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Eleições Europeias

“A Europa não tem competências em áreas onde há insatisfação porque a Europa não intervém”

09 mai, 2024 - 17:59 • José Pedro Frazão José Pedro Frazão

Paulo Almeida Sande, professor universitário e especialista em assuntos europeus e Ana Maria Belchior, socióloga e coordenadora do Barómetro de Políticas Europeias da Fundação Francisco Manuel dos Santos comentam este estudo de opinião divulgado a um mês das eleições europeias. Os inquiridos portugueses são dos mais pró-europeístas dos 27, mas estão insatisfeitos com a forma como a Europa tem lidado com questões como a pobreza, as desigualdades ou o conflito israelo-palestiniano.

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As eleições são para o Parlamento Europeu, mas a campanha eleitoral poderá acabar por girar em torno de assuntos de política interna. “Foi sempre assim”, lamenta Paulo Sande, antigo diretor do Gabinete em Portugal do Parlamento Europeu, cuja função passava por contrariar essa tendência e divulgar os temas da atualidade europeia.

“Foi sempre assim porque é nisso que se concentram e focam os partidos políticos. E a comunicação social vai atrás disso ou se calhar vai à frente”, explica o especialista em assuntos europeus.

No Barómetro Europeu da Fundação Francisco Manuel dos Santos, os inquiridos portugueses revelam que as crises na habitação, na economia e no serviço nacional de saúde estão no topo das preocupações em 2024. A maior insatisfação, na ordem de dois terços da amostra, relaciona-se com a forma como a União Europeia lida com a pobreza e as desigualdades, ou o conflito israelo-palestiniano.

É muito fácil dizer que não estou contente com uma coisa que não tem poder fazer. A Europa não tem competências em muitas dessas áreas, onde as pessoas dizem que não estão satisfeitas porque a Europa não intervém. E porque é que a Europa não intervém? Porque as mesmas pessoas que respondem dessa maneira e em particular alguns dos partidos mais radicais nesta matéria, também são os primeiros a dizer que a Europa não deve ter competências nessas matérias”, analisa Paulo Almeida Sande.

Face aos últimos estudos, a imigração passou de 0,9% para 9,1% de inquiridos que identificam o tema como relevante. Em 5 anos temas como as pensões, a educação e o clima desapareceram dos 15 assuntos mais relevantes para os portugueses.

Insatisfeitos com os políticos, não com a Democracia

Ana Maria Belchior, socióloga e coordenadora do Barómetro, salienta a natureza pró-europeia dos portugueses com forte apoio ao projeto europeu, mas alerta para a insatisfação dos inquiridos em relação à ação da União Europeia em áreas estratégicas, nomeadamente na vertente externa como os conflitos no Médio Oriente e na Ucrânia.

“Os cidadãos estão descontentes, de forma transversal, com a forma como se faz política, com os eleitos e partidos políticos. Desconfiam das instituições, mais das nacionais do que propriamente com as europeias. Há um descontentamento não propriamente com a democracia em si, mas com a forma como esta opera no terreno, com os políticos e os partidos”, assinala a professora do ISCTE-IUL.

Quase 90% dos inquiridos gostariam que os cidadãos europeus tivessem uma forte influência na União Europeia, algo que apenas um terço dos portugueses reconhecem na Europa de hoje. Paulo Sande sublinha que o voto antecipado em mobilidade anunciado para as próximas eleições europeias simboliza “soluções que procuram contribuir para que os cidadãos possam participar mais”. O especialista em assuntos europeus admite que este mecanismo pode trazer “ uma surpresa positiva ” ao nível da participação eleitoral nas europeias de 2024.

Ana Maria Belchior. Foto: Beatriz Pereira/RR
Ana Maria Belchior. Foto: Beatriz Pereira/RR
Ana Maria Belchior. Foto: Beatriz Pereira/RR
Ana Maria Belchior. Foto: Beatriz Pereira/RR
Paulo Sande. Foto: Beatriz Pereira/RR
Paulo Sande. Foto: Beatriz Pereira/RR
Paulo Sande. Foto: Beatriz Pereira/RR
Paulo Sande. Foto: Beatriz Pereira/RR

Os inquiridos gostariam que os governos e até os eurodeputados tivessem mais influência nas políticas da UE. No entanto, os nomes dos eleitos portugueses para Bruxelas são maioritariamente desconhecidos para os inquiridos. Mais de metade não consegue indicar corretamente o nome de um eurodeputado português ou até o nome da presidente da Comissão Europeia. “É talvez um dos dados mais surpreendentes”, reconhece Ana Maria Belchior, apesar de metade dos inquiridos admitirem que estes parlamentares representam bem os interesses nacionais.

Na maioria das respostas, os inquiridos sustentam que Portugal tem menos poder na Europa que países com população semelhante. A Alemanha é considerada de longe o país mais poderoso na Europa, com 75% da amostra neste sentido. O novo hemiciclo, com base num eventual incremento da representação de partidos eurocéticos e populistas, pode vir a condicionar várias políticas seguidas até agora por Bruxelas.

“Pode haver aí , de facto, um bloqueio. Mas, nos últimos meses, a Comissão Europeia já começou a recuar nalgumas políticas, por exemplo, ao nível do ambiente, da energia ou agricultura. Há quem diga que já são medidas eleitoralistas por parte de Von Der Leyen, que já tinha decidido que iria ser candidata”, remata Paulo Sande num debate a emitir na próxima edição do programa “Da Capa à Contracapa” em parceria com a Fundação Francisco Manuel dos Santos.

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