma relação privilegiada com a indústria. “Temos relação com a indústria, numa relação diferente, não é à toa que estamos nas instalações de uma antiga fábrica”, explicou.

Isabel Corte-Real, conservadora da Coleção Caixa Geral de Depósitos, Culturgest, denunciou que “há uma grande dificuldade de exportação, nomeadamente nas artes visuais. Temos várias gerações excelentes de artistas portugueses com dificuldade de se colocarem nos mercados”, referiu, corroborada por Joana Galhano, diretora do Museu da Chapelaria e Museu do Calçado. “O trabalho em rede é essencial, não só nacional como internacionalmente, através das embaixadas, por exemplo, com quem pretendemos ter exposições”, salientou Joana Galhano, lamentando “não haver uma abertura tão grande como se desejaria nas artes”.