29 mai, 2019 - 18:10
O arcebispo de Évora considerou que a cidadania tem de ser mais “incentivada” e que não pode ser, apenas, “um slogan ou uma proposta que aparece como lapela de casaco ou adorno.
D. Francisco Senra Coelho falava aos jornalistas, no encontro anual que a diocese promove por ocasião do Dia Mundial das Comunicações Sociais. E nesta proximidade com estes profissionais, o prelado aproveitou para manifestar a sua preocupação pela elevada abstenção verificada, em Portugal, no ultimo domingo, nas eleições para o Parlamento Europeu.
“O não votar pode, também, significar um sinal político que se está a dar aos políticos e, nalguns casos não ser uma mera omissão ou desinteresse, um sinal que se dá de que não vale a pena, assim”, sublinhou.
“Convinha que os políticos lessem com maturidade e responsabilidade o que isto quer dizer pois é uma realidade que corrói a democracia e nos questiona sobre a relação da Europa com os cidadãos.”
Foram os cidadãos que abandonaram a Europa ou a Europa que abandonou os cidadãos? D. Francisco responde: “Colocando na balança tenderia mais para uma Europa que se tem descuidado dos cidadãos.”
O arcebispo de Évora vai mais longe e alude a uma Europa que “acaba por ser um diálogo redondo, fechado, onde os cidadãos olham para dentro através de vitrines”, numa espécie de “montra desencarnada e muito distante da sua vida concreta.”
Deixa, por isso, um apelo aos políticos: “Os políticos não podem trabalhar para os cidadãos, mas com os cidadãos, envolvendo, chamando à participação, dando possibilidades de pronunciamento. É preciso mais trabalho de casa com os cidadãos.”
O que quer, então, revelar o resultado da elevada abstenção? “Simplesmente que não tenho nada a ver com este assunto, não me diz respeito, só me chamam para ir votar para que eles tenham um lugar no Parlamento Europeu e não estou para isso”, adiciona.
Considerando “muito grave”, o nível de abstenção, o prelado defende que o ato eleitoral “não pode ser um momento isolado”, mas deve ser um ponto de chegada de um trabalho realizado.
“Não é um ponto de partida para que outros tenham poder, tem de ser um ponto de chegada para que eu me pronuncie naquilo em que me sinto envolvido. E esse trabalho tem que começar pela formação e educação, nas famílias, na escola, nas universidades e na comunicação social.”
Arquidiocese vai ter duas novas comissões
O arcebispo de Évora anunciou “para o fim do mês do mês de junho”, a conclusão de “uma comissão arquidiocesana” que vai estar preparada para lidar com a problemática da pedofilia dentro da Igreja, “embora com funções mais amplas, para criar uma cultura de segurança”.
Até agora, na arquidiocese “não há registo de qualquer denuncias”, garante o prelado, esclarecendo que esta comissão vai ser mais do que uma “gestora de crises”, tendo uma “vertente de investigação”, sempre em colaboração com “forças de segurança e com o Ministério Público.”
De qualquer forma, frisa D. Francisco, “pretendemos fazer formação intensa, com modos de procedimento, com cadernos de orientação, a todos os sacerdotes, diáconos, catequistas e religiosas para que na Igreja toda a gente se sinta segura, sobretudo os menores e as suas famílias.”
A diocese está também a trabalhar na criação de uma Comissão Justiça e Paz para fazer a análise de todos os problemas que “nos parecem mais urgentes na região.”
“Ela vai pronunciar-se, com o apoio do arcebispo, sobre os principais problemas sociais e humanos da arquidiocese, pois queremos ter um grupo que possa olhar, julgar e articular de acordo com a Doutrina Social da Igreja dando opinião sobre aspetos mais relevantes”, acrescenta o prelado.
O “jornalismo real” está nas regiões
No encontro com os jornalistas, o arcebispo de Évora falou, ainda, do trabalho dos profissionais de comunicação local e regional, que classificou como “meritório”, numa missão diária acrescida de “dificuldades, com falta de meios e sem lobies por trás”. É o “jornalismo real”, acrescentou, com “um rosto e que vem do cidadão”.
Confessando-se admirador dos profissionais que desempenham as suas funções longe dos grandes centros, D. Francisco agradeceu a atenção dada ao trabalho da Igreja, “com rigor e um tratamento profissional”, na diocese mais extensa do país.
“Não há aqui um rótulo nefasto a que chamo de fundamentalismo laicista. Da Igreja ou se diz mal ou não se diz nada. Essa metodologia seletiva de eliminar uma instituição é, a meu ver, o que há de menos profissional e de menos deontológico”, salientou.
“Por mais serviços que preste às populações, mesmo que conduza 60% das IPSS ou distribua milhares de refeições por dia, não é possível escapar à erosão e ao desgaste”, lamentou.
Para além do convívio com os profissionais da comunicação, o encontro serviu para esmiuçar a Mensagem do Papa Francisco para o 53º Dia Mundial das Comunicações Sociais que a Igreja celebra no próximo domingo, dia 2 de junho. “Das comunidades de redes sociais à comunidade humana” dá o mote à palavra do Papa que convida a “refletir sobre o fundamento e a importância do nosso ser-em-relação”, descobrindo no panorama da comunicação, atual, “o desejo que o homem tem de não ficar encerrado na própria solidão.”
“É uma mensagem muito positiva”, sublinhou D. Francisco Senra Coelho, convidando todos à sua leitura e reflexão.